Lincoln Secco: A dama afogada e o tsunami de violências que se forma

Tempo de leitura: 4 min

o som ao redor

Cena do filme O som ao redor, de Kleber Mendonça Filho

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

A DAMA AFOGADA         

Lincoln Secco, em Núcleo de Estudos d’o Capital, sugerido por Antônio David

Existe uma situação no xadrez em que um jogador em absoluta inferioridade consegue empatar a partida. O seu Rei está ameaçado por todos os lados e ele não pode fazer nenhum movimento. Ainda assim, não está em cheque e nessa situação sem saída declara-se o empate. Alguns chamam a isso de “Rei afogado”.

É óbvio que a presidenta Dilma Roussef está numa situação assim: a que poderia ser chamada de Dama afogada, caso as regras do Xadrez não tivessem sido inventadas por homens.

Cercada por todos os lados, é preciso dizer que não é de somenos importância que a primeira mulher presidenta tenha resistido ao apelo pela renúncia. Talvez a sua força individual nesse isolamento venha a ser o único legado de um governo desastroso.

Colapso

Durante a crise do governo tucano em seu segundo mandato, embora o PT liderasse manifestações de rua e o petista Tarso Genro tivesse sugerido a renúncia de FHC, o partido jamais contou com apoio do PMDB (e obviamente da mídia) para um golpe contra um presidente em baixa popularidade e marcado pela ilegitimidade de uma reeleição comprada no Congresso.

Quando o PT chegou ao governo imobilizou os movimentos sociais, como era de se esperar e, assim, o partido constituiu o polo negativo de um circuito que reproduz uma Democracia Racionada.

Claro que ele visou reformar por dentro, mas a única saída seria em algum momento o curto-circuito.

Só que depois de junho  de 2013 o polo negativo que compunha o circuito fechado da dominação democrática desapareceu e tornou supérflua a esquerda integrada, especialmente porque ela é parecida, mas não é igual à Direita. Ela aceitou a Economia como o reino intocável, mas insistiu em alguns gastos sociais.

Ao PT cabia a partir dali superar o lulismo e montar uma nova Frente em 2014 sem o PMDB. Correria o risco de perder a eleição, mas veria agora o PSDB promover o ajuste fiscal.

Ou vencer e entrar numa crise de governo minoritário, mas com mobilização social. Mantendo a estratégia conciliadora só obteve um governo sem maioria no congresso e na sociedade.

Ainda assim, em 2015 o fio desencapado não foi o PT e sim lideranças frustradas de outros partidos. Parece que as elites políticas, empresariais e judiciárias chegaram à conclusão de que o PT não é mais necessário.

A crise pela qual passamos não terá fim em seis meses ou mesmo em alguns anos, qualquer que seja o desfecho da disputa pelo poder. Poderá adormecer, mas voltará à tona a cada luta eleitoral, judiciária e midiática, especialmente se o PT tiver uma candidatura competitiva em 2018.

Sociedade Afogada

Pode ser que dessa vez o nível de violência social tenha subido tanto que não possa mais ser domesticado. Não me refiro à violência bárbara e costumeira da história do Brasil. O atendimento social armado do qual fala Paulo Arantes já revela o quanto o Estado se previne!

O PT moveu, sem que o quisesse, as placas tectônicas da sociedade. Só que, embora civil, ela nunca foi civilizada.

As pessoas passaram a se acotovelar nos aeroportos, antes espaços privilegiados da classe média. Agrediram-se acovardadas sob a proteção da internet.

Engarrafaram mais o trânsito em cidades que nem chegaram a ser espaços de cidadania. Não chegaram a ler os livros e a frequentar o sindicato, dois elementos da formação básica de qualquer esquerda.

Basta andar nas ruas quentes e inóspitas de São Paulo. Elas eram até mais  sujas e violentas nos anos 1980, mas faltavam-lhe ainda esse olhar recíproco de ódio sem esperança. Mesmo sem jornais e com sindicatos restritos a setores oligopolizados, o PT se organizava em núcleos de base, logo  abandonados em favor do projeto eleitoral.

