Iriny Lopes: Depois do caso Banestado, que envolveu R$ 150 bilhões, Youssef ficou livre para continuar sua vida criminal

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19/11/2014 – Copyleft

O Caso Banestado, a Petrobras e o feitiço do tempo

A Lava Jato tem ligação com o Caso Banestado mais do que se possa imaginar. Caso se tivesse ido até as últimas consequências, a situação poderia ser outra.

por Iriny Lopes*, na Carta Maior

“Foi o maior roubo de dinheiro público que eu já vi”. A declaração do deputado federal oposicionista Fernando Francischini, do PSDB, não é sobre a Petrobras, ou o que a mídia convencionou chamar de Mensalão, mas sobre o Escândalo do Banestado (Banco do Estado do Paraná).

O Banestado, por meio de contas CC5, facilitou a evasão de divisas do Brasil para paraísos fiscais, entre 1996 e 2002, na ordem de R$ 150 bilhões.

O caso se transformou em na CPMI do Banestado, em 2003, da qual fui integrante em meu primeiro mandato.

Foi uma longa investigação que resultou no relatório final com pedidos de indiciamento de 91 pessoas pelo envio irregular de dinheiro a paraísos fiscais, dentre eles o ex-presidente do Banco Central do governo FHC, Gustavo Franco, o ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta, Ricardo Sérgio de Oliveira, que foi arrecadador de fundos para campanhas de FHC e José Serra, funcionários do Banestado, doleiros e empresários.

Na época da CPMI, o presidente da comissão, o então senador tucano Antero Paes de Barros, encerrou os trabalhos da CPMI antes que o relatório fosse apresentado.

O motivo principal era poupar seus pares, sobretudo Gustavo Franco e Ricardo Sérgio de Oliveira.

A ação do PSDB para soterrar o relatório tinha como objetivo impedir que a sociedade tomasse conhecimento de um amplo esquema de desvios de recursos públicos, sobretudo vindos das privatizações do período FHC, para contas em paraísos fiscais.

A história que não saiu na mídia está contada no livro “A Privataria Tucana”, de Amaury Ribeiro Jr., lançado em 2011.

O desfecho das investigações levadas adiante pela Polícia Federal e mesmo de parte do Ministério Público Federal morreu na praia. Algumas pessoas, é verdade, foram condenadas, mas só laranjas, gente muito pequena perto do enorme esquema de corrupção.

O enredo do Banestado parece semelhante ao caso Petrobras, mas tem uma diferença: neste momento há uma determinação da presidenta Dilma em não deixar “pedra sobre pedra” sobre o caso da petrolífera, algo que não aconteceu no governo FHC — o Procurador da República na gestão tucana, Geraldo Brindeiro, mesmo sabendo dos malfeitos desde 1998, só decidiu pela abertura de processo quando estava de saída, no apagar das luzes da gestão tucana e pressionado pela abertura de uma CPMI.

A importância de o governo federal demonstrar empenho para que tudo fique esclarecido é determinante para se erradicar um mecanismo perverso de desvios de dinheiro público, de relações entre a iniciativa privada e o universo político e que determina, inclusive o perfil dos eleitos, principalmente no Congresso Nacional.

A Operação Lava Jato tem ligação com o Caso Banestado mais do que se possa imaginar. Se no caso Banestado se tivesse ido até as últimas consequências, provavelmente estaríamos hoje em outro patamar. As condenações necessárias a políticos, grandes empresários e doleiros, teria evitado a dilapidação de recursos públicos em todas as instâncias. A impunidade amplia os limites de corruptos e corruptores.

Basta lembrar do esquema de licitação fraudulenta dos metrôs e trens de São Paulo, que atravessou mais de uma década de governos do PSDB, e a ausência de investigação e punição para entender do que estamos falando.

Os personagens do enredo da Lava Jato remetem, não por acaso, a muitos do Banestado, inclusive Alberto Youssef, que conseguiu não responder pelos crimes de corrupção ativa e de participação em gestão fraudulenta de instituição financeira (Banestado), por acordo, com MPF de delação premiada, em 2004.

Youssef entregou o que quis e continuou sua vida criminal sem ser incomodado até este ano, quando o juiz federal Sérgio Fernando Moro, responsável pelas prisões da Operação Lava Jato – este também outro personagem coincidente com Banestado, resolveu que o doleiro cumpriria quatro anos e quatro meses de cadeia, por uma sentença transitada em julgado.

“Após a quebra do acordo de delação premiada, este Juízo decretou, a pedido do MPF, a prisão preventiva de Alberto Youssef em decisão de 23/05/2014 no processo 2009.7000019131-5 (decisão de 23/05/2014 naqueles autos, cópia no evento 1, auto2)”, diz o despacho de Sergio Moro, datado de 17 de setembro deste ano. (ver mais aqui).

Além de Youssef, do juiz Sérgio Moro, as operações de investigação do Banestado e da Lava Jato tem como lugar comum o Paraná. Apesar do Banestado ter sido privatizado, Youssef e outros encontraram caminhos que drenaram recursos públicos para paraísos fiscais a partir de lá.

