Luna e Silva promete investimentos de U$ 300 milhões da Petrobras, quando empresa já investiu quase U$ 50 bi ao ano

Tempo de leitura: 8 min
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Cinco falácias do sr. Silva e Luna, atual presidente da Petrobras, na Câmara dos
Deputados

Por Felipe Coutinho*

O sr. Joaquim Silva e Luna, atual presidente da Petrobras, fez exposição e participou de debate na Câmara dos Deputados no dia 14 de setembro de 2021.

Nesse artigo são analisados os argumentos apresentados.

Custos da produção e preços dos combustíveis

O sr. Silva e Luna sustentou: “Com relação a preços de combustíveis. Inicialmente, apresentamos o preço da gasolina, que é um dos temas bastante sensíveis, afeta a todos nós. Queremos demonstrar o seguinte: a parte que corresponde à Petrobras, que é da ordem de 2 reais, considerando esse valor de 6 reais por litro, e aí entra a parcela que cabe à Petrobras para cobrir custo de produção e refino do óleo, isso aí, dependendo, chega até 10 anos esse percurso, para chegar até a refinaria.”

Com relação ao preço da Gasolina C, o preço de realização da Petrobrás corresponde à 33,5% do preço ao consumidor. A informação apresentada por Silva e Luna, tomando como referência o preço de R$ 6,00 por litro, está correta.

No entanto, o argumento é falacioso, porque trata-se de informação incompleta para se avaliar a política de preços da Petrobras, os custos da estatal e sua justa remuneração.

Apesar da Petrobras ser superavitária na produção do petróleo em relação a demanda nacional e de ter capacidade para processar cargas com mais de 95% de petróleo nacional em suas refinarias, desde 2016 as direções da Petrobras decidiram inovar e adotar o Preço Paritário de Importação (PPI).

Estabelecem preços como se os combustíveis tivessem sido importados, a despeito de terem sido produzidos a partir de petróleos nacionais e refinados no Brasil.

Com preços altos em relação aos custos de importação, os combustíveis da Petrobras perdem competitividade e até 30% do mercado brasileiro é transferido para os importadores.

A ociosidade das refinarias aumenta também em até 30%, há redução do processamento de petróleo e da produção de combustíveis no Brasil.

No 2º trimestre de 2021, a ociosidade das refinarias da estatal foi de 25%. Outra consequência da política de preços é a desnecessária e perniciosa elevação da exportação de petróleo cru.

O custo de extração (lifting cost) da Petrobrás, incluída participação governamental e afretamento, no 2º trimestre de 2021, foi de 18,53 US$/barril. Enquanto o custo de refino foi de 1,63 US$/barril. Totalizando o custo de 20,16 US$/barril, ou seja, de 0,67 R$/litro dos derivados (para a cotação de 5,30 R$/US$, do 2º tri 21).

É correto afirmar que existem outros custos de Exploração e Produção (E&P), além dos custos operacionais de extração, mesmo se incluídos custos de afretamento e participação governamental.

Pode se assumir, conservadoramente, que o custo de equilíbrio seja de 25,00 US$/barril. Somado ao custo de refino, também conservador, de 2,00 US$/barril, se totaliza o custo de 27,00 US$/barril, suficientes para arcar com
custos operacionais, juros, impostos, seguros, depreciação e amortização.

Temos o custo total de 0,90 R$/litro, em comparação com o preço de 2,00 R$/litro da gasolina, citado pelo sr. Silva e Luna. Margem de lucro de 1,10 R$/litro vendido.

Essa margem de lucro de 122% (1,10/0,90) se justifica para uma companhia estatal cujo objetivo de criação, e prática em período praticamente integral de sua história, foi de abastecer o mercado brasileiro aos menores custos possíveis?

Com relação a tentativa do sr. Silva e Luna de justificar a política de Preços Paritários aos de Importação (PPI), relativamente altos em relação aos custos da Petrobrás e à capacidade de compra dos brasileiros, ao citar apenas o preço recebido pela estatal pelo litro da gasolina vendido nas suas refinarias e o preço ao consumidor, pode ser
tipificada como Falácia da Explicação Incompleta.

