José Carlos Moreira: Por que é vital uma entidade de juristas em defesa intransigente do Estado Democrático de Direito

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Consenso da reunião do Coletivo Nacional da Frente Brasil de Juristas pela Democracia, realizada em 12 de maio, em SP: Evoluir para a construção de uma Associação de Juristas pela Democracia

RESISTINDO NO PRESENTE, PENSANDO NO FUTURO

por José Carlos Moreira da Silva Filho*

Na véspera dos 129 anos da abolição da escravatura no Brasil, justamente na Rua da Abolição, no Sindicato dos Advogados de São Paulo, teve lugar a reunião do Coletivo Nacional da Frente Brasil de Juristas pela Democracia (FBJD), com representantes de todo o Brasil entre membros da advocacia, do Ministério Público, da magistratura, da advocacia pública e da academia.

A Frente conduziu diversas iniciativas de vulto para denunciar a ilegalidade do processo de golpe de Estado que depôs a Presidenta Dilma Roussef, dentre as quais obtiveram notória repercussão o ato de juristas em defesa da legalidade, ocorrido no Palácio do Planalto em março de 2016, o lançamento do livro “A Resistência ao Golpe de 2016” em diversas capitais ao longo do ano de 2016 e o Tribunal Internacional pela Democracia no Brasil em julho de 2016 no Teatro Casagrande no Rio de Janeiro.

A reunião ocorrida em 12 de maio teve por objetivo debater os temas necessários a uma atuação mais permanente e propositiva da FBJD.

Como ficou cediço na análise de conjuntura feita no período da manhã pelo ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão e sedimentada à tarde pela advogada Valeska Zanin, que defende o ex-Presidente Lula nos processos da Operação Lava-Jato, as violações explícitas aos direitos e garantias e ao devido processo legal, especialmente no âmbito da Operação Lava-Jato, constituem um sério e complexo desafio para os juristas comprometidos com a legalidade democrática.

Diante da opacidade do sistema de justiça brasileiro e do viés parcial e manipulador dos canais da mídia hegemônica, a população brasileira não possui bases e elementos para realizar uma necessária leitura crítica a respeito da atuação das juízas e juízes do país.

A utilização correta, democrática e técnica do direito cede espaço a uma crescente banalização e vulgarização do campo jurídico, franqueando mais uma vez a já tradicional tentação autoritária das nossas instituições e doutrinadores jurídicos.

Com uma narrativa de criminalização geral da política, amplificada pela mídia e adotada por servidores vinculados às principais carreiras de Estado, como a magistratura, o Ministério Público e a Advocacia Geral da União, abre-se um perigoso espaço à hegemonia de operadores vinculados a esses setores para substituírem a atividade política, sem que persistam nesses últimos qualquer rastro de legitimidade popular e comprometimento com as causas emancipatórias e democráticas.

Em um cenário de flagrante desconstitucionalização, ataques parlamentares e desrespeito ao texto de 1988 por parte da própria Corte gerada para protegê-lo, foi consenso na reunião a necessidade de fortalecimento de uma entidade nacional de juristas comprometida com o valor democrático e a construção de um país mais justo, solidário e igualitário.

Das entidades de juristas hoje existentes não há nenhuma que, ao mesmo tempo, reúna a grande amplitude de profissionais da área do Direito, incluindo-se aí os representantes da academia, e propugne como foco e missão a defesa intransigente dos valores democráticos e do Estado Democrático de Direito.

Por esta razão, o coletivo reunido entendeu que a Frente necessita evoluir para uma formalização, para a construção de uma Associação de Juristas pela Democracia.

Foi consenso que para uma tarefa dessa envergadura é preciso definir e desenvolver estratégias de divulgação, captação e capilarização voltadas ao efetivo envolvimento e ao financiamento dessa futura entidade. Nos próximos encontros do coletivo nacional este será o foco prioritário.

Enquanto não se chega lá, a FBJD continuará promovendo eventos, apoiando e patrocinando ações técnicas no sistema de justiça e no sistema político, e contribuindo para desmistificar, especialmente junto à opinião pública, o manto de legalidade que recai sobre inúmeras ações absolutamente ilegais, autoritárias e violadoras do espírito democrático e dos direitos e garantias assinalados na Constituição de 1988.

Foi também consensual na reunião do dia 12 de maio que uma das tarefas mais urgentes a ser aprofundada pela futura entidade e a ser enfrentada de imediato pela Frente é educativa. Ou seja,  implica na necessária e acessível tradução das intrincadas questões jurídicas que hoje obstruem a atividade política democrática e legítima no país, e contribuindo igualmente para o fortalecimento de uma consciência política democrática e emancipatória.

José Carlos Moreira da Silva Filho é professor da Escola de Direito da PUCRS (Graduação em Direito e Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais — mestrado e doutorado)

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