Se no caso Banestado foram remetidos R$ 150 bilhões de recursos públicos adquiridos nas privatizações da era FHC para contas fantasmas em paraísos fiscais, na Petrobrás a estimativa da Polícia Federal até o momento é que tenham sido desviados R$ 10 bilhões.

Importante ressaltar que pouco importa os valores. A verdade é que estamos pagando uma conta do passado, em que parte das instituições fez corpo mole e deixou crimes dessa natureza prescreverem. Essa omissão (deliberada ou não) nos trouxe até aqui.

Não por acaso, Alberto Youssef está de novo em cena. Sua punição no caso Banestado foi extinta em 2004 e quando revogada, neste ano, foi apenas para que MPF e Judiciário não passassem recibo de seus erros anteriores. Deram um benefício a alguém que mentiu e continuou sua trajetória criminosa.

Por isso tudo é admirável a disposição da presidenta Dilma, em encarar um esquema que mistura grandes empresários multinacionais, políticos e criminosos de porte. Afinal, que ninguém se iluda: numa dessas pontas tem o narcotráfico, o tráfico internacional de armas e toda ordem de ilícitos que se alimenta e retroalimenta a lavagem de dinheiro.

Dito isso, acho importante destacar o que é fundamental ser feito a partir da Operação Lava Jato:

1 – Apoiar todas as ações que visam investigar, julgar e condenar corruptos e corruptores;

2 – Constatar que as investigações comprovam que o financiamento empresarial das campanhas eleitorais, supostamente baseado em doações de empresas privadas, na verdade está apoiada, ao menos parcialmente, em desvio de recursos públicos;

3 – Que portanto, para além de atos criminosos, estamos diante de um mecanismo sistêmico que corrompe cotidianamente as liberdades democráticas, pois no lugar do voto cidadão o financiamento privado reintroduz de fato o voto censitário;

4 – Que este é mais um motivo para apoiarmos a reforma política, especialmente a proibição de todo e qualquer financiamento empresarial;

5 – Por fim, conclamar os funcionários das empresas corruptoras a virem a público contar o que sabem, para que se possa colaborar com a Justiça. E vigiar para que as instituições envolvidas não se deixem manipular, no processo de investigação e julgamento, pelos mesmos interesses políticos e empresariais que se faz necessário punir.

Todo o Brasil sabe, afinal, que a corrupção institucionalizada esteve presente na história do Brasil, nos períodos democráticos e especialmente nos períodos ditatoriais. O desafio proposto pela presidenta Dilma, de não deixar “pedra sobre pedra” é imenso e depende das instituições cumprirem o seu dever.

O que Dilma quer, o que eu quero e toda a sociedade brasileira deseja é não ver a repetição dessa história e seus velhos personagens livres para reprisar o mesmo roteiro policial. Concordo com a frase do deputado oposicionista Francischini, que o Banestado foi o maior escândalo de corrupção de que se teve notícia no país.
 
Portanto, tenhamos memória e que ela não seja seletiva e nem refém do feitiço do tempo.

(*) Deputada federal (PT/ES)

PS do Viomundo: Essa é uma história contada pela metade. Na CPMI do Banestado, falta entender exatamente o papel do relator José Mentor, do PT, tido como controverso. Ele foi acusado por colegas de tentar proteger Paulo Maluf (aliado do PT em São Paulo) e o então presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Mentor pretendia oferecer anistia aos correntistas que trouxessem seu dinheiro de volta do Exterior. Propôs o indiciamento de 91 pessoas, dentre elas o ex-presidente do BC, Gustavo Franco, o ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta e o empresário Samuel Klein, dono das Casas Bahia. O presidente da CPMI, Antero Paes de Barros, do PSDB, aproveitou-se da controvérsia para encerrar a comissão sem votar o relatório final. Nos bastidores fala-se num acertão, até agora impossível de provar. Mas num olhar retrospectivo fica claro que os governos do PT optaram sempre por contemporizar com a corrupção alheia (por exemplo, no caso da Privataria). O partido herdou operadores e escândalos da era FHC — dentre os quais Marcos Valério, a máfia dos sanguessugas e dos vampiros — mas nunca partiu para uma devassa completa, inequívoca, quando dispunha de poder para isso. Pelo contrário, absorveu por osmose o jeito tucano de ser.

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Comentários

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Urbano

O que os bandidos da oposição ao Brasil continuam querendo realmente é banir o Estado, e para sempre…

Isabela

O P.S do Viomiundo explicita tudo que pensava enquanto lia o texto, exatamente. E essa foi a minha grande decepção com o PT: não peitar os “esquemões” tão enraizados pelos tucanos no poder. Infelizmente meu voto no segundo turno foi para o menos pior… Se Lula voltar em 2018 terá que ser com uma outra roupagem, no agora ou nunca: enfrentar essa corja com sua velha determinação, caso contrário, morreremos na praia, tristemente…

Romanelli

Salve a sabedora popular !!!!

