Marco Aurélio Mello, de Montreal: Naomi Klein bate duro; o capitalismo ganhou mas não levou

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por Marco Aurélio Mello, de Montreal, especial para o Viomundo

Tive a curiosidade de perguntar no centro de imprensa quantos jornalistas brasileiros estavam cadastrados para cobrir o Fórum Social Mundial.

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Corremos uma grande lista e pasmem, além de mim, nenhum outro. É assustador! Se a gente considerar que estamos falando da oitava ou nona economia do planeta, chega a ser trágico. Só há uma explicação para isso: a alta concentração da nossa mídia, que estrangula a concorrência e define a agenda da cobertura.

Vou dar outro exemplo de como a concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucos é danosa para uma nação. Aqui em Montreal não se vê nas ruas pessoas vestidas obedecendo a um padrão.

Ao contrário do Brasil, onde você pode classificar pessoas apenas observando a maneira delas se vestirem. E por que acontece isso? Simples, no nosso país, ao começar a nova novela das nove, as personagens passam a ditar todo o padrão de moda, beleza e consumo. A meninada ora quer ser periguete, ora quer ser Antonelli. Quem não se lembra da viúva Porcina? Esta ditadura acaba com a individualidade das pessoas.

Só há uma maneira de mudar isso, com educação: plural, aberta e crítica. Só o conhecimento nos liberta.

Conhecimento que me mostrou ter o balconista do café no Paço das Artes. Thomas nasceu no Canadá, mas é filho de chineses radicados aqui.

Bastou eu dizer minha nacionalidade para ele perguntar: existe uma situação política bastante complicada no Brasil, não é mesmo? Sim, eu respondi. Depois que derrubaram sua presidente, quem ficou no lugar? O vice, eu falei. E o que você pensa disso? Acho gravíssimo, respondi. E não há o que fazer? Infelizmente, não. Temos que esperar, encerrei agradecido.

Como é bom saber que o mundo olha para nós com interesse, ao contrário de muitos de nossos compatriotas, tão alienados e vulneráveis ao poder descomunal dos meios de comunicação.

O Brasil tem muita tradição e importância estratégica no Fórum Social Mundial. Nestes quinze anos de existência do evento quase a metade das doze, cinco edições, foram realizadas em nosso país: quatro em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e uma em Belém, no Pará. Há inclusive um brasileiro na organização, Chico Whitaker, co-fundador do Fórum.

Chico é arquiteto, político e ativista social brasileiro. Em 2006 recebeu do Parlamento Sueco o “Prêmio Nobel Alternativo” da Right Livewood Award. O prêmio veio 40 anos depois que, em 1966, ele teve que se exilar do país. Depois de voltar ao Brasil nos anos 80, Chico se elegeu vereador em São Paulo pelo PT, por duas legislaturas. Em 2006 ele se desligou do partido e assumiu sua condição de ativista político.

Mesmo sem a cobertura jornalística que deveríamos estar fazendo, nosso prestígio ainda é muito grande com os ativistas. Nosso país avançou muito em programas sociais, como o Bolsa Família, o Mais Médicos, o Minha Casa Minha Vida, o Plano de Aceleração do Crescimento e várias outras políticas estruturantes, distributivas e afirmativas. O que entristece é que nossa mídia associada às grandes coorporações e a políticos inescrupulosos está afiançando um projeto de desmonte cruel em nosso país, enquanto a sociedade anestesiada apenas assiste.

Fui provocado por uma reflexão importante dia desses. Já imaginou como foi a construção do muro de Berlim? Pense nos alemães assistindo complacentes uma cidade ser dividida ao meio. Qual não foi o grau de ódio e indiferença que permitiu separar irmãos em dois lados diferentes da mesma cidade? Transpondo para o nosso país, o que vemos é um enorme muro invisível que quer separar os “honestos” dos “petistas”. Como se as coisas fossem simples assim…

Passadas rápidas me levam em direção à universidade. É a conferência mais esperada deste Fórum, depois que Bernie Sanders cancelou sua participação no dia anterior. Cerca de mil pessoas aguardam ansiosas para ouvir Naomi Klein.

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A jornalista e intelectual canadense é hoje uma das ativistas mais importantes do planeta. No Brasil ficou conhecida por seus documentários que circularam muito na rede: The Corporation (A corporação, de 2003) e The Shock Doctrine (A Doutrina do Choque, de 2009).

Ela bateu forte em seu país e em seu governo.

Começou dizendo que quinze anos atrás participou do primeiro Fórum Social Mundial. E que de lá para cá ele não é mais social, porque 70% dos requerimentos de vistos dos países do Sul Global (países pobres ou em desenvolvimento) foram negados pelo Canadá. O que é estranho, porque quem vem para um evento como este está profundamente vinculado às causas locais e não faz sentido negar-lhes acesso.

