Maria Inês Nassif: Mello abre a boca porque o silêncio do STF apenas fortaleceu a prática de Gilmar de fazer política de toga

Tempo de leitura: 3 min

Marco Aureélio Mello e Gilmar

Fotos: Lula Marques / Agência PT

Marco Aurélio Mello versus Gilmar Mendes

Mello abre a boca porque o silêncio apenas fortaleceu a prática de Gilmar de fazer política de toga.

Maria Inês Nassif, em Carta Maior

O ministro Marco Aurélio Mello não merece o reconhecimento apenas por suas manifestações equilibradas numa conjuntura política facilmente sujeita à combustão, mas porque se dispôs a dar a cara a bater para libertar o Supremo Tribunal Federal (STF) das armadilhas que são colocadas diuturnamente ao Judiciário pelo ministro Gilmar Mendes, pela oposição e pela mídia.

O STF, desde o escândalo do chamado mensalão, por ação ou omissão de seus integrantes, tem sido um importante instrumento a serviço de forças políticas de moralidade e intenções democráticas duvidosas.

Por conveniência dos grupos que instrumentalizam o STF, à parcela dos ministros que se opõe ao uso político do Judiciário é exigida a discrição dos juízes, enquanto Mendes reina, sozinho, junto à opinião pública, para corroborar teses e, sem constrangimentos, dar ganhos de causa a determinados partidos políticos independentemente da justeza jurídica de seus pleitos.

Mello se rebelou contra essa lógica. Está deixando claro a quem quer ouvir que Gilmar Mendes não é o Supremo; e que, para alívio dos democratas do país, existem ministros que não pensam como o ex-advogado-geral da União do governo do PSDB. Que, enfim, existem ministros do STF que pensam como ministros do STF.

Ao que tudo indica, Mello resolveu não aceitar mais a instrumentalização do Supremo por determinadas forças políticas. Entendeu que existe um limite muito claro que a Corte, por ação ou omissão, não pode transpor: a democracia. É ela que está ameaçada quando a maior instância do Judiciário não garante a todos, sem distinção, o direito à Justiça. E, a bem da democracia, os ministros do STF não podem se curvar a chantagens, ameaças ou simplesmente ao desejo de reconhecimento público.

Ao expor suas opiniões às claras, para quem quiser ouvir, Mello não inventa a roda. Na verdade, apenas lança mão de uma estratégia usada à exaustão por Gilmar Mendes desde que este se tornou ministro do Supremo, no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Ao sair a público para contestar argumentos montados por forças políticas, como se jurídicos fossem, e propagados por uma máquina midiática com recursos de marketing, Mello tenta evitar que o STF sirva ao golpe institucional que se prepara contra a presidenta Dilma Rousseff. Ele está certíssimo. Não há nenhum conforto na perspectiva de tornar-se, por omissão,  um instrumento de forças políticas que querem derrubar um governo legítimo.

O jogo de Mendes tem sido continuadamente o seguinte: em momentos decisivos, ele entra em cena e faz um discurso agressivo na defesa dos interesses da oposição aos governos petistas (antes disso, prestava-se a apoiar assuntos de interesse do governo FHC). Assim, avaliza juridicamente teses de claro viés partidário, com o devido apoio da mídia. Internamente, mantém alguns ministros sob a sua órbita de influência. Alguns deles são incondicionalmente leais ao chefe e o acompanham mesmo nas suas mais absurdas manifestações e votos.

Aos que a Mendes se opõem, é cobrada a posição equidistante do juiz. Quando aceitam isso, os ministros que são efetivamente juízes ficam enfraquecidos porque deixam Gilmar Mendes livre para atuar – às claras e também nas sombras – para constituir maiorias que tomam decisões no mínimo questionáveis, como a de condenar sem provas, por “domínio do fato”. Quando se submetem à lógica de que a Gilmar Mendes tudo é permitido, mas eles devem ficar calados, deixam a Corte ser contaminada por chantagens ou interesses políticos.

A parcela dos ministros que admiravelmente insistem em ser juízes, enquanto Mendes coloca o STF a serviço da política oposicionista, têm deixado a Corte ser engolida por manobras políticas internas por medo de expor a instituição à opinião pública e desmoralizá-la.

A tentativa de preservar a imagem do Supremo pelo silêncio, todavia, além de ter feito muitas vítimas – condenações e decisões que a história julgará não necessariamente a favor da Corte – é um engano.

A instituição não pode controlar os fatos. Agora, por exemplo, o vazamento da lista de clientes da empresa de advocacia Mossack Fonseca, especializada em montar offshores para lavar dinheiro ou com o objetivo de sonegação de impostos, expõe o seu ex-presidente Joaquim Barbosa. Se os ministros do STF que são juízes não reagirem à partidarização do Judiciário, a chance desse vexame se repetir é enorme. O silêncio deixa a Corte vulnerável a práticas condenáveis da política que a Justiça teoricamente quer extirpar da vida do país.

Por isso o ministro Marco Aurélio Mello deve ser aplaudido. Ele desafiou o silêncio do Supremo exatamente porque insiste em ser juiz. O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, continua a fazer política com a sua toga.

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Comentários

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THAIS

Ainda bem que temos ministros sérios e comprometidos com a justiça e a democracia do nosso país, Marco Aurélio é um deles, justo e competente, admiro muito!!!!

Urbano

Com tranca arrebentada e sem reparo nem reforço, o expert volta sempre. Ou alguém toma a responsabilidade para si ou então vai virar casa-de-tolerância, com direito a rufa inclusive.

Messias Franca de Macedo

Deputado Ivan Valente (PSOL-SP) pede esclarecimentos ao relator Jovair Arantes

https://www.youtube.com/watch?v=ywdw03YKDaw

FrancoAtirador

.
.
“Quando a Justiça se cala,
consente com a Injustiça”
.
Foi precisamente no Sentido Estrito da Omissão,
Expresso acima pela Jornalista Maria Inês Nassif,
que o ex-Presidente Lula disse a um Interlocutor,
por Via Telefônica, mas em Conversa Particular
no Espaço Exclusivo da Privacidade e da Intimidade,
que ‘o Supremo está Acovardado’. E não estava?
.
.

lulipe

O Ministro ‘voto vencido” está apenas querendo retribuir a nomeação de sua filha ao TRF. É voz isolada na Corte e mais uma vez foi desmoralizado, agora com uma aula de Direito dada pelo decano do STF, Celso de Mello, ao rejeitar um pedido de impeachment de Temer:

http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,celso-de-mello-nega-novo-pedido-de-impeachment-de-temer-e-cita-separacao-de-poderes,10000025313

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