E se isto tivesse ocorrido na Venezuela?
Por: Atilio Boron | quinta-feira, 27/02/2014 20:41h|
Na Aporrea, traduzido por Jair de Souza
No passado fim de semana as agências de notícias informaram sobre o atentado sofrido no domingo 23 de fevereiro por Aída Avella, a candidata presidencial da União Patriótica para as próximas eleições que terão lugar na Colômbia em 25 de maio.
Avella ia acompanhada por Carlos Lozano, candidato a senador por essa força política, quando transitavam numa caravana pelo Departamento de Arauca, fronteiriço com a Venezuela. Subitamente, seu veículo foi atacado por dois pistoleiros desde uma motocicleta de alta cilindrada, os quais dispararam com armas de grosso calibre tanto ao automóvel blindado em que se encontrava Avella e Lozano como aos de sua escolta.
Felizmente, não houve vítimas fatais a lamentar. Se os matadores tivessem atingido seu objetivo, Avella teria sido a terceira candidata presidencial da União Patriótica a ser liquidada e uma mais, provavelmente com Lozano, a engrossar a lista de uns 5.000 militantes da UP assassinados pela direita colombiana, no governo e fora dele.
A UP surgiu como resultado de uma negociação entre as FARC e o governo do presidente Belisario Betancur em princípios da década dos oitenta, fruto da qual foi feito um acordo, em 1984, para admitir a incorporação ao jogo institucional de uma força política partidária que possibilitasse a progressiva incorporação da guerrilha à legalidade política do país.
Assim se conformou a UP, que apresentou candidatos a todos os cargos em disputa.
Porém, esta iniciativa abriu as portas do inferno e tanto os paramilitares como os narcos e as próprias forças de segurança do Estado colombiano aproveitaram a vinda à superfície dos quadros e militância da esquerda – fossem eles guerrilheiros ou não – para perpetrar um genocídio político sem precedentes, exterminando aqueles que haviam confiado no que fora pactuado com Betancur e acreditaram que o estado de direito e a vontade de pôr fim ao conflito armado tinham finalmente sido implantados na Colômbia.
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Como consequência deste banho de sangue foram assassinados os dois candidatos presidenciais apresentados sucessivamente pela UP em 1985 – Jaime Pardo Leal e Bernardo Jaramillo Ossa – aos quais se somaram 8 parlamentares, 13 deputados, 70 vereadores, 11 prefeitos, além de milhares de militantes de base desaparecidos ou mortos por esta sangrenta operação.
Esta história trágica não é suficientemente conhecida, mas constitui o pano de fundo das difíceis negociações travadas em Havana entre o governo colombiano e as FARC, cujos integrantes e simpatizantes se perguntam, à luz dos crueis ensinamentos da verdade histórica, se a coisa agora poderá ser diferente.
No entanto, o objetivo destas linhas não é resenhar este deplorável capítulo da história colombiana e sim ressaltar a infame manipulação da imprensa de direita – na Argentina como no resto do mundo – que silenciou o atentado sofrido por Avella, ao passo que difundia manchetes em oito colunas com suas mentiras e suas fotos forjadas sobre os incidentes e as mortes desencadeadas pela tentativa golpista na Venezuela.
Conclamo aos leitores tão somente a pensar como teria reagido a imprensa autoproclamada “livre e independente”, que nos manipula e desinforma, se um atentado similar tivesse ocorrido na Venezuela contra Henrique Capriles. A gritaria da SIP, da CNN, da NTN24 e de todas as cadeias de rádio e televisão, além da imprensa escrita, teria sido ensurdecedora.
E os Vargas Llosa, Montaner, Krauze e companhia nos teriam sufocado com suas filípicas condenações à “tirania chavista” e seu fustigamento criminoso praticado contra seus opositores.
Mas, nada disto aconteceu porque a Colômbia está midiática e politicamente blindada pelo império e seus comparsas regionais. A notícia, nos escassos casos em que foi exposta, foi relegada a uma breve nota nas páginas interiores de alguns jornais, ou a um fugaz flash no rádio ou na televisão.
Claro que a Colômbia é uma peça vital no xadrez do império na região: não à toa seu Ministro de Defesa, Juan Carlos Pinzón, elaborou um minucioso documento de 55 páginas dirigido a seus parceiros do Pentágono e da Casa Branca, incluindo o diretor da CIA, John Brennan, com os quais se reunirá nesta sexta-feira.
Escrito em inglês perfeito, para facilitar o trabalho de seus anfitriões, foi dado a conhecer à imprensa por algum funcionário do ministério.
Seu conhecimento permitiu comprovar, entre outras coisas, que Bogotá ratifica sua total submissão aos imperativos estratégicos dos Estados Unidos e a necessidade de reforçar a cooperação entre ambos países, tendo em conta os graves “desafios potenciais” que representam para a região governos como os da Nicarágua, Venezuela, Rússia e Irã.
Por isso um atentado como o sofrido por Avella não é notícia, enquanto que as tropelias dos opositores venezuelanos aparecem como a nobre cruzada de uns patriotas desejosos de pôr fim a uma tirania abjeta.
Com tal de atingir este objetivo supremo, deixa-se de lado qualquer limite ou escrúpulo moral.
Por isso o inverossímil Prêmio Nobel da Paz que ocupa a Casa Branca se permite exigir do presidente Maduro que ponha em liberdade aos sediciosos: quer dizer, não os manifestantes que protestam pacificamente, senão que aqueles que por meio da violência conspiram para derrubar um governo legítimo surgido das urnas (e que se cometessem o mesmo nos Estados Unidos passariam o resto de suas vidas numa prisão de segurança máxima), ao passo que mantém injustamente na prisão aos lutadores antiterroristas cubanos e aos presos de Guantánamo, enjaulados como se fossem animais ferozes e privados do mais elementar direito à defesa e a um juízo justo.
Disto tudo esta imprensa “livre e independente” não disse, e nem dirá, uma só palavra.
PS do Viomundo: A CNN en español é máquina do golpe 24 horas por dia, 7 dias por semana.
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