Indigenista alvo de ameaças e jornalista inglês estão desaparecidos na Amazônia

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Montagem com fotos do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips — Fotos: Divulgação/Funai e Reprodução Twitter/@domphillips

Alvo de ameaça, indigenista da Funai e jornalista inglês estão desaparecidos no Vale do Javari, na Amazônia

 

O indigenista Bruno Araújo Pereira, da Fundação Nacional do Índio (Funai), e o jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian, desapareceram no Vale do Javari, na Amazônia, quando faziam o trajeto entre a comunidade Ribeirinha São Rafael até a cidade de Atalaia do Norte.

 
A informação foi confirmada ao GLOBO pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).

O Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Exército já foram acionados para realizar as buscas. Bruno Araújo era alvo constante de ameaças pelo trabalho que vinha fazendo juntos aos indígenas contra invasores na região, pescadores, garimpeiros e madeireiros. O Vale do Javari é a região com a maior concentração de povos isolados do mundo.

— Enfatizamos que, conforme relatos dos colaboradores da Univaja, essa semana a equipe recebeu ameaças em campo, além de outras que já vinham sendo feitas à equipe técnica da Univaja, além de outros relatos já oficializados para a Polícia Federal e ao Ministério Público Federal em Tabatinga — afirmou Beto Marubo, membro da coordenação da Univaja, entidade composta por indígenas Marubo, Mayoruna (Matsés), Matis, Kanamary, Kulina-Pano, Korubo e Tsohom-Djapá.

Os dois desaparecidos viajavam com uma embarcação nova, com motor de 40 HP e 70 litros de gasolina, o suficiente para a viagem, e 07 tambores vazios de combustível.

De acordo com lideranças da Univaja, os dois se deslocaram com o objetivo de visitar a equipe de Vigilância Indígena que se encontra próxima à localidade chamada Lago do Jaburu (próxima da Base de Vigilância da Funai no rio Ituí), para que o jornalista visitasse o local e fizesse algumas entrevistas com os indígenas.

Os dois chegaram no local de destino (Lago do Jaburu) no dia 03 de junho de 2022, às 19h25. No dia 05, os dois retornaram logo cedo para a cidade de Atalaia do Norte.

No entanto, antes eles pararam na comunidade São Rafael, em uma visita previamente agendada, para que o indigenista Bruno Pereira fizesse uma reunião com o comunitário apelidado de “Churrasco”, com o objetivo de consolidar trabalhos conjuntos entre ribeirinhos e indígenas na vigilância do território, bastante afetado pelas intensas invasões.

— Às 16h, outra equipe de busca saiu de Tabatinga, em uma embarcação maior, retornando ao mesmo local, mas novamente nenhum vestígio foi localizado. Vale ressaltar que o indigenista Bruno Pereira é uma pessoa experiente e que conhece bem a região, pois foi Coordenador Regional da Funai de Atalaia do Norte por anos — afirma o advogado da Univaja, Eliésio Marubo.

Bruno Pereira é considerado um dos indigenistas mais experientes da Funai e e profundo conhecedor da região, onde foi Coordenador Regional da Funai de Atalaia do Norte por cinco anos. É também membro do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente (Opi) e muito respeitado pelos indígenas.

Dom Phillips é um jornalista freelancer britânico que se mudou para o Brasil em 2007, com passagens por São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador.

Além do The Guardian, Phillips já colaborou para o Financial Times, New York Times, Washington Post, Bloomberg, Daily Beast, revista de futebol Four Four Two e o jornal de energia Platts, entre outros. Phillips é atualmente bolsista da Alicia Patterson Foundation e 2021 Cissy Patterson Environmental Fellow.

Em nota , o jornal britânico manifestou preocupação com o desaparecimento do jornalista e afirma que já está em contato com a Embaixada no Brasil.

“O Guardian está muito preocupado e busca urgentemente informações sobre o paradeiro e a condição de Phillips. Estamos em contato com a embaixada britânica no Brasil e autoridades locais e nacionais para tentar apurar os fatos o mais rápido possível”.

