Hugo Melo Filho e Anjuli Tostes: Governadores têm o dever de garantir o direito à marcha antifascista no domingo

Tempo de leitura: 3 min
Fotos: Reprodução de vídeo

 Governadores devem garantir o direito à marcha antifascista no domingo

por Hugo Melo Filho e Anjuli Tostes, especial para o Viomundo

Todos os domingos, militantes bolsonaristas promovem manifestações de apoio ao presidente, pedem intervenção militar e o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal.

Exibem faixas, cartazes, lançam palavras de ordem com ofensas aos ministros do STF e aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

Bolsonaro está em todos esses atos. Por duas vezes, sobrevoou-os de helicóptero e, no último domingo, o fez na companhia do ministro da Defesa e ainda permitiu-se o ridículo de cavalgar entre os manifestantes.

Em tais circunstâncias, os participantes estariam supostamente incursos, quando menos, nos seguintes crimes:

— Injúria.

— Ameaça.

— Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de quaisquer dos Poderes da União ou dos estados.

— Incitar a subversão da ordem política ou social.

— Caluniar ou difamar o presidente do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação.

Todos tipificados no Código Penal Brasileiro e na Lei de Segurança Nacional.

No último domingo, em algumas capitais e, com maior expressão, em São Paulo, torcidas organizadas se reuniram em apoio à democracia.

Os vídeos mostram muitos jovens, negros e pardos, periféricos.

Manifestação pacífica, como mostrou a imprensa, somente conturbada pela intervenção da Polícia Militar, que alegou a necessidade de evitar confrontos entre esses manifestantes e outros, que expressavam apoio a Bolsonaro.

Na ocasião, chamou a atenção uma apoiadora do presidente, armada com taco de baseball, bradando insultos e ameaçando manifestantes, escoltada por um soldado.

Do outro lado, um homem negro que protestava contra o racismo, por igualdade e democracia se postava inabalável diante de ofensas dos apoiadores de Bolsonaro.

Desde então, Bolsonaro qualifica de baderneiros e terroristas os defensores da democracia, emulando servilmente, uma vez mais, seu ídolo Donald Trump.

Em termos semelhantes, manifestou-se o General Mourão, em artigo publicado n’O Estado de São Paulo.

Um dos mais toscos asseclas do presidente, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), investigado pelo STF no inquérito das fake news, apresentou uma proposta de alteração da Lei Antiterrorismo, para qualificar os grupos “antifas (antifascistas) e demais organizações com ideologias semelhantes” como organizações terroristas (Projeto de Lei 3019/2020).

Esdrúxula e infame inversão de valores.

Ser antifascista e defender a democracia é coisa de criminosos.

Pedir golpe militar e fechamento do Congresso e do STF, ameaçar ministros e parlamentares são “justas manifestações de pessoas de bem”.

As tentativas de criminalização e as bravatas presidenciais, entretanto, não evitarão o crescimento do movimento antifascista, que deverá levar milhares de brasileiros e brasileiras às ruas no próximo domingo, em defesa da democracia.

O Brasil está farto das ameaças e da truculência arrogante do fascismo.

Notas de repúdio e panelaços de janela não são suficientes.

Um golpe ocorre pela reação insuficiente dos setores democráticos diante da escalada golpista.

É, por isso, um erro cair no paradoxo de postergar manifestações em prol da democracia por temor de que isso precipite a ruptura democrática.

Mais equivocado ainda é culpabilizar aqueles que legitimamente reagem a um golpe já por tantas vezes anunciado.

No campo democrático, ao lado das preocupações relacionadas ao isolamento social (de fato, esta é questão a se cuidar), o mais forte argumento contra os atos do próximo domingo é a preocupação de que os participantes sejam vitimados pela repressão policial, que é dada como certa.

A polícia ostensiva e a preservação da ordem pública cabem, constitucionalmente, às polícias militares.

Estas, queira Bolsonaro ou não, se subordinam aos governadores dos estados e do Distrito Federal (art. 144, §§ 5.º e 6.º da Constituição da República).

Portanto, é dos senhores governadores dos Estados, na condição de comandantes das respectivas polícias militares, que se cobra a responsabilidade de proteger os manifestantes no exercício dos seus direitos à livre expressão de ideias, ao controle social e à defesa da democracia.

É também dos governadores que se demandam ações de inteligência para identificar eventuais infiltrados que pretendam tumultuar os atos.

De nada disso se pode prescindir, dentro da ordem democrática.

Do mesmo modo, não se pode aceitar desses gestores a anuência ao uso de bombas de efeito moral, gás lacrimogênio e balas de borracha contra manifestantes que legitima e pacificamente exercem seus direitos constitucionais.

Deve-se cobrar desses governadores cada uma das prisões ilegais e intimidatórias que tantas vezes ocorrem nesses atos, entre outros procedimentos que configuram desvio de finalidade da ação policial.

É hora de os governadores mostrarem que são eles, e não Bolsonaro, que comandam as polícias militares estaduais.

Que domingo seja dia de festa democrática, momento de livre e genuína expressão popular.

*Hugo Melo Filho é professor de Direito da UFPE e doutor em Ciência Política.

*Anjuli Tostes é advogada e doutoranda em Direito e Economia pela Universidade de Lisboa.

Ambos são membros da Secretaria de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.


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Comentários

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Zé Maria

Domingo, veremos quem manda na PM Assassina.

Antenor

Ameaças fascistas só vão servir de combustíveis para alimentar as manifestações contra Bolsonaro. Elementar meu caro Watson.

Ele faz oposição a si mesmo desde o primeiro dia de exercício do seu mandato.

Coisa de doido!

Trump está a dias ameaçando os manifestantes americanos a dias? Adiantou alguma coisa? Os protestos nos EUA entraram ontem do seu décimo dia.
Até parece que as torcidas de futebol se vão se intimidar. Agora é que elas vão reagir mesmo. Eu por exemplo não tolero ser ameaçado.

Precisa desenhar?

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