Vivaldo Barbosa: Urna eletrônica com voto impresso, exigência de Brizola, deixaria Bolsonaro sem argumento para contestar vitória de Lula

Tempo de leitura: 4 min

O VOTO INVISÍVEL

Por Vivaldo Barbosa*

É muito estranho vermos setores progressistas, de esquerda, democráticos e vinculados aos valores republicanos defender a urna eletrônica sem impressão do voto. O voto invisível.

Anuncia-se amplamente que em nenhum lugar do mundo, ou quase, esta urna sem impressão do voto é utilizada.

Assistimos, recentemente, na eleição americana, os eleitores colocarem a cédula na máquina, que lê o voto e o computa, e a cédula cair numa urna e lá ficar guardado.

Trump quis desacreditar as eleições e tentou contestar a vitória de Biden. Os votos foram recontados em quatro estados e Trump ficou falando sozinho.

Só conseguiu algumas dezenas de fanáticos celerados para invadir o Capitólio e saiu ainda mais desmoralizado. Os votos recontados celebraram a vitória de Biden, que saiu ainda mais legitimado.

No Brasil, nenhuma recontagem pode ser feita porque não existe voto para ser recontado. É invisível.

Muitos alegam que nenhuma fraude foi apontada em 25 anos.

Claro, não há o que apontar, ninguém vê nada, tudo depende da maquininha e das pessoas que preparam e operam a maquininha. O eleitor tem que confiar nos espíritos, ficar possuído de imensa fé.

Na chamada República Velha, a falava-se de “eleição a bico de pena”. A pena fazia as atas que proclamavam os eleitos.

Contra isto se fez a Revolução de 1930, chefiada por Getúlio Vargas. O voto passou a ser feito em cédulas, contadas e recontadas.

Com o avanço tecnológico, disseram-nos que a urna eletrônica eliminaria fraudes verificadas em muitos pontos do País.

Celebramos. Só que as fraudes, que efetivamente aconteciam em muitos lugares, podiam ser desmanchadas por recontagens sob o crivo de juízes da Justiça Eleitoral, muitas vezes dedicados.

E agora, com voto invisível? Nenhuma fraude pode ser apontada, muito menos apurada.

Na última eleição, o candidato a vereador na cidade de São Gonçalo, no Rio de Janeiro, Diamante Negro, brizolista de tradição, líder de seu bairro populoso, agora candidato pelo PT, impressionava pelas movimentações que fazia, o candidato a prefeito se encantava com suas caminhadas.

No final, uma ninharia de votos. Estupefato e com reação indignada dos moradores do bairro, que reclamavam seus votos, correu à Justiça Eleitoral.

Lá mostraram pra ele uma folhinha da urna com seus minguados votos, nada mais podia ser feito.

Na República Velha, exibiam as atas feitas a bico de pena; agora, a folhinha da urna eletrônica.

Aliás, o prefeito bolsonarista eleito naquela cidade surpreendeu todas as expectativas, foi eleito da noite pro dia. Muitos dizem, na noite da contagem dos votos pela urna eletrônica.

A urna eletrônica surgiu com muita publicidade pelos meios de comunicação. O cineasta Arnaldo Jabor, algo porta-voz do governo FHC no horário nobre de televisão, fez verdadeiras poesias de louvor à urna eletrônica.

Muitos externaram preocupação, a figura de Leonel Brizola à frente, com sua força política e moral, e tentaram agregar a impressão do voto à urna eletrônica.

Simples assim: o eleitor veria o voto dado, se estivesse de acordo, apertaria “confirma” e o voto cairia em uma urna.

Se houvesse contestação válida aos votos daquela urna, o juiz determinaria abrir e recontar os votos.

Como deputado federal batalhei muito para isto, ao lado de Brizola.

Técnicos e especialistas sempre apontavam as possibilidades de fraude. Mas o TSE se movimentava, o presidente na época, Nelson Jobim, à frente, nada conseguimos.

Mais tarde, deputados e senadores, que entendem mais de eleição do que juízes, aprovaram lei determinando a impressão do voto agregada à maquininha, com apoio do Presidente da República, que a sancionou.

O TSE escorregou, tergiversou, não aplicou a lei.

Levanta pretextos de custos, distorcidos, pois calculavam não apenas as peças agregadas, mas todo o custo da urna com impressão.

Acontece que os orçamentos da República são feitos pelo Congresso, não pelo Judiciário.

Aliás, o TSE construiu imenso prédio em Brasília, altamente luxuoso.

O Congresso fez mais duas leis e o TSE acionou a Procuradoria Geral da República para levar o caso ao STF, que considerou a lei inconstitucional.

De estarrecer: violaria o sigilo do voto.

Como, se o voto ficaria guardado na urna?

Aliás, a respeito, a Suprema Corte da Alemanha considerou que não imprimir o voto, e este ficar invisível, sem controle material, sem possibilidade de recontagem, viola os direitos do eleitor, fere o regime democrático e desacredita a República.

É séria e grave a preocupação com a urna eletrônica sem voto impresso.

De um lado, o mesmo grupo comanda o TSE na preparação e operação da urna e a mesma empresa ganha todas as licitações, quando são feitas. Ninguém os conhece, sem nenhuma responsabilidade pública.

Por outro lado, os que defendem a urna sem voto impresso são os setores conservadores “mais modernos”, com apoio dos meios de comunicação, que sempre tiveram atuação política nítida nos últimos tempos da vida brasileira.

Sempre de maneira contrária aos interesses populares e nacionais. E os que estão à frente do TSE impedindo a adoção do voto impresso já revelaram às escâncaras seus posicionamentos.

