Alexandra Mello: Já percebeu que nossas vidas estão virando mercadoria no Facebook?

Tempo de leitura: 3 min

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Precisamos falar sobre Facebook

por Alexandra Mello, especial para o Viomundo

Que Mark Zuckerberg, um dos fundadores do Facebook é um gênio, ninguém duvida.

Com amigos da Universidade, o cara criou um universo inteiro que, rapidamente, tornaria dependentes, seus usuários. Acho até que o cigarro, que dizem ser a droga mais difícil de largar, é mais fácil do que o face. Nesse universo sem limites, a palavra amigo tornou-se uma qualquer. Não podiam ao menos ter usado “colega”?

É um mundo fascinante.  Ali, a gente conhece, cutuca, pesquisa, exibe, compartilha, critica, milita, xinga, elogia, dá presentinhos, faz carinhas, vende produtos, compra, dá receitas (de comida e de como viver), vigia, controla, conversa, desabafa, desenterra, lava roupa suja, reencontra pessoas de mil novecentos e bolinha, inveja, sente ciúmes, deseja, finge, insinua, provoca, agride, “ama”…e por aí vai.

As possibilidades são infinitas. Até aí, nada diferente do que acontece nas nossas vidas reais. A diferença é que, antes, pra sabermos alguma coisa do vizinho ao lado, ele tinha que contar ou falar mais alto para escutarmos do lado de cá do muro.

Ou então, o da frente contava. E de ouvido em ouvido, a notícia corria mais lentamente. Outra diferença é que a gente se sente mais corajoso quando está por trás de uma máquina. Sem o olhar do outro.

Já desconfiei até (afinal, algumas drogas nos deixam paranoicos), que minhas conversas privadas pudessem ser usadas pelo site, que me abasteceria depois de informações a respeito dos conteúdos. Por que vejam só: conversei bastante, no privado, com uma amiga (esta, amiga real) sobre algumas questões de filhos. Não é que nos dias seguintes, curiosamente (e espero, coincidentemente), apareceram textos na minha página, alguns até bem interessantes, exatamente sobre aquelas questões?

Outro dia, escutei algo assim: que as pessoas ficam vendo as fotos e os textos e acreditam naquela empulhação. E que acabam comparando as próprias vidas com as expostas naquela vitrine.

Resultado? Começam a achar que as suas estão sem graça, sem glamour. Esquecem que por trás do virtual existe um mundo real com todos os problemas de qualquer outro. Que por trás daquelas pessoas descoladas e cheias de frases de efeito, estão as de carne e osso, com todas as dores e delícias. Vida vira mercadoria. E mercadoria precisa de propaganda. De marketing.

Antes, a gente escrevia uma carta que levava alguns dias para chegar até ele ou ela. Hoje, a gente digita, publica e na mesma hora está lá, na frente do ser amadx. E da metade da torcida do Flamengo.

O que estamos fazendo com a nossa vida privada? Por que razão estamos maltratando tanto a nossa intimidade? Por que precisamos tanto mostrar quem somos, o que comemos, com quem andamos, pra onde vamos, o que sentimos?

Mas de tudo o que mais tem me causado espanto (pra não dizer enjoo) é ver a distância entre discursos tão bem elaborados e atitudes tão imaturas. Nunca antes, adultos estiveram mais infantis que seus filhos.

É gente gritando pela democracia e menosprezando o “amigo” que tem posição diferente. É gente delatando com um só clique coxinhas ou petralhas e mantendo apenas os iguais.

Que democracia é essa só com iguais? Tem graça uma mesa de bar sem diversidade? É gente militando contra todas as opressões, olhando só para fora e não para dentro, que é onde deveria começar uma revolução.

É pai e mãe proibindo o filho de matar em jogos de vídeo game, como se fossem eles os responsáveis pela violência e não o ódio que destilam nas redes sociais, por exemplo. É pai e mãe dizendo para o filho que precisa respeitar o amiguinho e postando no face, o que bem entendem, doa a quem doer.

É gente falando de empatia, sem ter a menor ideia do que isso quer dizer.

Estamos dependentes desta que, como todas as outras drogas, nos traz prazeres imediatos, efêmeros e deliciosos.

Mas que, aos pouquinhos, imperceptivelmente, vai nos arrancando de nós mesmos. Vai arrastando nossas vidas para um lugar público. Mas não é o face o sujeito de tudo isso não. Ele é só uma ferramenta. Que podemos usar de um ou outro jeito.