Preços dos combustíveis, lucros e investimentos

O sr. Silva e Luna recorre a necessidade de realizar investimentos para tentar justificar lucros derivados da atual política de preços.

“A respeito de preço de combustível, a Petrobras responde pela parte da sua produção. Aqui cabe um detalhamento: ela precisa investir. Então, ela tem que ter algum mínimo de lucro, para que ela possa investir. “

Evidente que é necessário gerar caixa para investir, pagar impostos, juros, amortizações da dívida e pagar dividendos. Mas a política de Preços Paritários de Importação (PPI), tem realmente aumentado a geração de caixa, ou é responsável pela redução do mercado da Petrobras e, nesse aspecto, prejudica ou não contribui para a elevação da geração de caixa?

Se por um lado, a Petrobras ganha mais por litro vendido, por outro, vende menos litros dos derivados e deixa suas refinarias ociosas.

A Tabela 1 mostra a elevação dos preços dos derivados praticados pela Petrobras, em relação ao preço do petróleo Brent no mercado internacional, desde 2015. No mesmo período se observa a redução do fator de utilização das refinarias da estatal, ou seja, a elevação da sua ociosidade.

Apesar de praticar preços relativos mais altos, pode-se observar a redução da geração de caixa (expressa pelo EBITDA) e do lucro bruto anuais. Ao mesmo tempo em que se constata redução significativa do investimento.

Conclui-se que a tentativa do sr. Silva e Luna, de justificar preços relativamente altos para se obter maiores lucros e investimentos é falaciosa diante dos resultados históricos da Petrobras.

A adoção de preços relativamente mais altos, não necessariamente traz maiores lucros e investimentos, além de, historicamente, se observar o contrário. No entanto, diante da complexidade de causas e efeitos não se pode apontar relação dessa simples causa (elevação ou redução dos preços) e efeitos (elevação ou redução dos lucros e investimentos).

Essa Falácia pode ser tipificada como de Causa Complexa.

Gestão de portifólio e “petróleo com tempo de utilização”

O atual presidente da Petrobras afirma: “A ideia de retirar petróleo do pré-sal para transformar em riqueza é algo importante. Nós temos reservas lá dentro. A reserva de petróleo tem um tempo de utilização. Então, temos pressa no pré-sal, temos foco nisso. Por isso, tivemos que fazer uma gestão mais completa de portfólio, de modo que ela possa investir mais naquilo que tem de melhor e desinvestir em algumas refinarias, como ocorreu em oito delas. Há a previsão de que elas sendo entregues nas mãos de terceiros estes possam fazer mais e gerar competitividade e menor preço para a sociedade.”

E acrescenta: “O nosso esforço tem sido focar o pré-sal por considerar que temos pressa na exploração dessa riqueza, dessa reserva que se transforme em riqueza, para não ficar no fundo do mar com a tendência depois de perder o valor que ela tem hoje.”

O sr. Silva e Luna argumenta que é urgente produzir o petróleo brasileiro porque ele teria um “tempo de utilização”. Ou seja, ele sustenta que o petróleo vai deixar de ter valor e assim tenta justificar a gestão de portfólio com a privatização de oito refinarias que respondem por 50% da capacidade de refino da companhia.

Aqui nós temos a premissa de que o petróleo teria um “tempo de utilização” e, por isso, sua produção deve ser acelerada. Depois, a segunda argumentação, de que para acelerar a produção é necessário privatizar as refinarias.

A matriz energética mundial depende dos fósseis que representam 85% do total (Petróleo 34%, Carvão 27% e Gás Natural 24%). A energia nuclear representa 4,4% e as potencialmente renováveis 11% (Hidroelétrica 7%, Eólica e Solar 3%, outras 1%).

A participação das energias de origem fóssil na demanda de energia mundial se manteve estável nos últimos 25 anos. É improvável que percam importância relativa nas próximas décadas, considerando sua qualidade (flexibilidade, facilidade de uso, densidade energética e confiabilidade) e quantidade (disponibilidade), em comparação com as demais fontes primárias de energia.

Com relação aos investimentos e a pretensa necessidade de privatizar refinarias para realizá-los podemos analisar os investimentos históricos e a potencial geração de caixa pela privatização das refinarias.