Procurada, a Funai ainda não se manifestou.

Abaixo, a íntegra da nota à imprensa da associação.

Atalaia do Norte – AM, 06 de junho de 2022.

INFORME À IMPRENSA

Assunto: Desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e jornalista Dom Phillips

A Coordenação da Organização Indígena UNIVAJA, em nome dos povos Marubo, Mayoruna (Matsés), Matis, Kanamary, Kulina-Pano, Korubo e Tsohom-Djapá e o Opi – Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato vêm a público informar que o indigenista Bruno Araújo Pereira, e o Jornalista Dom Phillips, de nacionalidade inglesa e correspondente do Jornal The Guardian, encontram-se desaparecidos, há mais de 24 horas, no trajeto entre a comunidade Ribeirinha São Rafael até a cidade de Atalaia do Norte, pontos de ida e ponto de retorno respectivamente, no estado do Amazonas.

Os dois se deslocaram com o objetivo de visitar a equipe de Vigilância Indígena que se encontra próxima a localidade chamada Lago do Jaburu (próxima da Base de Vigilância da FUNAI no rio Ituí), para que o jornalista visitasse o local e fizesse algumas entrevistas com os indígenas. Os dois chegaram no local de destino (Lago do Jaburu) no dia 03 de junho de 2022 às 19:25h. No dia 05/06 os dois retornaram logo cedo para a cidade de Atalaia do Norte, porém, antes pararam na comunidade São Rafael, visita previamente agendada, para que o indigenista Bruno Pereira fizesse uma reunião com o líder comunitário apelidado de “Churrasco”, com o objetivo de consolidar trabalhos conjuntos entre ribeirinhos e indígenas na vigilância do território bastante afetada pelas intensas invasões.

Pelo que consta nas informações trocadas, via Dispositivo de Comunicação Satelital SPOT, eles chegaram na comunidade São Rafael por volta das 06:00h, onde conversaram com a esposa do “Churrasco”, visto que este não estava na comunidade e depois partiram rumo a Atalaia do Norte, viagem que dura aproximadamente duas horas.

Assim, deveriam ter chegado por volta de 08h/09h da manhã na cidade, o que não ocorreu.
Às 14h, saiu de Atalaia do Norte uma primeira equipe de busca da UNIVAJA, formada por indígenas extremamente conhecedores da região. A equipe cobriu o mesmo trecho que Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips supostamente teriam percorrido, percorrendo, inclusive, os “furos” do rio Itaquaí, mas nenhum vestígio foi encontrado. A última informação de avistamento deles é da comunidade São Gabriel – que fica abaixo da São Rafael – com relatos de que avistaram o barco passando em direção a Atalaia do Norte.

Às 16h, outra equipe de busca saiu de Tabatinga, em uma embarcação maior, retornando ao mesmo local, mas novamente nenhum vestígio foi localizado.

Ressalte-se que Bruno Pereira é pessoa experiente e profundo conhecedor da região, pois foi Coordenador Regional da Funai de Atalaia do Norte por anos. Os dois desaparecidos viajavam com uma embarcação nova, 40 HP, 70 litros de gasolina, o suficiente para a viagem e 07 tambores vazios de combustível.

Enfatizamos que na semana do desaparecimento, conforme relatos dos colaboradores da UNIVAJA, a equipe recebeu ameaças em campo. A ameaça não foi a primeira, outras já vinham sendo feitas a demais membros da equipe técnica da UNIVAJA, além de outros relatos já oficializados para a Policia Federal, ao Ministério Público Federal em Tabatinga, ao Conselho nacional de Direitos Humanos e ao Indigenous Peoples Rights International.

Paulo Dollis Barbosa da Silva
Coordenador UNIVAJA

Fábio Ribeiro
Coordenador Executivo Opi

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Zé Maria

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“Bolsonaro é Condenado por Dano Moral Coletivo à Categoria dos Jornalistas”

Indenização de R$ 100 mil será revertida para o Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos.

No Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, as e os jornalistas
conquistaram uma vitória histórica contra Jair Bolsonaro (PL).