Agora, o Ministro Roberto Barroso acaba de fazer pronunciamento nacional (é incrível, mas um juiz se dirige à nação para se posicionar sobre processo eleitoral, usando recursos públicos para defender sua posição política).

Aliás, o Ministro Roberto Barroso assumiu posição muito incisiva votando pela manutenção da prisão do Presidente Lula na questão da prisão em segunda instância, coisa estranha que o STF criou no direito brasileiro contra texto da Constituição.

E mais incisivo ainda foi agora ao votar favorável ao Moro, decretado suspeito pelo Supremo, e pela continuidade dos processos contra Lula pela Lava Jato de Curitiba, considerados nulos.

Surge estarrecedora a posição de alguns da área progressista favorável à urna eletrônica sem voto impresso, ao lado do conservadorismo mais requintado.

E dizem ser contra porque Bolsonaro está defendendo a impressão do voto, como muitos da esquerda o fazem e já o fizeram.

Talvez, pela primeira vez, Bolsonaro defenda uma coisa com sentido. E dizem que Bolsonaro faz isto porque tem vínculos com a milícia, a impressão do voto beneficiaria a milícia.

Mas como, se o voto fica guardado na urna? O problema da milícia é grave, mas submeter as estratégias políticas progressistas à questão da milícia é pensar política de maneira muito estreita.

A impressão do voto agregada à urna eletrônica nos livraria de um problema delicado: como está pintando a derrota de Bolsonaro, com a recontagem ele e sua turma ficariam sem base para contestar a eleição de Lula.

*Vivaldo Barbosa foi deputado federal Constituinte. É advogado e professor aposentado da UNIRIO.


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Comentários

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Vogner de Lima Moreira

Voto impresso tbm pode ser usado na hora de trocar o comprovante do voto pelo dinheiro com os criminosos eleitorais… quem tá com a máquina na mão jamais perderá a eleição… essa é a intenção desse bozoverno… so assim eles têm chance de vitória… trocando os recibos de urna por dinheiro…

Moisés Rodrigues

Nada de voto impresso. Não sei onde vcs vivem, mas só o fato de existir a possibilidade de conferência já beneficia o miliciano, o pastor, o traficante e os trabalhadores alienados!! Na plebe não há segunda palavra, vale a do feitor mais próximo!!!

Bras

E se! E se!
E se o Bozo estiver defendendo o voto impresso exatamente pra que defendamos o voto digital puro, que é o que de fato lhes favorece?
Convenhamos: os resultados das últimas eleições foram muito estranhos.

João de Paiva Andrade

Faço a ressalva com relação ao sistema eleitoral estadunidense, no qual houve fraudes escancaradas nos votos pelo correio, beneficiando o criminoso de guerra, Joe Biden. As provas disso são fartas; infelizmente Vivaldo Baros, por motivos não revelados, em vez de admiti-las nega-as com a mesma arrogância com Luiz Roberto Barroso defende a não impressão do voto aqui no Brasil.

De resto, o veterano brizolista nos mostra que as eleições no Brasil não são confiáveis e com as urnas eletrônicas, sem impressão do voto, as fraudes são muito mais fáceis de se implementar e impossíveis de se detectar e provar, já que não há registro material dos votos. O articulista poderia citar o que fizeram com Roberto Requião, Brizola Neto e João vicente Goulart, de que roubaram até o voto que deu em si mesmo.

Ademir

Voto impresso é paranoia de miliciano, pois nem na época que se votava em cédula de papel era possível receber um comprovante de votação. Isso nem tem que ser sequer discutido. Dessa maneira simplesmente acabaria com o sigilo do voto. Ademais, esse comprovante expressaria exatamente como o eleitor votou. Então, sabendo-se que um grande percentual de eleitores brasileiros não sabe votar (vota errado) o comprovante não bateria com a cola que ele utilizou para votar, causando um enorme transtorno, e muita contestação.

    José Espare

    Sem querer ofender, recomendo que releia o artigo com atenção para tentar entender a proposta como ela realmente está sendo feita. Na proposta que o autor menciona, só o eleitor confere o que está impresso no voto, e deposita imediatamente numa urna. Não tem como nenhum miliciano saber em quem se votou e nem cobrar a comprovação do voto do eleitor. Essa história de levar comprovante não existe e não foi feita no artigo. Mas, se alguém suspeitar que o miliciano maior, ou algum de seus seguidores pode estar praticando fraude nas urnas eletrônicas a gente tem como exigir a conferência.

Nelson

É desanimador vermos boa parte da esquerda entrar na paranoia, na irracionalidade, de contestar tudo o que vem do Bolsonaro. Por conta disso, essa esquerda tem dito ser contra o voto impresso, quando a mais prejudicada pelas fraudes nas eleições, senão a única, sempre foi exatamente a esquerda.

Com isso, a esquerda acabou deixando que Bolsonaro assumisse para si uma bandeira que era dela.

DIRCEU SCHETTERT

Bolsonaro vai espernear muito com ou sem voto impresso.
Porém, alguém que quer muito o voto impresso está torcendo muito pela aprovação da corrupta ideia para ganhar muuuitooo na produção dessas máquinas.

Jair de Souza

Bem, já tentei expressar essa mesma preocupação por aqui mesmo em Viomundo há alguns dias. Penso que as pessoas progressistas devem refletir mais a respeito desta questão. Bolsonaro pode estar levantando esta bandeira agora por mero oportunismo, como no caso do auxílio emergencial de 600 reais, que ele era contra e no final, acabou capitalizando. Será que nós deveríamos barrar o auxílio emergencial pelo fato de que Bolsonaro estava levando vantagem sem merecer? Acredito que não. Cabe a nós defender as medidas corretas e também lutar para que nossa narrativa seja vitoriosa.

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