Segundo ela, o que seu governo deveria temer são os turistas americanos que prometem deixar os Estados Unidos em massa rumo ao Canadá caso Donald Trump vença as eleições. O comentário arrancou gargalhadas da plateia. Piada à parte, para Naomi Klein o mundo precisa de uma nova lógica que ela chama de fim do fim da história.

Para Klein, ao contrário de Francis Fukuyama, pai da teoria que decretou a vitória definitiva do capitalismo em 1989, o que se vê hoje é uma derrocada do sistema. As agendas das grandes corporações já não dão mais conta de barrar a destruição sistemática do meio ambiente e o aumento das desigualdades. “Estamos diante do precipício”, declarou.

Mas, ao contrário dos fatalistas, Naomi Klein tem esperança. O fenômeno Sanders nos Estados Unidos, o sindicalismo renascendo no Canadá e tantos outros exemplos em ebulição mundo afora, são uma prova de que há resistência. No entanto, ela não passa mais pela esquerda tradicional. A reinvenção da esquerda requer um redirecionamento econômico. Não podemos mais explorar. O que é preciso é cuidar: das pessoas e do meio ambiente.

Otimismo à parte, na volta para casa, uma passeata atravessa a principal avenida do centro da cidade, onde estão todas as grandes corporações do planeta: de grifes francesas a cadeias de fast food. Os manifestantes não passam de 30. Mas não é o número que importa, e sim a tese que esses jovens defendem, a destruição do capitalismo.

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Por isso, o aparato policial é descomunal. São seis motos, dois carros e um blindado. Eles, os capitalistas, estão de olho em nós. E farão de tudo para defender seus privilégios.


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Comentários

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Roberto

Virou moda dizer que a “esquerda tradicional” não serve mais para lutar contra o capitalismo, que isso agora ficou a cargo da “nova esquerda”. Mas que “nova esquerda” é essa? Será que é o partido grego Syriza e seu líder Alexis Tsipras? Espero que não, pois o Syriza traiu o povo grego e entregou o país, de bandeja, ao Banco Central Europeu.
Será que a “nova esquerda” é composta pelo tal “movimento passe livre”, pelos mascarados da CIA, pelas Sininhos e coletivos do eixo quebrado? Espero que não, pois eles iniciaram o movimento pela derrubada de Dilma.
A luta de classes EXISTE, e ela tem que ser vencida pela força organizada dos trabalhadores. Ainda não inventaram nada mais efetivo.

Nelson

O Capitalismo ganhou e a natureza, o planeta e, por conseguinte, a humanidade, perderam.

O sistema vive uma crise insolúvel. Obviamente, quando eu escrevo insolúvel, quero afirmar que o capitalismo não tem como – sua lógica não permite – garantir a cada ser humano a vida minimamente digna a que tem direito.

Obviamente, também, que, deixados livres, sem pressão alguma, os capitalistas sempre encontram soluções para postergar a vida de seu sistema. Para tanto, eles, simplesmente, empurram os custos de cada crise aos que têm pouco, ou nenhum, poder econômico e político, salvando assim seus lucros.

Uma forma, uma válvula de escape, que os capitalistas inventaram agora para se perpetuarem no poder é a privatização dos serviços: água, luz, educação, saúde, previdência. Este setor garantirá a eles faturamento, e lucros, por muito tempo. Afinal, quem pode prescindir desses serviços? E assim o sistema vai e perpetuando.

Por último, vamos falar da conta a pagar, que vai ficar, é claro, com o povão. Quando se privatiza um serviço público que, por sua própria condição, não visa o lucro mas sim a satisfação das necessidades do povo, inevitavelmente, preços e tarifas irão aumentar bastante. É preciso satisfazer a sede de lucros do empresariado capitalista que vai tomar conta desse serviço.

Como é que os milhões de Lulipes da vida não conseguem enxergar isso? Propaganda ideológica, cara pálida. Repetida exaustivamente como prescrevia Goebbels.

Ernest Question

Um plano quase perfeito

Globo: o Golpe se vê por aqui

Não esquecer: a Globo está à venda!

publicado 15/08/2016

No Conversa Afiada

Reprodução: Carta Maior

O Conversa Afiada reproduz agudo texto de Tatiana Carlotti e lembra: o PiG está decadente e a Globo, à venda!

Da manipulação ao ocultamento da informação, o Jornal Nacional (JN) resolveu partir para o escárnio na última semana. Do principal jornal do país, em pleno horário nobre, ouviu-se um silêncio “retumbante” frente às delações dos empresários da Odebrecht na Operação Lava Jato.