Em decisão disponibilizada nessa terça-feira, 7, a juíza Tamara Hochgreb Matos, da 24ª Vara Cível da Comarca de São Paulo, condenou Bolsonaro a pagar R$ 100 Mil a título de indenização por dano moral coletivo à categoria.

Em 7 de abril do ano passado, Dia do Jornalista, o Sindicato dos
Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) ingressou
judicialmente com uma Ação Civil Pública [ACP] contra Jair Bolsonaro.

O sindicato pleiteava à Justiça que ele se abstivesse de realizar novas
manifestações com “ofensa, deslegitimação ou desqualificação à
profissão de jornalista ou à pessoa física dos profissionais de imprensa,
bem como de vazar/divulgar quaisquer dados pessoais de jornalistas”,
além de uma indenização de R$ 100 mil, em favor do Instituto Vladimir Herzog.

Na decisão, a magistrada relembrou diferentes ataques de Bolsonaro
aos jornalistas:

“Com efeito, tais agressões e ameaças vindas do réu, que é nada menos
do que o Chefe do Estado, encontram enorme repercussão em seus
apoiadores, e contribuíram para os ataques virtuais e até mesmo físicos
que passaram a sofrer jornalistas em todo o Brasil, constrangendo-os
no exercício da liberdade de imprensa, que é um dos pilares da democracia”,
destaca um dos trechos da decisão.

A juíza Tamara Matos também cita diferentes declarações homofóbicas
e misóginas de Bolsonaro contra jornalistas:

“Restou, destarte, amplamente demonstrado que ao ofender a reputação
e a honra subjetiva de jornalistas, insinuando que mulheres somente
podem obter um furo jornalístico se seduzirem alguém, fazer uso de
piadas homofóbicas e comentários xenófobos, expressões vulgares
e de baixo calão, e pior, ameaçar e incentivar seus apoiadores a agredir
jornalistas, o réu manifesta, com violência verbal, seu ódio, desprezo e
intolerância contra os profissionais da imprensa, desqualificando-os e
desprezando-os, o que configura manifesta prática de discurso de ódio,
e evidentemente extrapola todos os limites da liberdade de expressão
garantida constitucionalmente”.

Desta maneira, a decisão judicial confirma o assédio moral coletivo
contra a categoria de jornalistas, atentando contra a liberdade de
imprensa e contra a democracia, prevendo o pagamento de indenização
de R$ 100 mil reais a ser revertida para o Fundo Estadual de Defesa
dos Direitos Difusos.

Coordenador jurídico do Sindicato dos Jornalistas, Raphael Maia foi
o responsável por preparar e peticionar a Ação Civil Pública do Sindicato
ainda na gestão do presidente Paulo Zocchi.
Para ele, “esta é uma vitória enorme para os jornalistas e para o movimento
sindical brasileiro: não conheço algum caso semelhante em que uma
entidade sindical conquistou uma condenação por dano moral coletivo
de uma categoria a um presidente da República em pleno exercício
do mandato”.

Para Thiago Tanji, presidente do SJSP, a decisão em primeira instância
da Justiça deve ser um marco para toda a categoria:

“Neste Dia da Liberdade de Imprensa, não temos muito a comemorar.
Estamos em busca de respostas sobre o desaparecimento do
jornalista Dom Philips e do indigenista Bruno Pereira e até o momento
as autoridades competentes deram poucas ou nenhuma resposta
efetiva sobre o caso.
Isso materializa o desrespeito à vida e à dignidade que Jair Bolsonaro
carrega desde o primeiro dia de seu mandato como presidente.
Ao conquistarmos essa decisão judicial favorável, lembramos que
a dignidade e a verdade vencerão o ódio e o obscurantismo”.

https://sjsp.org.br/noticias/bolsonaro-e-condenado-por-dano-moral-coletivo-a-categoria-dos-jornalistas-apos-a-9ed6
https://revistaforum.com.br/movimentos/2022/6/7/bolsonaro-condenado-em-ao-de-jornalistas-no-dia-da-liberdade-de-imprensa-118452.html

[Edição: Sintrajufe]

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