Raquel Rolnik: Uma reflexão sobre o aumento do IPTU em SP

Tempo de leitura: 3 min

A lógica predadora é a mesma: endivida e privatiza. Os bancos ganham nos dois casos. Imposto? Coisa de comunista.

Reflexões sobre o reajuste do IPTU

Publicado em 07/10/13

Por Raquel Rolnik*, em seu blog, sugerido no Facebook

Semana passada a Prefeitura de São Paulo enviou à Câmara Municipal a proposta de Orçamento de 2014, incluindo um reajuste no IPTU. Ninguém gosta de ver aumentadas as suas despesas… Era esperado portanto que o anúncio fosse acompanhado de reações negativas. Sugiro aqui três reflexões sobre a medida.

Em primeiro lugar, é importante lembrar que o IPTU é um dos impostos mais justos do país, cobrando mais de quem tem mais, ao contrário da maior parte de nossos impostos.

Além disso, o IPTU constituiu uma das poucas fontes de receita própria dos municípios. Se bem cobradas e empregadas, as fontes de receita própria diminuem a dependência municipal da transferência de recursos dos governos estadual e federal, altamente intermediadas “politicamente”.

Maior receita própria significa também menor necessidade de contrair dívidas, cujos encargos representam hoje o maior gasto da cidade de São Paulo.

A realidade hoje no Brasil é que poucas prefeituras arrecadam IPTU. Do ponto de vista político, é muito mais interessante para os prefeitos serem “bonzinhos” e não cobrarem o imposto. Depois, sobra para seus eleitores a dívida e o custo das alianças…

Em segundo lugar, vamos refletir sobre a ideia de que não queremos mais impostos porque os serviços públicos não existem ou são de má qualidade.

De fato, estamos insatisfeitos com a qualidade de nossos serviços públicos, mas não é diminuindo os recursos arrecadados que o município vai gastar melhor. Por que não debatemos a proposta de gasto enviada junto com a proposta de aumento de receita? Como e quando vamos avançar no controle social do orçamento público?

Aqui a reação contrária ao IPTU encobre um outro debate, mais obscuro e difícil.

Por fim, a reação anti-IPTU reflete o debate em torno do custo de morar na cidade.

De fato, desde 2009, quando ocorreu o último reajuste, a cidade vive um boom imobiliário sem precedentes, catapultado pelo crescimento econômico, pelo aumento do crédito imobiliário e da participação do mercado paulistano na ciranda financeira local e internacional.

Na cidade submetida unicamente à lógica financeira, bairros inteiros são descaracterizados e é cada vez mais difícil morar em bairros bem localizados. O curioso é que este tema só aparece quando a cidade tenta captar uma parte dos enormes ganhos imobiliários e financeiros que gerou nos últimos anos, reajustando o IPTU.

Uma vez mais aqui o problema não está no IPTU. Do ponto de vista da política urbana, o que estamos fazendo para controlar a bolha imobiliária e impedir a total “financeirização” do mercado imobiliário e a expulsão de moradores de seus bairros?

A discussão fundamental é: quem pode pagar e quanto?

Em São Paulo, por volta de 1 milhão dos 3,5 milhões de domicílios da cidade terão reajustes significativos no IPTU. Quem são estes 30%? Que possíveis situações de vulnerabilidade podem existir entre os moradores destes domicílios?

Me parece que esta é a discussão madura que deve ser feita agora na Câmara Municipal por nossos vereadores.

* Raquel Rolnik é urbanista. Coluna originalmente publicada no caderno Cotidiano da Folha de S. Paulo.

PS do Viomundo: Quem definitivamente não quer o aumento do IPTU são os bancos. Os bancos ganham com juros pagos pela Prefeitura de São Paulo. Independentemente de eventuais injustiças — e, certamente, elas existem — a grana que não vai para o IPTU acaba no cofre dos bancos, via juros, rolagem da dívida e um encarecimento generalizado para fazer negócios na cidade. Mas os juros pagos aos bancos não chegam num carnê na casa das pessoas, no início de todo ano, nem são denunciados pela mídia patrocinada pelos banqueiros.

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Comentários

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Marcus

Não sei se faz todo o sentido cobrar o IPTU de quem possui o imóvel mais valorizado, pois este nem sempre se trata de um investimento.