A delação de Marcelo Odebrecht, estampada no panfleto Veja, apontava R$ 10 milhões em propina pagos pela construtora ao PMDB, em 2014, a pedido de Michel Temer, o presidente ilegítimo e interino. Na Folha, destaque para as denúncias de um repasse de R$ 34,5 milhões ao caixa dois da campanha de Serra, em 2010.

O timing foi olímpico. As notícias já se misturaram às manchetes sobre os jogos mundiais, de maior apelo entre a população, e desapareceram do noticiário. De qualquer forma, a exposição das delações, por veículos midiáticos nada ilibados, revela as rachaduras entre os golpistas. Em seu xadrez semanal, publicado site GGN, Luis Nassif aponta dois campos de forças do lado de lá:

“O poder mercado, composto pelo mercado propriamente dito, grandes grupos, a mídia e autoridades brasilienses, além do apoio constante dos Estados Unidos”. E “a camarilha dos 6 – Michel Temer, Eliseu Padilha, Geddel Viera Lima, Roberto Jucá, Moreira Franco e o finado Eduardo Cunha – que representa a maioria ocasional no parlamento” (Leia a íntegra do artigo aqui).

É neste contexto que, porta voz dos interesses do mercado, dada sua imensa capilaridade na população brasileira, o JN vem criando a atmosfera favorável ao verdadeiro abate dos direitos democráticos e constitucionais que se avizinha. E, claro, naturalizando o golpe do qual a Rede Globo foi uma das principais protagonistas.

Descalabro petista

Desde a posse de Temer, em 12 de julho, é notória tentativa de legitimar o impeachment a partir do “descalabro petista”, causador da crise econômica. Esta, por sua vez, é a justificativa para todas as medidas propostas pelo atual governo que ferem, frontalmente, os direitos constitucionais dos brasileiros.

No trabalho minucioso com o pânico em relação ao desemprego e da superficialidade como são apresentadas as questões relativas à economia – aposta-se no desconhecimento geral da população – as reportagens reforçam, noite após noite, o discurso único do neoliberalismo, ocultando outras alternativas para o país.

Em 3 de maio, na mesma edição em que Temer concedia uma entrevista exclusiva ao jornal, outra reportagem incensava a entrega de um programa dos tucanos ao novo governo (JN, 03.05.3016). As condições – destacava o JN – para a colaboração do PSDB eram o combate “irrestrito à corrupção” e a responsabilidade fiscal. Um jogo de cena descarado, como se eles não estivessem envolvidos no golpe.

Dias depois, Henrique Meirelles vinha à público anunciar os objetivos do governo: “mostrar claramente que as medidas que estão sendo propostas e que serão aprovadas muito provavelmente pelo Congresso”, que essas propostas “vão fazer com que a trajetória da dívida pública seja sustentável”, para que os “efeitos sejam mais rápidos”, de maneira que “o risco possa ter reação bem rápida”, que o “investimento e confiança possam voltar com tempo suficiente para que a economia possa reagir rapidamente”. (JN, 05.05.2016)

Registre-se a pressa anunciada no discurso do ministro, acenando a velocidade do ataque e do desmonte em curso no país. Para tal, os golpistas contam com uma cobertura na área econômica repleta de termos econômicos e nada palatáveis à maioria da população. Ao telespectador resta se fiar nos comentários e expressões dos apresentadores do JN.

Um bom exemplo é a cobertura da alta do dólar, no dia 9 de maio, quando o então presidente da Câmara, Waldir Maranhão, apresentou um recurso contra o impeachment da presidenta Dilma. Em meio à enxurrada de reportagens criticando a atuação do parlamentar, o JN destacou:

“Com o anúncio da decisão do presidente interino da Câmara, o dólar subiu quase 5% e a bolsa caiu 3,5%. Depois que o Senado decidiu continuar com o processo de impeachment, a tensão diminuiu. Mas a bolsa terminou o dia queda. E o dólar mais caro, a R$ 3,52” (JN, 09.05.2016).

A “salvação nacional”

O mote da “salvação nacional contra a crise econômica”, bradado por Temer em sua posse, no dia 12 de maio (JN, 12.05.2016), vem sendo trabalhado diariamente. O convencimento de que é preciso reduzir os programas sociais também. Abaixo, a forma como Carlos Aberto Sardenberg explica os gastos públicos do governo e a crise econômica:

“A história começa quando o governo resolve acelerar seus gastos. Gastos no quê? Pessoal, salário, previdência, aposentadoria, programas sociais, obras todo o funcionamento da máquina; enfim, tudo que faz o governo funcionar. Agora, gastar é bom mas quando você tem o dinheiro” (JN, 12.05.2016).

