Marcelo Zero: A disputa pelo Cazaquistão é tão importante quanto a disputa pelo Brasil

Tempo de leitura: 5 min
O Cazaquistão, localizado na Ásia Central, é peça-chave na disputa pelo domínio da Eurásia. Ela envolve EUA e aliados, de um lado, e Rússia e China, do outro

A Disputa pelo Cazaquistão, a Disputa pelo Brasil

Por Marcelo Zero*

O Cazaquistão, país de 2,7 milhões de quilômetros quadrados, situado na Ásia Central, é peça-chave na disputa pelo domínio da Eurásia, a qual envolve EUA e aliados, de um lado, e Rússia e China, de outro.

Em primeiro lugar, é preciso considerar que o Cazaquistão possui reservas de recursos minerais e de combustíveis fósseis que estão entre as maiores do planeta.

Os dados disponíveis indicam que o Cazaquistão tem a maior reserva mundial de zinco, tungstênio e barita; a segunda maior de urânio, crômio, chumbo e prata; a terceira maior de manganês e cobre; a sexta maior de ouro; a oitava maior de carvão; e a décima segunda maior de petróleo.

As extensas reservas de petróleo e de gás natural, em especial, têm atraído grande número de investimentos estrangeiros e se constituem na base da economia cazaque.

Entretanto, a importância maior do Cazaquistão tange à sua localização privilegiada, a qual torna aquele país uma ponte natural entre o Leste da Asia e o Oriente Médio e a Europa.

De fato, localizado no centro da Eurásia, o Cazaquistão sempre serviu de ponte entre as mais antigas civilizações e de suas respectivas rotas de comércio, de modo a constituir um espaço de intercâmbio social, econômico e cultural entre os inúmeros povos dessa região transcontinental.

A antiga rota da seda tinha no atual Cazaquistão seu elemento central. Por lá passavam as grandes caravanas que uniam a China ao resto do mundo.

Pois bem, a Nova Rota da Seda, principal projeto estratégico da China, também tem no Cazaquistão sua peça-chave.

Saliente-se que a Nova Rota da Seda já está operando no Cazaquistão há vários anos.

O principal eixo da Nova Rota da Seda no país é a ligação ferroviária entre porto seco de Khorgos, na fronteira entre Cazaquistão e China, ao porto de Aktau, na costa do Mar Cáspio.

Khorgos é o principal hub na ligação entre a China e a Ásia Central, e já está operacional desde agosto de 2015.

Outro ramal dessa conexão liga a China ao Irã, país também estratégico da região. Em fevereiro de 2016, o primeiro trem partindo de Zhejiang, no Mar da China, chegou a Teerã, após ter passado por Cazaquistão, Uzbequistão e Turcomenistão.

É preciso observar que a posição geográfica privilegiada do Cazaquistão é também estratégica, no que tange especificamente ao trânsito internacional de gás natural. Assim, o Cazaquistão é rota incontornável para o gás originário do Turcomenistão e do Uzbequistão. O principal destino dessa produção da Ásia Central é justamente a China.

Ademais de ser muito importante para a China, o Cazaquistão é também de grande relevo para a Rússia.

Além de ter sido parte da União Soviética, o Cazaquistão tem 23% de sua população de origem russa. Ele joga também papel central na integração econômica da região.

Com efeito, em junho de 2014, junto com a Rússia e Belarus, o Cazaquistão firmou o tratado de criação da União Econômica Eurasiática (UEE), ao qual se juntaram posteriormente a Armênia e o Quirguistão.

A UEE entrou em vigor em 1º de janeiro de 2015, estabelecendo uma união aduaneira e um mercado comum que abrange mais de 170 milhões de consumidores. Há intenção de expandir essa união às demais ex-repúblicas soviéticas, o que não agrada a Washington.

Pois bem, é dentro desse contexto geoestratégico que devem ser analisados os atuais conflitos internos que se desenvolvem no Cazaquistão.