Na ânsia de mostrarmos e vendermos o nosso melhor, muitas vezes, o que estamos fazendo é justamente o contrário. Pensando bem, será mesmo que é de facebook que precisamos falar?

Alexandra Mello é psicóloga/psicopedagoga

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Comentários

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Lucas

Bom texto! Propõe uma ótima (e necessária) discussão. Apenas no título, ao invés de usar ‘no’ a autora deveria utilizar o ‘do’…

    Alexandra Mello

    Boa. “No”e “do”. Ao vendermos no, entregamos para.

Milton

Tenho Facebook mas parei de usar faz tempo, raramente quando volto pra dar uma olhada eu vejo que foi uma perda de tempo. Twitter eu uso com pseudônimo e mais pra acompanhar mesmo, não sou de ficar tuitando. Essas redes sociais são uma armadilha.

    Alexandra Mello

    Posso provocar Milton? Quando usamos pseudônimo, não estamos fazendo o mesmo?

Luiz Carlos P. Oliveira

Alexandra, não é coincidência. As redes sociais nos vigiam 24 horas por dia. Se voce fizer uma simples consulta, de qualquer coisa, saiba que alguém está vendo. ATÉ no youtube, onde já constatei isso. Por isso nunca tive (e nunca terei) nenhuma rede social. E penso assim desde o MSN. Twitter? Face? Nem pensar.

Hudson

Facebook é apenas uma ferramenta… para a manipulação da sociedade. Não é um espaço para resistência, mas de alienação.

https://amusicadehudsonlacerda.wordpress.com/2015/09/07/como-vendemos-nossas-almas-e-mais-aos-gigantes-da-internet-bruce-schneier/

FrancoAtirador

.
.
CONATUS:
ALEGRIA & TRISTEZA;
PAIXÃO & DESEJO
.
Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,

Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.

Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões para cantar que a vida.

Ah, canta, canta sem razão!
O que em mim sente está pensando.
Derrama no meu coração
A tua incerta voz ondeando!

Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência

Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!

Fernando Pessoa
Athena, Nº 3. Lisboa:
Dezembro/1924

http://arquivopessoa.net/textos/2429
.
“Não é por julgarmos uma coisa boa
que nos esforçamos por ela, que a queremos,
que a apetecemos, que a desejamos,
mas, ao contrário, é por nos esforçarmos por ela,
por querê-la, por apetecê-la, por desejá-la,
que a julgamos boa”.

Ética, Livro 3, Prop 9 esc
Benedito ‘Bento’ de Espinosa (Baruch Spinoza)

https://pt.wikipedia.org/wiki/Conatus
https://pt.wikipedia.org/wiki/Baruch_Espinoza#Os_afetos_-_o_desejo.2C_a_alegria_e_a_tristeza
.
Espinosa defendia que as Emoções são Derivadas
da Alegria, da Tristeza ou dos Apetites (ou Desejos
que podem ser Definidos como Apetites Conscientes).
.
O Neuro-Cientista Português Radicado nos EUA, António Damásio,
Classificou as Emoções em Primárias, Secundárias e Plenas.

O Primeiro Grupo incorpora Emoções que Não Exigem o Conhecimento
do Próprio ‘Eu’ (Ego) nem de Outrem, são Instintivas, Inatas (Medo, Ira).

As Secundárias agrupam Emoções que dependem do Autoconhecimento
e também do Conhecimento do Outro (Ciúme, Inveja, Vergonha*).

E as Emoções Plenas relacionam-se com o que comumente se designa
como ‘Estados de Espírito’ dos quais se destacam o Bem-Estar e o Mal-Estar.

http://www.psicologia.pt/artigos/ver_opiniao.php?codigo=AOP0362
http://www.scielo.br/pdf/epsic/v2n2/a13v02n2.pdf
http://www.fronteiras.com/entrevistas/emocao-ou-sentimento-mental-ou-comportamental-antonio-damasio-explica-a-organizacao-afetiva-humana
.
.

FrancoAtirador

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“NADA SE RESUME
A UMA COISA SÓ”
Fernando Pessoa
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Superpopulação
Hiperpovoamento
Confinamento
Isolamento
Solidão
Frustração
Alienação
Trabalho
Consumismo
Ganância
Vaidade
Ambição
Desejo
Fetiche
Prazer
Egolatria
Megalomania
.
Basicamente São os Elementos
Manipulados pelas Corporações
para ‘Comunidades’ de Consumo
nas Economias de Livre Mercado
visando Prioritariamente Lucro
sob Pretexto de Dar Satisfação
a Determinados Segmentos
Financeiramente Rentáveis.
.
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