Em suma: sem dinheiro não há direitos. O brasileiro passa, então, a ser convidado a participar do combate à crise. Como? Por meio do sacrifício e da fé, muita fé, na equipe econômica do novo governo.

Com uma naturalidade aterradora, Henrique Meirelles apresenta no dia seguinte à posse, as suas propostas para o país. Estamos falando não apenas da retomada da CPMF, sempre criticada quando os proponentes eram os governos petistas, mas de idade mínima de aposentadoria, reforma trabalhista, teto para gastos públicos, revisão das desonerações e dos incentivos para setores da economia.

Espertamente, no final da reportagem, o uso do desemprego para engajar o apoio popular: “Para se criar emprego, é necessário que a economia esteja crescendo”, para tal é preciso “que se estabeleça a confiabilidade das contas públicas e a confiança de que o Estado brasileiro, o governo brasileiro estará solvente no futuro. A partir daí, volta o investimento e a partir daí, em consequência o aumento do emprego”. (JN, 13.05.2016).

Da mesma forma, como necessário ao combate à crise, vem sendo divulgado o teto para o aumento do gasto público, apesar dele incluir mudanças na Constituição afetando, inclusive, repasses nas áreas da Saúde e Educação. Reportagem do JN sobre a questão, construída sobre as aspas de Temer e Meirelles, turbina: “em 10 anos, as despesas públicas aumentaram 70% acima da inflação” (JN, 24.05.2016).

O pavor do desemprego

Não é preciso ser especialista para saber que “gasto público” ou “rombo nas contas” são apresentados como um descalabro dos governos petistas e vilões a serem combatidos. No quadro forjado, a via do ajuste fiscal (e das propostas neoliberais) surge como única saída para a retomada do crescimento e da geração de empregos.

Observe a enxurrada de reportagens sobre o desemprego:

Em maio: “Classe média encolheu em 2015, diz pesquisa” (JN, 16.05.2016), apontando a queda do padrão de vida de 1 milhão de famílias brasileiras. “IBGE: Desemprego aumenta em todas as regiões no primeiro trimestre” (JN, 19.05.2016) e “Construção civil sente efeitos da crise e fecha vagas de emprego” (JN, 19.05.2016), com direito à defesa de mudanças nas regras trabalhistas. “Queda no emprego faz aumentar o trabalho por conta própria” (JN, 21.05.2016).

No começo de junho: “Desemprego chega a 11,4 milhões de pessoas no país e é recorde, diz IBGE”. (JN, 31.05.2016). No dia seguinte “Produção da indústria tem cenário similar ao de 13 anos atrás”, apontando que o nível de desemprego voltou dez anos (JN, 01.06.2016).

No final do mês, o tom sobe: “Crise econômica faz disparar número de idosos com nome sujo (JN, 28.06.2016)”. “De março a maio, desemprego no país permanece em nível recorde” (JN, 29.06.2016) incensando que, em um ano, mais 3,3 milhões procuraram e não encontraram trabalho” e que “desempregados buscam sobrevivência em abrigos e refeições a R$1”.

No mesmo dia, em “Trabalho por conta própria registra queda, diz IBGE” (JN, 29.06.2016), a comparação impactante: “imagine a população da cidade de São Paulo inteira na fila do desemprego. Pois essa é praticamente a quantidade de gente sem trabalho no país: 11, 4 milhões, segundo o IBGE”.

No geral, essas reportagens exploram dramas individuais e contam o comentário de um especialista favorável à linha editorial do JN – leia-se à flexibilização das leis trabalhistas e mudanças de regras na Previdência, entre outras.

Em 20 de julho com a notícia: “Governo pretende mandar ao Congresso até o fim do ano propostas para leis trabalhistas”, em apenas 1 minuto, o JN apresentou apenas os objetivos do ministro Ronaldo Nogueira (Trabalho):

“Aprimorar a proposta que está no Congresso sobre regulamentação do trabalho terceirizado para combater a informalidade e dar garantias aos trabalhadores; ampliar e tornar permanente o programa de proteção ao emprego, sobre a CLT prestigiar as convenções coletivas permitindo a flexibilização da jornada e dos salários, sem mudar direitos como parcelamentos de férias e 13°” (JN, 20.07.2016).

Ironicamente, a mesma reportagem anunciava o reajuste de até 41,5% no salário dos servidores do Judiciário. Tudo sob a plástica de uma falsa objetividade, com um bonito iconográfico e mediante o ocultamento do contraditório às medidas.