Muito embora as manifestações contra o governo de Tokayev tenham começado de forma pacífica, motivadas essencialmente pelo aumento dos preços do gás liquefeito, largamente utilizado no Cazaquistão como combustível automotivo, elas rapidamente se degeneraram, especialmente em Almaty, com a ação de alguns grupos armados.

Houve invasões e incêndios de prédios públicos e tentativas de tomar rádios e até o aeroporto. Ao menos 18 policiais foram mortos, além de dezenas de “manifestantes”.

As reivindicações desses grupos prontamente extrapolaram reivindicações econômicas, regionais e por reformas políticas contra a influência onipresente de Nursultan Nazarbayev, que domina a política cazaque desde a época da União Soviética, e se estenderam para o campo geopolítico.

Dessa forma, as reivindicações passaram a incluir, além da renúncia incondicional do atual governo, a criação de um governo provisório que, entre outras coisas, rompa todos os laços com a Rússia e retire o Cazaquistão da União Econômica Eurasiática (UEE).

A atual rebelião no Cazaquistão tem, portanto, um evidente paralelo com a “revolução laranja” da Ucrânia, que colocou aquele país na órbita de Washington, e com as tentativas recentes de desestabilizar o regime de Belarus.

O tiro, entretanto, poderá sair pela culatra. O governo cazaque, alarmado com ação desses grupos armados, apelou para a Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OSTC) para se proteger.

A Rússia está enviando cerca de 2.000 soldados para ajudar a controlar a situação. Assim, a influência da Rússia no Cazaquistão poderá aumentar, em vez de diminuir.

Deve-se ter em mente que a política externa do Cazaquistão é bastante equilibrada. O Cazaquistão, embora tenha relações estreitas com a Rússia e a China, procura manter também uma boa relação com os EUA e a Europa.

A renúncia de Nazarbayev, em 2019, e o início da reforma política e administrativa que dá mais poderes às regiões produtoras de gás e petróleo se inserem numa diretriz que busca aprofundar os laços do Cazaquistão com o Ocidente.

Contudo, a estratégia dos EUA parece ser a de desestabilizar, sempre que possível, regimes amigáveis à Rússia e à China, mesmo que não sejam hostis a Washington.

Caso os EUA consigam colocar no Cazaquistão um regime decisivamente pró-Washington e hostil à Rússia e à China, como conseguiram fazer na Ucrânia, a estratégia de Moscou de unir as antigas repúblicas soviéticas e a estratégia da China de alargar sua influência com a Nova Rota da Seda seriam substancialmente comprometidas. Há muito em jogo.

Apesar de êxito remoto, essa possível aposta de Washington revelaria o grau de agressividade da política externa dos EUA, especialmente no governo Biden.

Tudo indica que, para Washington, não basta um governo ter boas relações com os EUA, tem de ter também uma relação pouco próxima, ou mesmo hostil, com Rússia, China, Irã e outros países considerados “inimigos” pelo Departamento de Estado.

Trata-se, assim, de uma política externa que aposta no conflito e na exclusão geopolítica. Uma política externa que, como afirmei em artigo anterior, tende a dificultar a saída da crise, em nível mundial.

Tal política, frise-se, vale para a Ásia Central, e muito mais para América Latina, região que sempre foi considerada pelos EUA como de “influência exclusiva”.

Dilma foi deposta e Lula foi preso, numa operação desencadeada pelo DOJ, em razão, essencialmente, de uma política externa independente, que, embora não fosse nem de longe hostil à Washington e aliados, colocava ênfase na integração regional soberana e na aliança estratégica com potências emergentes, contrariando os interesses dos EUA.

No continente americano, a disputa pelo Brasil é tão importante quanto a disputa pelo Cazaquistão, na Ásia Central. O Brasil poderá conduzir nossa região para a soberania integrada ou afundá-la numa dependência definitiva.

São peças que podem virar o jogo, no Grande Tabuleiro do Xadrez.