O que eu vejo é que mais uma vez quem paga a conta da farra dos mais poderosos é o contribuinte. Se há especulação imobiliária os responsáveis são as construtoras, bancos, especuladores e a própria prefeitura que não põe, ou não quer pôr, freio nisso. Nenhum governo dito de esquerda tem colhão de taxar a receita destes grupos, estes sim os causadores desta sobrevalorização dos imóveis, e mais uma vez sobra para o cidadão comum arcar com as contas. O que me alarma é ver que as camadas ditas mais intelectualizadas da esquerda compram facilmente essas políticas neoliberais de isentar o empresariado e cobrar do cidadão ,(seja ele de classe A/B ou C) como se SÓ isentar ou reduzir o IPTU das periferias e aumentar a alíquota do Centro fosse uma política progressista. Não que eu seja contra ela.

Também não preciso nem citar a desconfiança do cidadão quanto ao destino destes impostos exatamente num momento em que aprox. 15 construtoras estão sendo investigadas de pagar propinas em detrimento do ISS.

Vejo muito pouco esses assuntos citados acima com mais profundidade. O melhor texto que li até agora foi este da Raquel Rolnik, ainda que eu não concorde 100% com ele.

Fabio Passos

A luta da minoria privilegiada é para manter o Apartheid Social.
É para perpetuar injustiças.

A “elite” branca e rica quer aproveitar a excelente infra-estrutura paga pelo povo… mas não aceita pagar imposto justo.
A minoria privilegiada, acostumada a roubar a população pobre, não admite que se combata a aviltante concentração de riqueza.

Rodrigo Leme

É desonesto confundir a reação ao aumento e a forma como ele foi feito como uma reação contra o imposto em si. Se dependesse de mim qualquer imposto seria derivado de renda. O IPTU é justíssimo, mas não é pq é justo que deve ser abusado.

E quase ninguém menciona, mas a votação foi antecipada na câmara e ocorreu antes de uma audiência pública aberta pela prefeitura que ocorreria no dia seguinte. Isso é atitude correta? A prefeitura vai alvar as mãos e culpar a câmara pela antecipação na calada da noite? Com um procedimento desses, dá para dizer que o aumento nos valores propostos foi correto?

A cidade possui um conselho, do qual creio que a Raquel Rolnik seja parte: o que o conselho achou dessa manobra?

Gerson

A questão dos Bancos que alguém comentou não entender é simples.

Sem arrecadação a prefeitura tem que recorrer aos banqueiros pra se financiar. Rolar dívidas.

É isso Azenha ?

fausto

Acho que todos concordam quanto a ser justo que quem tenha mais, pague mais.
Acontece que em alguns bairros o IPTU vem sofrendo aumentos sucessivos exorbitantes nos últimos tempos.
Comentei na outra matéria e repito: o IPTU da minha avó subiu de 300/mês para quase mil/mês em 5 anos .
O bairro dela tornou-se um bairro de “elite”.
A pergunta é a seguinte: deve minha avó – prof. aposentada – pagar quase 1/5 do salário todo mês em IPTU?
Este imposto incide da mesma forma em quem ganha 5, 10, 20 ou bilhões de reais.
Para “ceo’s”, advogados, médicos esse aumento é uma coisa.
Para aposentados é outra.
Nem vale tentar aqui enumerar qualquer melhora que tenha acompanhado estes aumentos.
Melhorou para quem faz negócio com as moradias e lucra sem produzir um tijolo.
Eu realmente espero que desta vez resulte em algum serviço de qualidade mínima.
Em São Paulo pagam-se preços maiores que na suíça por serviços com qualidade pré-histórica.

FrancoAtirador

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DA PORTO ALEGRE DE ONTEM AO BRASIL DE AMANHÃ

A História Política do Município de Porto Alegre, nos últimos 30 anos,
é Paradigmática para Compreensão do atual estágio da Sociedade Brasileira.

A República Federativa do Brasil continua estruturada em bases sociais frágeis, absolutamente e cada vez mais despolitizadas e, por conseguinte, suscetíveis à Manipulação de um Oligopólio Midiático Empresarial, sob o predomínio ideológico ‘murdochiano’, que se aproxima do Norte-Americano Tea Party.

Sem o aprofundamento das relações democráticas diretas, nas ações governamentais, e, fundamentalmente, sem a ruptura do modelo econômico excludente, pois concentrador de riqueza, e, portanto, perverso,
o risco de retrocesso no Brasil será sempre iminente.

