Marcia Mendes de Almeida: A melancolia de Mino Carta; “vivi de ilusões”, diz autor

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por Marcia Mendes de Almeida

A vida de Mat — um romance-reminiscências de Mino Carta — tem o dom da brevidade e a atmosfera em que tudo parece muito antigo.

Carece apreciar a melancolia de Mino, suas confissões e, aqui e ali, perorações (por vezes solenes) sobre arte, o absurdo da vida, a velhice, o prazer total (o orgasmo).

Tudo entremeado com um célere roteiro da infância — luminosa — e uma adolescência gentil e sem traumas, em meio à segunda-guerra na Itália.

Entender Mat é tomar partido e estar afeito a um passado bom, justo e refinado, mas italiano e na linda Riviera.

Mat ganha a sorte grande dedicando-se ao que sabe e gosta de fazer, à pintura.

Sua veneração pelas mulheres, a começar pela avó, é mais e mais delicada. Aos onze anos extasia-se com a primeira conquista (Assunta).

Seguem-se outras mulheres, só as belas e audazes.

As imagens fetichistas são os faróis de um erotismo sofisticado: as meias de seda e de risca, as peles, o indicativo bater dos cílios, o latejar das sobrancelhas, os olhos semicerrados, a “selva miúda” a cobrir o púbis.

Engraçado é que, talvez pelo reverencial temor da avó, Mat denomina morbidez o que é lascívia.

Em tema algum Mino Carta ultrapassa seu corriqueiro aplomb, faz falta sair um pouco do sério.

Quando Mat decide-se pela aziaga aventura de viver no Brasil, em plena ditadura, é uma circunvolução trágica.

A opção pela irrealidade fantástica tem seu lugar, por exemplo, nos interrogatórios – que Mat suporta com calma – por epítomes disfarçados desse “bando de corja” que só se reproduz entre brasileiros.

Um é o chefe de um serviço secreto, major Silvan.

Outra é sua colega Alda Spresimen, uma “torturadora intelectual” (isso mesmo).

Pois bem, morrem os dois bem-amadíssimos de Mat: Nuvem – a mulher – e Frau, o filho.

Num triste e bonito epílogo, Mino Carta desenha um Mat já bem mais velho e amargurado, mas com pleno domínio de seu livre arbítrio de morrer docemente.




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Morvan

Bom dia.

Uma pessoa cônscia, da magnitude de um Mino, não pode [ou não deve] ceder à autoindulgência, não pode ficar divagando sobre estas vicissitudes da vida. Não é uma questão de desejar a vida assim ou assado. A vida o é, não como a queremos, nem como não não a; é-o.
A propósito, estava a discutir, com um amigo, a mesa do restaurante, há anos, fingindo almoçar e tomando uma vodka, gosto comum a ambos.
Uma certa altura, Gingel, inglês de nascimento, brasileiro naturalizado, me disse, com certo ar de estupefação e de tristeza, mesmo contida:
— “Morvan, estou aqui faz vinte e sete anos e confesso nunca conseguir entender o Brasil“.
No que lhe respondi, incontinenti:
— “Meu amigo Jared Gingel, esta é a minha idade; eu também nunca entendi meu país“.
Gingel já faleceu, diz-se de acidente, e eu, quase um sexy, sexy à Genário, continuo sem entender p. r. n. Mas não esqueça:
— “…A vida o é, não como a queremos, nem como não não a; é-o.“.
Sem autocomplacência e sem elegia desmedida, por favor.

FrancoAtirador

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Bóiam Leves Desatentos
Meus Pensamentos De Mágoas
Como no Sono dos Ventos
As Algas Cabelos Lentos
Do Corpo das Águas

Bóiam como Folhas Mortas
À Tona de Águas Paradas
São Coisas Vestindo Nadas
Pós Remoinhando nas Portas
Das Casas Abandonadas

Sonho de Ser Sem Remédio
Vestígio do que Não Foi
Leve Mágoa, Breve Tédio
Não sei se Pára ou se Flui
Não sei se Sou ou se Dói

04/08/930
FERNANDO PESSOA
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http://www.avozdapoesia.com.br/obras_ler.php?obra_id=12050
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FrancoAtirador

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Operação ConDôr: O Retorno

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