O petróleo do pré-sal foi descoberto no final de 2006. Os investimentos do segmento de Exploração e Produção (E&P) da Petrobrás, entre 2007 e 2020, foram de US$ 280 bilhões, média anual de US$ 20 bilhões (em valores atualizados).

A refinaria RLAM (Bahia) foi vendida por US$ 1,65 bilhão e a refinaria REMAN (Manaus) foi privatizada por US$ 189,5 milhões. A privatização das duas refinarias representa apenas 0,66% dos investimentos em E&P para descobrir e desenvolver as reservas de petróleo, desde a descoberta do pré-sal. Mesmo se as demais seis
refinarias sejam privatizadas, a geração de caixa é irrelevante se comparada com investimento total e médios anuais para desenvolver a produção do pré-sal.

A premissa de que o petróleo teria um “tempo de utilização” pode ser válida no horizonte de várias décadas, e mesmo assim é duvidosa, não serve para justificar aceleração de produção já que não há substitutos para o petróleo e as energias de origem fóssil. Essa falácia pode ser qualificada como Falácia da Pressuposição.

A tentativa de justificar a privatização das refinarias para acelerar a produção do petróleo do pré-sal não se sustenta, diante da falta de justificativa para tal medida e da discrepância entre a potencial geração de caixa com as privatizações e os investimentos requeridos para o aumento da produção do petróleo. Aqui temos uma combinação entre a Falácia da Pressuposição e a Falácia da Causa Diminuta.

Juros da dívida

O sr. Silva e Luna sustenta que: “Foi feita a pergunta sobre qual era a dívida que a Petrobras tinha. Ela já trabalhou 6 meses para pagar dívida. Já valeu valor muito pequeno em relação à sua dívida, de quase 160 bilhões. Hoje, a empresa está saneada, está indo para seu patamar, porque ela precisa encerrar dívidas. Em vez de produzir recursos, trabalhar 6 meses por ano para pagar juros de dívida, ela trabalha para entregar esse recurso ao seu acionista majoritário, que é o Governo Federal.”

A Tabela 2 apresenta o histórico do pagamento de juros, da geração de caixa e do número de meses de geração de caixa necessários para pagar os juros anuais da dívida.

Os resultados históricos da Petrobras demonstram que entre 2012 e 2020 não foi necessário trabalhar 6 meses para pagar os juros anuais da dívida, como afirmou o sr. Silva e Luna. O período de geração de caixa necessário para o pagamento dos juros anuais variou de 1,33 e 3,48 meses.

O sr. Silva e Luna tenta demonstrar uma contradição entre pagar juros e gerar recursos para o Governo Federal. No entanto, os juros são resultado da utilização de recursos de terceiros para realizar investimentos, aumentar a produção e agregar valor ao petróleo, a fim de aumentar a geração de caixa para, entre outros resultados, gerar
mais recursos para o Governo Federal.

A dívida alcançou o máximo em 2014 com US$ 136,04 bilhões. De 2009 a 2014 a dívida
cresceu US$ 78,42 bilhões que representa o montante captado para cobrir menos de
um terço (31%) dos investimentos no período que totalizaram US$ 252,02 bilhões.

O sr. Silva e Luna partiu de uma premissa falsa, de que a Petrobras tenha trabalhado 6 meses para pagar os juros da dívida anual, para então apontar uma falsa relação de causa e efeito entre elevação de pagamento de juros e redução da geração de recursos para o governo.

A elevação dos juros é resultado da utilização de recursos de terceiros para realizar investimentos, cujas taxas de retorno são superiores ao custo da dívida, que aumentam a geração de caixa e, consequentemente, a geração de recursos para o governo.

Neste caso pode se identificar a Falácia da Invenção de Fatos e a Falácia da Explicação Incompleta.

Aversão aos investimentos?

O sr. Silva e Luna afirmou: “Deputado Paulo Ramos, a Petrobras investirá no Brasil cerca de 300 milhões de dólares nos próximos anos. Não temos nenhuma aversão a novos investimentos, vamos investir cada vez mais.”