Entretanto, essa mudança radical necessária só começará a se efetivar, quando houver a Regulamentação, através de Lei, dos artigos 220 a 223 da Constituição de 1988, concomitante com a aprovação no Poder Legislativo Federal de um Novo Código de Telecomunicações que atualize a regulação das Concessões Públicas dos Meios de Comunicação de Massa outorgadas pelo Poder Estatal às Empresas Privadas.
E nem precisa ser com Modelo idêntico ao da Ley de Medios argentina, que seria o ideal. Qualquer Lei Regulatória nos moldes das que implementadas em países como França, Inglaterra e até nos United States já seria melhor do que a que não temos.

A Democratização da Palavra, como diz o sempre positivo Professor Emir Sader, é o Princípio para a Quebra de todos os demais Monopólios, mormente o do Dinheiro (http://www.cartamaior.com.br/?/Blog/Blog-do-Emir/Contra-os-tres-grandes-monopolios-do-dinheiro-da-terra-da-palavra/2/23797),
uma vez que Essência para a Transformação da Cultura Política no Cérebro e no Coração do Corpo Social.

Sem esse primeiro passo concreto, continuaremos a sonhar com um País Utópico, enquanto lastimamos o Triunfo da Ignorância, da Insensatez, da Mistificação, do Individualismo e da Ganância sobre a própria Nação Brasileira.

O Brasil de Hoje é a Porto Alegre de Ontem.

Espera-se angustiadamente que o Brasil de Amanhã não seja a Porto Alegre de Hoje.
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(http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_prefeitos_de_Porto_Alegre)
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Ol%C3%ADvio_Dutra)
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Tarso_Genro)
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Raul_Pont)
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Verle)
(http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Emir-Sader-aponta-pendencias-dos-10-anos-de-governos-Lula-Dilma/4/29224)
(http://www.viomundo.com.br/politica/emir-sader-sob-o-poder-de-tres-ditaduras.html)
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Alex Back

Vamos falar de metrô? Fora da pauta. Melhor não… vai sujar muita gente.
Vamos falar de construtoras? Fora da pauta. Melhor não… vai sujar muita gente.
A cidade assume dívidas e mais dívidas com o custo embutido (e nada desprezível) da corrupção.
E ainda ter que aguentar artigos defendendo mais um aumento de impostos pra continuar a financiar essa orgia sem fim??

    Maria

    O cara paga pedágios caríssimos no estado para ter estradas boas e tudo bem, paga uma nota nos condomínios dos prédios de São Paulo e tudo bem, agora aumentar o IPTU, imposto por morar em São Paulo, cidade cheia de problemas, ah, isso não! Ema, ema, ema, cada um com seus problemas, não é mesmo? Por isso que São Paulo é esse lixo. Seus moradores não estão nem aí para a cidade. Vou ganhar dinheiro, depois vou morar no interior ou na praia, não é? A cidade que se dane. Vamos defender as florestas da Amazônia, a Mata Atlântica, mas a pobre Serra da Cantareira continua sendo destruída. Ah! Gente egoísta.

lukas

Folha de São Paulo, né? Falta agora Viomundo dar voz àqueles contrários ao aumento.

    Luiz Carlos Azenha

    Escreva. A gente publica. abs

Agências de classificação e governos: endividar para privatizar – Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Raquel Rolnik: Sobre o aumento do IPTU em São Paulo […]

J Souza

É isso ai…
Para estradas boas, pedágios caros…
Para bons serviços públicos, IPTU caro…
Quem tem mais, paga mais…
É preciso mais investimento estrangeiro no país…
As leis trabalhistas encarecem a mão-de-obra…
O discurso está afinado… Só falta marcar a data da fusão dos partidos…

P.S.: Quando incluírem no discurso desses partidos no poder o corte das mordomias dos políticos e dos funcionários públicos de alto escalão, me avisem!

    Herlan

    Blá blá blá…também não sou a favor das mordomias para políticos e funcionários do alto escalão, mas essa de achar que são eles os únicos responsáveis pelos problemas da cidade é uma visão muito mesquinha e reducionista da realidade!

    Cadê a bosta da nossa imprensa para botar a boca no trambone e denunciar as construtoras envolvidas na sonegação de impostos para a prefeitura de SP?

    J Souza

    Concordo com você, Herlan!
    Vamos ver quem terá coragem de enfrentar os sonegadores… Principalmente os grandes sonegadores.
    Dizem por ai que tem um banco que deve BILHÕES à Receita Federal, mas que consegue atrasar “ad aeternum” a cobrança no Judiciário…
    E quanto à mídia, se chegar o “Dia de São Nunca” você a verá pedir para o governo ir atrás dos sonegadores… Isto porque os “Barões da Mídia” estão entre os GRANDES SONEGADORES!

    Aline C. Pavia

    Haddad está indo trabalhar de ônibus.

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