Em outros casos, o JN somente dispara índices econômicos como verdadeiros slogans do caos. Em apenas 16 segundos: “o Brasil fechou 91 mil vagas com carteira assinada” e “desde janeiro o país perdeu mais de meio milhão de empregos formais” (JN, 27.07.2016); ou “Desemprego sobe para 11,3% e bate recorde no trimestre de abril a junho”, “são 11,6 milhões desempregados no país”, “em um ano, mais de 3 milhões” (JN, 29.07.2016).

Naturalização do golpe

Quando do anuncio de Ilan Goldfajn na presidência do Banco Central, o JN reforçava a fala de Meirelles sobre o controle de gastos e uso do dinheiro público, criando a contraposição entre eficiência (Temer) e gasto irresponsável (Dilma):

“O governo Dilma reconheceu que esse rombo seria de R$ 96 bilhões. Mas, no Congresso, já se fala em R$ 140 bilhões. Meirelles disse que ainda não decidiu se haverá aumento de impostos”, afirmava a reportagem.

Note como o aumento de impostos é inserido no discurso. Segue a menção ao desemprego com a crítica implícita ao retorno da presidenta: “com a economia em contração como está no momento, e se isso continuasse, o que obviamente não é o caso, o desemprego poderia chegar a 14% ao ano”.

Na sequência, a solução: “Para um controle mais eficiente da inflação, Meirelles disse que o governo vai enviar ao Congresso uma proposta para dar autonomia ao Banco Central na execução da política monetária, mas não garantiu a independência do Banco Central com a fixação de mandatos para os diretores. O ministro da Fazenda voltou a defender a reforma da Previdência. ”

Dois temas cruciais – a independência do Banco Central e a reforma da Previdência – são postos como fato dado, quase óbvios no discurso do jornal. Em outra reportagem, chama-se um especialista para reforçar a tese de que “para conter a inflação, uma das armas do Banco Central é subir a taxa de juros”. Detalhe: “a previsão é que a inflação termine 2016 mais uma vez acima do teto da meta” (JN, 17.05.2016).

Rombo

O tema do “rombo” nas contas públicas também foi bastante turbinado: Rombo nas contas públicas para 2016 deve chegar a R$ 200 bilhões (JN, 19.05.2016); Rombo nas contas da União deve ser de R$ 170 bilhões em 2016 (JN, 20.05.2016) – salpicadas pelas medidas anunciadas pelo Governo para recuperar a economia (JN, 21.06.2016).

Apenas às vésperas da votação da meta fiscal, surgem algumas vozes dissonantes: a de Amir Khair destacando a necessidade de que “os R$ 50 bilhões de juros todo mês também tenham limite, coisa que não está na proposta do governo”. E da CUT denunciando que os trabalhadores é que vão pagar as medidas do governo (JN, 24/05/2016).

Aprovado “rombo recorde nas contas públicas”, aparece a crítica do senador Humberto Costa (PT) apontando que o governo superestimou o rombo para aumentar os gastos: “Foi uma grande jogada política e contábil, mas que eu acho que ao longo do tempo vai se desmascarar” (JN, 25.05.2016).

Várias medidas são anunciadas como processos naturais. Em “Moreira Franco que acelerar concessões para atrair investimentos”, cujas prioridades são aeroportos, rodovias e Ferrovia Norte Sul, o teleprompter da Globo destaca apenas a versão do ministro: “só há um caminho: passar para o setor privado serviços que hoje estão em poder do setor público”; “o país projeta para este ano 14 milhões de desempregados, então, nós temos que acelerar o processo” (JN, 17.06.2016).

Em meio a esse caos construído e atribuído ao governo anterior, é possível avaliar o impacto de reportagens como “Perícia conclui que Dilma não participou de pedaladas fiscais”, com o adendo, afinal é a Globo: “decretos suplementares foram resultado de ação direta dela”, conforme afirmam técnicos (JN, 27.06.2016).

De olho no Decorativo

Além de naturalizar o golpe e agenda neoliberal, o JN vem sendo um potente pombo-correio a serviço dos interesses do mercado. São notórios os “puxões de orelha” dados no governo, em horário nobre

Em 1° de julho, um afago na divulgação da pesquisa Ibope. Com boa dose de camaradagem a pesquisa foi intitulada “Governo Temer é aprovado por 13% e reprovado por 39%, diz Ibope”, sendo que a maioria avaliava o governo como regular, ruim ou péssimo; 53% desaprovavam a maneira de governar de Temer; 25% consideravam sua gestão pior do que a da presidenta Dilma e 44% igual. (JN, 01.07.2016).