Isso tem de ser levado em consideração, na disputa eleitoral de 2022. O debate sobre política externa tem de ter centralidade, no próximo pleito presidencial.

É preciso que fique claro, para a população, quem de fato coloca o Brasil, e seus interesses nacionais, acima de tudo. E é preciso que todos saibam quem traiu o país e quem quer trai-lo de novo.


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Comentários

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Henrique Martins

Ainda a Marcelo Zero,

Dentro da estratégia de provocar uma leva de revoluções coloridas a partir de um ‘start’ no Cazaquistão está a exportação de terroristas para a região de Xinjiang que é o foco dos conflitos uigures dentro da China.

Henrique Martins

Continuando comentários a Marcelo Zero:

Nesta oportunidade, e aproveitando que hoje acordei com uma crise de ‘sincerídio’ paranormal, eu vou te contar uma coisa sobre o futuro:
Embora os americanos estejam sendo tão enganados quantos os demais seres humanos, eles vão pagar caro pelo egoísmo e por servirem de instrumento do poder maligno desta mulher de sangue azul. Isso porque no futuro próximo ela simplesmente vai destruir a economia americana com receio deles se unirem à China e à Rússia na luta contra ela. Se você viver até lá, verá!

Henrique Martins

Continuando meus comentários a Marcelo Zero:

Outra razão prática muito importante para desestabilizar o Cazaquistão é que a mulher de sangue azul e sua trupe não querem que a Rússia e a China dominem o espaço. O cósmodromo da Rússia está numa região alugada do Cazaquistão. Essa mulher e sua trupe simplesmente quer tomá-lo, até porque é sabido que a Rússia é a pioneira no espaço. A idéia é fazer do fantoche Elon Musk o conquistador do espaço. Essa conversa de Musk sobre turismo no espaço e conquista de Marte é conversa para boi dormir. Os russos e chineses já sabem que Musk está construindo satélites com armas lasers para ela colocar a Terra de joelhos e já providenciaram – RISOS…. – satélites para destruir tais armas antes mesmo delas estarem concluídas. Sendo assim, novamente eu digo: ela vai quebrar a cara. Maldita.

Dito isso: analise o desenrolar das seguintes notícias:
https://www.gazetadopovo.com.br/mundo/china-pede-aos-eua-que-protejam-estacao-espacial-de-satelites-de-elon-musk/

https://br.sputniknews.com/20211102/china-detecta-e-frustra-satelite-invasor-dos-eua-em-missao-de-espionagem-espacial-diz-midia-18185880.html

https://zap.aeiou.pt/china-eua-musk-quase-colidir-satelites-453165
https://mercadosporpinchas.com/o-esmagador-de-satelites-da-china-esta-pronto-eua-tera-um-pear-harbor-espacial/

https://olhardigital.com.br/2021/12/02/ciencia-e-espaco/china-e-russia-atacam-nossos-satelites-todos-os-dias-diz-general-da-forca-espacial-dos-eua/

https://br.sputniknews.com/20210501/armas-avancadas-da-russia-e-china-sao-capazes-de-destruir-satelites-dos-eua-adverte-general-17443245.html

https://www.epochtimes.com.br/china-e-russia-serao-capazes-em-breve-de-destruir-satelites-dos-eua-relatorio/

https://avalanchenoticias.com.br/espaco/satelite-chines-com-uma-mao-robotica-chamada-ameaca-para-satelites-americanos-ele-pode-agarra-los/amp/

Henrique martins

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/01/08/pais-relatam-ataques-no-instagram-a-menino-de-3-anos-que-tem-sindrome-de-down.ghtml

Sob a égide de um governante dominado pelo demônio é natural que outras pessoas endemoniadas se sintam a vontade para saírem de suas malditas tocas.. O bem atrai o bem. O mal atrai o mal.

Henrique Martins

https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2022/01/08/lamentavel-desastre-diz-bolsonaro-sobre-queda-de-rocha-no-capitolio-mg.htm

Estas condolências é só porque Romeu Zema – governador de Minas Gerais – é seu aliado senhor Jair?