Cinema

Para sugerir uma leitura da  crise recorro a três filmes. Entre o de Sergio Bianchi (Cronicamente Inviável, 2000) e o de Kleber Mendonça Filho (Som ao Redor, 2012) há uma transformação surda.

O primeiro com o ceticismo em torno de alguns exemplos individuais; o segundo construindo os conflitos sociais no tecido das relações de indivíduos concretos. Bianchi fez o retrato no qual as personagens são necessariamente inviáveis.

Já o filme de Anna Muylaert (Que Horas Ela Volta ) chegou às telas no fim da aventura lulista (2015) exaltando a ascensão da filha de uma empregada doméstica. Mas ali, apesar de cenas tocantes como a da empegada que aperta as bolinhas de plástico de uma embalagem (que um espectador de classe média não entenderá), a personagem central é um títere de uma estrutura e recebe a consciência de fora. O bem intencionado filme de Muylaert é uma autocrítica da classe média.

Kleber Mendonça Filho seleciona um condomínio no Recife como espaço de mediação entre aquilo que o cerca e a vida cotidiana dos moradores, empregados e seguranças. A polícia e a extorsão estatal são para os de fora.

Aquela vida é perpassada pela totalidade das relações sociais: a mudança e a não mudança transparecem na atmosfera de medo. Assim, ele só precisa de ruas vazias. Na própria imobilidade do cotidiano há História: a do coronelismo moderno e a da vingança social.

Acredito que dormimos sem suspeitar que um Tsunami de violências se forma. As nossas elites trabalham todos os dias para isso.

Leia também:

Mino Carta: Vazamentos da PF provam que a PF trabalha contra o governo


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Bacellar

Alguns chamam não…Rei afogado É um termo do xadrez. Empate por imobilidade.

Se não se está em cheque e nenhum movimento é possível. Independe de estar em vantagem ou desvantagem embora evidentemente o “afogado” geralmente esteja apertado.

Jogar por um empate e conquista-lo quando se está em franca desvantagem é uma vitória. Aliás creio ser uma das coisas que mais irritam um enxadrista…Empatar um jogo que se poderia ter ganho…

FrancoAtirador

.
.
FSM 2016: Fórum Social Mundial 15 ANOS
.
Auditoria Cidadã da Dívida realiza atividade
Dia 20 de Janeiro no FSMPoA 2016
.
No próximo dia 20 de janeiro, quarta-feira, às 10h45min,
o Núcleo RS da Auditoria Cidadã da Dívida realiza o painel
“Auditoria Cidadã da Dívida e Direitos Sociais”,
na Escola Municipal de Ensino Fundamental Porto Alegre – EPA
(rua Washington Luiz, 203, Centro Histórico, PoA-RS).
.
O painel faz parte das atividades auto-gestionadas do Fórum Social Mundial 2016,
que neste ano completa 15 anos e será realizado de 19 a 26 de janeiro em Porto Alegre.
.
Para ter acesso à programação completa do FSM2016 e obter maiores informações,
.
acesse: (http://forumsocialportoalegre.org.br) (http://fsmpoa.com.br/default.php)
.
.
A Auditoria Cidadã da Dívida: (http://www.auditoriacidada.org.br)
.
A Auditoria Cidadã da Dívida é uma entidade de caráter nacional que, desde 2000,
coleta e divulga dados e informações sobre a situação da dívida pública brasileira,
que, a cada ano, suga quase 50% do Orçamento da União.
.
Os integrantes da entidade, como o próprio nome diz, defendem que seja realizada
uma Auditoria da Dívida com Ampla Participação da Sociedade Civil.
.
.

FrancoAtirador

.
.
Internamente, a População Brasileira sofre os Efeitos de uma Insensata Campanha Virtual
.
para uma Guerra de Secessão, Estimulada pela Mídia Jabáculê do Sudeste (Rio e São Paulo)
.
e repercutida pelas Afiliadas das Regiões Sul (PR, SC e RS) e Centro-Oeste (GO, MT e MS),
.
com Origem naqueles Gráficos Bipolares Azuis e Vermelhos, em vez de Roxos e Lilases,
.
desde o 2º Turno da Eleição Presidencial de 2010, quando Dilma Vana venceu Zica Serra.
.
.

Deixe seu comentário

Leia também