Uma semana depois, a bronca: “Na contramão do discurso, o governo elevou os gastos: aprovou o reajuste de servidores do Judiciário e do Ministério Público, fez um acordo para aliviar a dívida dos estados, e deu reajuste para benefícios do Bolsa Família acima do proposto por Dilma Rousseff. Tudo somado: R$ 127 bilhões até 2018.” (JN, 07.07.2016, ver de 0,55”a 1”33”)

Dez dias depois, o ilibado Fundo Monetário Internacional (FMI) acenava, alterando a avaliação a respeito da contração da economia brasileira: ao invés dos 3,8% (previstos em abril), a contração seria de 3,3%. O JN incensava:

“A contração da economia em 2016 vai ser menor do que se esperava”, “pela primeira vez em quatro anos estimativas melhoram” e justificava a mudança: “os economistas do FMI dizem que aumentou a confiança dos investidores no mercado brasileiro” (JN, 19.07.2016).

O Governo Meirelles

Em 24 horas, a conta. Ao cobrir a manutenção da taxa de juros a 14,25% pelo Copom, o recado do mercado ao governo no JN:

“Pela manhã, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, chegou a afirmar que o presidente em exercício, Michel Temer, via com bons olhos uma queda nos juros. Investidores se assustaram com o que poderia ser um sinal de interferência política nas decisões do Banco Central. Por isso, antes do anúncio do Copom, Michel Temer declarou numa rede social que o Banco Central tem plena autonomia para definir a taxa de juros – e que o combate à inflação é objetivo central do governo. ” (JN, 20.07.2016).

Obediente, o governo reiterava uma semana depois: “O Copom reafirma a preocupação com o aumento do preço dos alimentos e reforça a necessidade de uma reforma fiscal. Na interpretação de economistas o texto indica que o Banco Central não pretende baixar os juros tão cedo (JN, 26.07.2016).

Aos que ainda duvidam sobre o poder do mercado e das elites financeiras no país, a última pérola:

“A gente começa com uma notícia boa para a Petrobras, uma raridade nos últimos anos. A Justiça dos Estados Unidos aceitou um recurso da empresa e suspendeu por tempo indeterminado todas as ações contra ela nos tribunais americanos. Os processos são movidos por acionistas que alegam ter sofrido prejuízos por causa da corrupção revelada na Operação Lava Jato, só uma das ações prevê o ressarcimento de U$S 10 bilhões” (JN, 02.08.2016).

Imagine a rapinagem em jogo para compensar a suspensão dessas ações.

O que está em curso é o pleno obscurantismo que transita, livremente, nos largos vãos deixados pela ausência de uma democracia jamais efetivada no setor da Comunicação.

Isso sim é descalabro.

marcio gaúcho

O sistema capitalista está em seus derradeiros momentos de exaustão. Como reinventar o capitalismo? Bela questão sem respostas. O que se vê é que o capitalismo e o capital gerado pelo sistema está altamente concentrado nas mãos de poucos. De um lado os banqueiros, que foram os maiores beneficiários e do outro lado as grandes corporações transnacionais de indústria, comércio e serviços. Porém, diante do que estamos vendo esse sistema está fazendo água, pois o consumo está caindo em virtude da diminuição do poder de compra dos mortais consumidores e inadimplência financeira se agravando desses mesmos, Então, indústria, comércio e serviços perdem fôlego e negócios e podem ir à bancarrota. Também, de roldão, o sistema financeiro que financia tudo e a todos. Mantido o sistema capitalista nos termos em que e encontra, é quebradeira e extinção a médio prazo. E os banqueiros não terão o seu dinheiro de volta. Assim, depende do sistema financeiro achar uma saída, senão todos quebraremos.

FrancoAtirador

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MONARQUIA ABSOLUTISTA DO CAPITAL

Quem Ganhou foi os 100 Mega-Bilionários,
Donos do Capital e do Patrimônio Mundial,
que Não Contentes em Serem os Credores
dos US$ 70 Trilhões – Equivalentes ao PIB –
ainda os multiplicaram virtualmente por 10.

Quem Perdeu foi a Democracia e o Direito,
e o Estado de Bem Estar e a Justiça Social.
Perderam, portanto, o 3 Bilhões de Pobres.
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    José Fernandes

    Estamos vivendo em um sono que só vamos acordar daqui há algum tempo, quem vai nôs acordar não sei.,mas precisarmos acordar,ou perderemos …o limiar da iluminação

    FrancoAtirador

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    Prezado José Fernandes.

    A Maior Parte dos Seres Humanos foi Forçada a Abandonar os Campos
    e está Sobrevivendo Precariamente em Confinamento nas Megalópolis.

    E a Propriedade Privada, Cada Vez Mais Concentrada em Poder de Poucos,
    transformou-se em um Latifúndio Multiplicador de Capital Improdutivo.

