Gilson Caroni: 1964, a atualização grotesca dos nossos liberais

Tempo de leitura: 3 min

Resta à grande imprensa sufocar quem denuncia seu modus operandi e esboçar cenários eleitorais contando com quadros sem qualquer organicidade fora de suas bases, como Eduardo Campos,  Aécio Neves ou Marina Silva

por Gilson Caroni Filho

1964: a atualização grotesca dos nossos liberais. Se estudasse a mídia brasileira como um caso sobre serial killers, o investigador diria que existe um padrão clássico de ação: primeiro vem a tentativa de imputar aos governos progressistas toda sorte de corrupção e desmando; depois a tentativa de calar a voz dos que se opõem à sua narrativa; e, finalmente, vem a excitação dos segmentos raivosos da classe média ao sabor de insanáveis pavores arcaicos que povoam o imaginário desta fração de classe, apresentando políticas inclusivas como uma ameaça fatal a seus supostos privilégios.

Ao invocar o golpe de Estado de 1964, os editorialistas receitavam o antídoto contra a guinada da subversão como pretexto para barrar o avanço social e impedir a tomada de consciência política que começava a esboçar uma linha de resistência anti-imperialista com uma nitidez nunca havida antes em nosso passado.

O resultado de duas décadas de oligarquia empresarial-militar, inaugurada com o golpe, exibiu um saldo sinistro com o que, à época, se convencionou denunciar como a pior crise econômica, política, social e moral da nossa história. O Brasil, urdido neste novo pacto, foi, por excelência, o“antipaís”. Subordinados, da forma mais completa possível, toda nossa economia e o aparelho estatal foram orientados e redimensionados de maneira a afastar, abafar ou reprimir qualquer obstáculo a essa subordinação. É dessa lógica que emergiu um regime que tinha como metodologia a censura e o terrorismo de Estado, ambos sob a bênção de nossas melhores consciências liberais e seus impérios jornalísticos.

Tempos passados? Sem dúvida, mas não nos iludamos: se mudou a conjuntura, alguns objetivos continuam na agenda da direita e de seus intelectuais orgânicos, como vimos nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso.

Sempre é bom recordar que há 28 anos, apesar do deslocamento político, a hegemonia do processo de transição encontrava-se com a mesma burguesia brasileira condutora do golpe. Se não era mais possível a acumulação capitalista se realizar através de uma economia planejada, centralizada e estatizante, os corifeus dessa mesma classe erigem globalização, flexibilização, desregulamentação e livre concorrência como dogmas, mas o objetivo permanece: a modernização acompanhada da internacionalização da economia e da limitação, com a judicialização da política, da democracia ao grupo organicamente ligado a interesses financistas. Para isto, existe o Instituto Millenium e seus jornalistas, acadêmicos e juristas amestrados.

Em 2013, é visível que o espartilho autoritário não consegue mais conter a pujança do corpo social. Há dez anos, há diálogo entre quem governa e os movimentos sociais que expressam anseios de liberdade, de participação e de melhoria substancial das condições de vida de grande parte da população. O que assistimos é uma ruptura com os pilares de sustentação do regime militar e dos três governos que lhe sucederam.

O que resta à grande imprensa? Sufocar financeiramente quem denuncia seu modus operandi, esboçar cenários eleitorais contando com quadros partidários sem qualquer organicidade fora de suas bases regionais, como é o caso do governador de Pernambuco,Eduardo Campos, do senador mineiro Aécio Neves ou da eterna linha auxiliar, Marina Silva, a neoconservadora do ecossistema político.

O desespero acentua o efeito combinado de avanço tecnológico com furor reacionário,criando campo propício à proliferação de articulistas raivosos e humoristas de boteco. A extensão do grotesco é tão acentuada que seus “bons propósitos” não enganam a mais ninguém. Estão todos na ordem do riso. E da exclusão social.

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Comentários

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Jovens defendem prorrogação da Comissão Nacional da Verdade « Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Gilson Caroni: 1964, a atualização grotesca dos nossos liberais […]

Maldoror

Não há nada demais com a globalização e com a livre concorrência, desde que ela seja, de fato livre. Aqui, como em vários outros Estados ditos “de primeiro mundo”, não há concorrência livre e sim conglomerados econômicos, verdadeiros oligopólios/monopólios/cartéis que, através de seu poder econômico, cooptaram agentes públicos para agirem em seus próprios interesses.

Julio Silveira

É um texto interessante. Mas não podemos desconhecer que há traidores. Esses que falsamente se solidarizam com as vitimas, que se passaram e se passam por vitimas, para justamente angariar cumplicidades e permitir a continuidade desse fluxo de mudanças estáticas. Enquanto isso, as verdadeiras vitimas, que para mim são aquelas que provam ter ogeriza pelo mal que sofrem, tudo fazem para evitar e impedir que o mesmo mal possa acometer sobre outros no futuro, são traidos por aqueles que discursam a contrariedade, mas nada fazem para impedir a continuidade do abuso. Esses também devem ser expostos. Esses que se associam com seus ditos agressores, esses ajudam a perpetuar a escuridão por trás desse oculto mal social para a maioria, mas que se beneficiam e se remuneram bem pela conversão em segredo, muitas vezes recebendo crença funesta para a maoiria de serem heróis.

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