e alguém ainda duvidava ?
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O movimento era direcionado ! ..foi patrocinado por coxinhas ! ..não vem do povo, vem da elite ! ..estas e outras BESTEIRAS foram usadas pra quem tentou desqualificar, à distancia, o movimento que começou em meados de 2013 e tomou as ruas do país. Movimento que, recorde-se, era contra TUDO e todos os políticos.
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Educação, saúde e INFRA padrão FIFA exigiam as massas !! ..ao qual a presidanta respondeu com a promessa duma reforma política (como, que tem, locô ??!! – como diria o personagem de Jô Soarez)
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..os Estádios foram superfaturados, estão enganando o POVO ao não entregarem todas as obras do entorno como VLT, Metro, VRT, aeroportos etc, gritava a turba enfurecida.
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Verdade é que em minoria outros denunciaram o óbvio: que havia também algo de misterioso ao não se entregar em tempo e no ORÇAMENTO obras importantes como as hidrelétricas, a transposição, estradas, portos, a ferrovia norte sul, a leste oeste, a trans nordestina e tantas estradas pelo país.

LOUCOS !! GOLPISTAS !! Direitistas !! Estão querendo o retrocesso !! exclamavam alguns INOCENTES ÚTEIS que ainda confiantes – nos seus líderes, ou na impunidade – acreditavam que tanta INCOMPETÊNCIA era “acidente de percurso”
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Pra se ter uma ideia, até hoje ninguém explicou aonde foram parar os US$ 70 bi amealhados com a maior capitalização da história tida com a emissão da Petrobrás..
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..claro, com certeza boa parte, sem contar o ENDIVIDAMENTO com 3os da empresa que explodiu, foi pro Comperj que saltou de 8 pra US$ 48 bi, ou pra Abreu e Lima que foi de 2 pra US$ 20 bilhões, as refinarias do CE e MA que gastaram, pra nada, outro US$ bi, Pasadena com seus US$ 1 e pouco, com as aquisições da Argentina, as doações pra Bolívia, pra CUBA, ou mesmo com Yokoyama e com os poços na AFRICA, com a superdimensionada SETE BRASIL, vai saber ?!
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..mas hoje, o que importa mesmo, é que o país, os que tinham certeza que tinha alguma coisa de errado acontecendo, hoje tiveram certeza do que suspeitavam, pois só a Camargo Correia e a Andrade Gutierrez já se prontificaram a devolver em MULTAS R$ 2 biljões recebidos indevidamente pelo servicinho ..sim, sim, parece que isso é o começo, de uma série, espero (*)
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e o POVO ?! que em 2013 saiu espontaneamente às ruas ..bem, a este sobra o atestado de que de BOBO ele não tem nada
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Agora, some a isso, por exemplo, os US$ 150 bi dum Banestado, ou os bilhões perdidos com as privatarias concedidas a precinho e condições de pai pra filho, e imagine você como muitos dos nossos passivos poderiam estar muito bem encaminhados e resolvidos EM UMA GERAÇÃO apenas se, se “nossos” líderes tivessem prezado pelo zelo e pela ética no trato da coisa pública ?!
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http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/11/1711882-andrade-gutierrez-acerta-multa-de-r-1-bi-e-vai-confessar-suborno-em-obras-da-copa.shtml
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https://www.youtube.com/watch?v=5KVFj-Ac98s

FrancoAtirador

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Plutocratas Corruptos melaram a CPI do HSBC
criada para investigar Contas Secretas na Suíça
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A CPI não conseguiu receber das autoridades
a lista oficial dos clientes que teriam se beneficiado
das vantagens ofertadas pelo HSBC
para a abertura de contas irregulares.
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A Câmara dos Deputados já aprovou — e está em análise na CCJ do Senado —
PLC 186/2015 que cria o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária
[equivalente ao REFIS, só que para Criminosos com Contas Secretas no Exterior].
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Pela proposta, quem enviou para o exterior dinheiro ou bens
obtidos de forma lícita pode trazer os recursos de volta ao Brasil.
Nesses casos será cobrado o Imposto de Renda, com alíquota de 15%,
mais multa do mesmo percentual.
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(http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2015/11/27/apresentacao-do-relatorio-final-da-cpi-do-hsbc-pode-ser-antecipada)
.
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JoãoP

Senhor Iriny Lopes, seja menos parcial, assim não toma um “PS” como o do Viomundo. Parabéns ao Viomundo por abrir espaço para o texto, no geral muito bom, mas não engoiu as presepadas do PT naquela CPMI.

O JUIZ

É o que todos gostaríamos de saber.
Afinal, o Juiz era o mesmo.
FHC era Presidente.
Na mesma época, FHC detonou o Banestado e o Bamerindus.
FHC está solto até hoje, depois de ter quebrado o Brasil por três vezes.
Não é de se admirar que o bandidão Yousseff se saiu bem na primeira vez.
Agora, já li matérias que falam de uma possível saída do doleiro para os USA depois que o processo acabar.
Pode ser ilação, mas neste País e com o moro à frente, tudo é possível.
O cara vai ficar “preso” nas praias de Miami.

JURIDICO

Quem eram os promotores do BANESTADO.. O JAPONES BONZINHO NÃO TEM ACESSO AOS DOCUMENTOS VAZADOS.

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