    E não há Revolta Coletiva, apenas uma Súplica Inaudível aos Governos.
    A Humanidade entra em Colapso Civilizatório, Degradante e Irreversível.
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    “This Is The End,
    My Only Friend”
    “Game Over”
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    https://youtu.be/JSUIQgEVDM4
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Bacellar

O que rende mais para o capital grosso transnacional? O grande MERCADO GLOBAL DE MASSAS.

Claro que os mercados regionais e de luxo tem também enorme vulto, mas a base do sistema hiper-capitalista contemporâneo é o mercado global de massa. Nele está o volume pesado. Nele está o sistema base de extração e produção. Nele está o grande consumo.

Para atacar esse mercado os cartéis corporativos em conjunto desenvolveram ao longo do Século XX (e aprofundaram no XXI com a revolução das comunicações – em pleno andamento), algo que podemos chamar de IDEOLOGIA DE MERCADO.

Trata-se de através de um incontável número de técnicas de convencimento e doutrinação psicossocial, com o uso constante de falsos silogismos, do ataque direto aos sistemas educacionais (do prézinho ao pós-doc) desarmando as populações intelectualmente, e com o uso massivo da indústria midiática (em seus 3 principais elementos: Jornalismo, entretenimento e publicidade) convencer, catequizar,
as massas de preceitos e valores que façam delas os contingentes de trabalhadores-consumidores ideais para o sistema corporativo.

De início esmaga-se qualquer tipo de “ruído de pensamento”, qualquer ideologia ou proposta que questione de maneira contundente a organização corporativa transnacional. Os mais perigosos evidentemente são os mais combatidos; socialismo e comunismo. Depois vem os secundários em termos de risco ao sistema; desenvolvimentismo e anarquismo. Além é claro dos espantalhos que são as teocracias.

Estabelecidos os antagonistas ideológicos vem o pensamento de mercado propriamente dito.

Logicamente pelos fatores expostos a qualidade dos produtos oferecidos no mercado de massa é baixa, quando não um risco a saúde física e mental, a qualidade de vida péssima e a divisão de trabalho brutal. Assim o sistema corporativo tem diante de si a difícil missão de convencer às populações que o ruim é bom, o que sem dúvida é tarefa árdua. Também é claro que inerentemente tal ideologia precisa ser “sofística” (e jamais sofisticada, isso fica para o nicho acadêmico conservador, que de forma sem paralelos na História Humana desenvolveu a arte da baboseira complexa/ininteligível).

O caminho de dominação ideológica é o da individualização, da atomização e da formação de grupos isolados dificultando o esforço coletivo. Escrevo aqui de maneira geral mas trata-se de algo extremamente intrincado e complexo.

Para o indivíduo estabelece-se um sistema de valores e metas. Todo o cerne da ideologia de mercado está nisso; valores e metas. O valor máximo, por paradoxal que pareça, é o trabalho. Porém não se tratam das definições clássicas de trabalho mas sim das definições corporativas de MERCADO DE TRABALHO. Assim o máximo valor para o indivíduo cooptado é a inserção no mercado de trabalho. E como o mercado corporativo funciona? Hierarquização, separação da cadeia produtiva, especialização, hiper-competitividade e lealdade absoluta aos ditames da empresa. Assim nada é mais importante do que possuir um grande cargo numa grande empresa ou conviver com quem possuí. Valores éticos não entram dentro dessa estrutura pois o que se faz dentro de uma corporação fica dentro da corporação. Da saúde da corporação vem a saúde do mercado e da saúde do mercado depende o bem-estar social, assim por questão de ordem um atropelo direto do bem-estar social justifica-se plenamente quando se pensa que tal atropelo é fundamental para o bom funcionamento da empresa.

O indivíduo vive pelo indivíduo ou seu grupo mais próximo. A família, dentro desse sistema de pensamento, é a única extensão externa profunda do indivíduo, é por quem se trabalha e por quem se compete. As relações sociais mais próximas também funcionam nessa lógica. O indivíduo é sobretudo um ser que trabalha por si próprio com o apoio e para sua família e está inserido num determinado grupo fechado de relações pessoais e afinidades que o categorizam de forma generalizante (perdoem, baixou o sociólogo aqui). Espiritualmente ele é livre para ser tanto completamente indiferente e “cientificista” quanto contar com a ajuda de “Deus” para sua batalha diária. O fundamental apenas é que não se coloque espiritualmente contra os sistemas produtivos, financeiros e mercantis corporativos.