Henrique Martins

https://www.terra.com.br/noticias/brasil/politica/filho-mais-novo-de-bolsonaro-ganha-programa-de-radio-no-df,cb2fdd0022025c653682e06747beaeb09trlmmro.html

Hah meu senhor, me poupe. A própria presença deste sujeitinho nessa rádio em si já é uma abordagem política e ideológica.
Não subestime nossa inteligência.
Aliás, isso aí não passa de propaganda eleitoral antecipada e camuflada para a reeleição do pai dele. ‘Emissora independente”, sei…..

Henrique Martins

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2022/01/07/leonardo-sakamoto-uol-news.htm

Bem. De fato, bíblia não enche barriga de ninguém e nem tem o condão de pagar as contas de luz, água, gás, aluguel, gasolina e por aí vai….
Se o cidadão acha mais importante discutir se uma pessoa pode ser gay ou não em detrimento destes fatores básicos para a sobrevivência humana então – sinto muito em dizer – merece passar fome mesmo.

Henrique Martins

https://kogut.oglobo.globo.com/noticias-da-tv/novelas/noticia/2022/01/osmar-prado-surge-pela-primeira-vez-como-o-velho-do-rio-de-pantanal-grande-responsabilidade.html?utm_source=globo.com&utm_medium=oglobo

Eis aí uma bela oportunidade da Globo mostrar para a população a importância do Pantanal e da Amazônia e denunciar a aviltante política do governo Bolsonaro para com a natureza no Brasil.
É de se esperar que a trilha sonora esteja à altura pois as pessoas podem não perceber mais o principal fator de sucesso da novela original foi a trilha sonora.
Se, eventualmente, a Globo não achar ninguém à altura para fazer a trilha sugiro que procurem o Marcus Vianna para produzir ao menos a música principal (no caso, instrumental).
Curiosamente, a trilha de uma das melhores novelas da Rede Globo – O Clone – foi produzida por esse compositor. Portanto, trilha sonora de Marcus Vianna é sinônimo de sucesso.

Henrique Martins

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/helioschwartsman/2022/01/sim-sou-um-tarado-da-vacina.shtml

Quem se compraz em ser néscio numa conjuntura diabólica destas é
oportunista, egoísta e canalha, doente mental como Bolsonaro ou só pode estar dominado pelo demônio que comanda todos os espíritos malignos. A verdade precisa ser dita com todas as letras. Enquanto continuarmos medindo as palavras enquanto essa turma destila dejetos pelas redes sociais vamos continuar sendo arrastados pelas enchentes dos esgotos.

Henrique Martins

https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/moraes-interferencia-bolsonaro-pf/

É isso aí ministro Alexandre de Morais. Muito inteligente essa estratégia porque vai chegar o momento de atuar decisivamente em todos os casos. Em outras palavras, é preciso esperar o homem enfraquecer mais e cair. Não se preocupem porque essa hora vai chegar. Isso eu lhes garanto.

Henrique Martins

Olá Marcelo,

Sobre o seu artigo eu digo que o interesse da Inglaterra (sim… porque os EUA são apenas um longa manus da Inglaterra) em desestabilizar o Cazaquistão é por causa da localização geográfica desta nação espremida entre a Rússia e a China.
Eles querem espalhar uma revolução colorida na região alcançando essas duas nações para derrubar seus governos usando as redes sociais e supostas ONGS para insuflar manifestantes. Eles fizeram isso no Oriente Médio e a coisa realmente se espalhou. Por aqui eles quase derrubaram Dilma com as manifestantes insufladas pelo Facebook em junho de 2013.
Mais desta vez a dona do sangue azul e sua trupe vão quebrar a cara porque tanto a Rússia como a China já sabem como a coisa funciona e vão reagir nos moldes necessários.

    José Carlos Tavares

    Henrique, concordo em gênero, número e grau com a sua observação. Parabéns.

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