A Figura 1 apresenta o histórico dos investimentos da Petrobrás, desde 1965, em dólares atualizados para 2020.

Entre 1965 e 2020, o investimento anual médio da Petrobras foi de US$ 20,13 bilhões. Entre 2009 e 2014, foram US$ 49,80 bilhões por ano.

O sr. Silva e Luna afirma que a Petrobras irá investir US$ 300 milhões nos próximos anos, diz que não tem aversão a
investimentos e que vai investir cada vez mais. O que são US$ 300 milhões nos próximos anos, em comparação com o histórico de investimentos da Petrobras?

Neste caso, se não tem aversão a investimentos e planeja investir tão pouco, pode ser porque desconhece o histórico, a capacidade de investimentos da Petrobras e de sua importância para o desenvolvimento do Brasil.

*Felipe Coutinho é vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras


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Comentários

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Zé Maria

A Ideologia Capitalista Neoliberal encravada na Imprensa de Mercado
e seus/suas C@lunistas Amestrad@s impede a Análise Correta da real
causa do Aumento dos Preços dos Combustíveis.
O desgoverno Bolsonaro/Guedes/Mourão quer transferir a culpa aos
Estados da Federação, atribuindo aos impostos estaduais o motivo dos
reajustes dos derivados de Petróleo (sobretudo Gasolina, Diesel, Gás GLP).
Basta saber que não houve majoração dos tributos estaduais para verificar
que essa afirmação de Bolsonaro é falsa, ou seja, mentirosa.
E é também sabido que, desde o tempo do Golpista Temer, quando mudou
a Política de Preços dos Combustíveis, atrelando-os à Cotação do Dólar e do
Valor do Petróleo Bruto no Mercado Internacional, que os produtos Refinados
não param rotineiramente de subir de preço dentro do País, penalizando os
Brasileiros que, em suma, são os Acionistas Majoritários da Petrobras, não o
Governo Federal.
Portanto a Política de Preços da Petrobras deve beneficiar, primeiro, a População
do Brasil, e só depois os acionistas minoritários na Bolsa de Valores, onde devem
estar mamando os Herdeiros Bilionários do Roberto Marinho e seus Parceiros.

Aliás, nos Governos do PT houve investimento nas Refinarias da Petrobras para
exatamente baratear o custo dos combustíveis no mercado interno, atendendo precipuamente às necessidades dos Consumidores Brasileiros.

Hoje, ao contrário, Guedes/Bolsonaro falam toda hora em privatizar as Refinarias,
onerando ainda mais o custo dos derivados de Petróleo (Gasolina, Diesel e Gás).

Esse prejuízo aos Brasileiros a Mídia ideologicamente Neoliberal não menciona.

    Zé Maria

    “Globo denuncia petróleo e dólar como
    responsáveis por preço do gás de cozinha.
    Sem explicar que o Brasil optou pelo PPI
    no governo Temer. Dolarizou o preço.
    Com apoio da Globo, diga-se.”

    https://twitter.com/VIOMUNDO/status/1443001774017765378

    Zé Maria

    Curiosidade

    Há no Brasil algum trabalhador
    recebendo salário em dólar?

Zé Maria

Excerto

“Os resultados históricos da Petrobras demonstram que entre 2012 e 2020
não foi necessário trabalhar 6 meses para pagar os juros anuais da dívida,
como afirmou o sr. Silva e Luna.
O período de geração de caixa necessário para o pagamento dos juros anuais
variou de 1,33 e 3,48 meses.
O sr. Silva e Luna tenta demonstrar uma contradição entre pagar juros
e gerar recursos para o Governo Federal. No entanto, os juros são resultado
da utilização de recursos de terceiros para realizar investimentos, aumentar
a produção e agregar valor ao petróleo, a fim de aumentar a geração de caixa
para, entre outros resultados, gerar mais recursos para o Governo Federal.”

Nelson

Bem. Ao lermos as explicações e justificativas desse senhor que foi colocado na presidência da maior empresa brasileira para a demolição da cadeia do petróleo no Brasil, cadeia que é uma das mais importantes da economia mundial, podemos medir o nível do patriotismo dessa gente que assumiu o poder com o golpe de 2016. É de pasmar.

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