Estabelecidos os valores e os antagonismos parte-se para as metas. Basicamente é a cenoura do burro, o céu judaico-cristão-muçulmano ou mesmo o novo homem socialista. Trata-se do sonho futuro que ampara a realidade de merda (ops) do presente. Evidentemente que tal sistema apenas funciona de forma escalonada, em níveis e estratos, portanto claro que um número grande de pessoas realmente vivem num estado de conforto material, mas lembrem-se estou falando aqui da grande massa e do grande mercado de massa global. Se há algo óbvio nesse mundo é que a esmagadora maioria das pessoas vive mal; material e psicologicamente. Quem negar tal fato é um hipócrita ou um tapado. Creio termos um consenso aqui ao menos nisso.

Qual é a meta do cabeça-de-mercado? A meta é a inserção perfeita no mercado de trabalho e, intimamente principalmente, o acesso ao consumo e estilo de vida daqueles que ocupam tais postos. Curioso não? A ideologia do mercado prega como meta que o indivíduo deixe o mercado de massa e insira-se no mercado de nicho/luxo. Vive-se por algo que se pretende deixar.

Aqui está o pulo do gato: O trabalhador-consumidor sabe que vive mal mas também sabe que poucos vivem bem. Assim acredita que inserindo-se no sistema se abrirá a oportunidade para que, através da inserção profunda e perfeita no mercado de trabalho, odiando e combatendo os antagonistas, submetendo-se a hierarquia, trocando a ética social pela ética corporativa, competindo duramente por si e seus próximos, deixe no futuro o mercado de massas do qual faz parte, sustenta e perpetua. Considerar o opressor injusto seria invalidar a própria possibilidade de ascensão futura (completamente hipotética), assim a injustiça que se sofre no presente na própria pele se justifica por uma possibilidade hetéria de ascensão que demonstraria a justiça do sistema.

Parece o plano perfeito mas pensem num pequeno detalhe; a vida prática material, social, cotidiana. Pensem num Mundo, tirando os excluídos totais do mercado e os poucos que possuem acesso ao excedente gerado, em que tal ideologia sofística impere (Lembrem-se que as pessoas não são idiotas e mesmo entre os defensores da ideologia de mercado muitos percebem as contradições e falácias e tornam-se “entusiastas” cínicos e anti-éticos – quantos desses tipos temos na imprensa nacional – em busca de vantagens pessoais e vivendo o desprazer de saberem-se hipócritas e mentirosos). Pensem num mundo de 5 ou 6 bilhões de egoístas e individualistas obedientes a uma falsa ideologia a serviço da mais simples função do capital autômato…5 ou 6 bilhões de idiotizados vivendo mal, trabalhando mal e consumindo mal.

Realmente há alguém insensato o bastante para acreditar que existe futuro nisto?

lulipe

Será que ela trocaria o capitalista Canadá por Cuba ou China? Hipocrisia, me dá uma pra viver!

    Bonobo de Oliveira, Severino

    O simples fato de Cuba, com uma fração da disponibilidade de recursos que tem o Canada, o que não tem nada a ver com a China, tem capacidade de manter indicadores de excelência nos serviços prestados a população daquele país, qualquer um cidadão parcialmente informado deveria refletir um pouco antes de expelir essa SOPA que vc vem aqui despejar, repetindo o mantra entoado em jogral pelo sistema oligopolizado de comunicações.

Bacellar

Venho dizendo há algum tempo: Vivemos num sistema autômato que responde a uma função simples: D-M-D´. Onde “M” pode ser inclusive um pacote de papéis com ligações apenas remotas com o mundo material. E somente a ela.
Não existe CEO, tecnocrata ou proprietário de grande fortuna capaz de, sendo um humano digno e consciente da realidade social e risco ao futuro da humanidade que vivemos (vamos aceitar como hipótese, ok?) corrigir os padrões de governança corporativa do grupo econômico no qual está inserido. Esse indivíduo seria isolado ou “convencido” a mudar de postura pela própria mecânica do sistema.
O capital transnacional livre e sua concentração cartelizada confrontado com a hiper-competitividade inter-corporativa responde sempre com a otimização dos processos produtivos sem quaisquer tipos de pudor em relação às questões de longo prazo. Assim a alienação do trabalho, o massacre dos recursos humanos, a destruição ambiental, a desregulação econômica e a destruição do estado nacional de bem estar social são contingências inevitáveis para manter a expansão e competitividade corporativa. Compreendem?
Pequenas iniciativas de marketing positivo fazem parte desse sistema: A Cocacola, exemplo, libera uns tostões para uma ong ambiental outra ali, enquanto barbariza em escala global em cada um dos aspectos que envolvem a produção, distribuição, comercialização e gestão financeira de capital; explora consumo, ambiente, trabalho e mercado. Causa danos incalculáveis. E falamos aqui de um simples refrigerante. Pensem na Colt, na Exxon ou no JP Morgan Chase…

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