Sobre “quadrilhas”, vinagre e armas de destruição em massa

Tempo de leitura: 3 min

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SÃO PAULO

Perícia conclui que artefatos encontrados com manifestantes não são explosivos

Gate e Instituto de Criminalística relatam que objetos supostamente apreendidos com Hideki e Lusvargh não têm capacidade de ferir. ‘É outra prova que demonstra a ilegalidade da prisão’, diz advogado

por Tadeu Breda, da RBA publicado 04/08/2014 18:02, última modificação 05/08/2014 13:49

São Paulo – Perícias realizadas pelo Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da Polícia Militar e pelo Instituto de Criminalística (IC) de São Paulo apontaram que não são explosivos os artefatos supostamente encontrados com os manifestantes Fábio Hideki Harano e Rafael Marques Lusvargh em 23 de junho, quando foram detidos durante protesto na Avenida Paulista, na capital.

Os laudos foram entregues nesta segunda-feira (4) aos advogados de Hideki, que hoje mesmo ajuntaram ao processo os novos indícios e, depois, repassaram as informações à RBA. A PM confirmou que as perícias foram concluídas, mas “não irá divulgar seu conteúdo por não ser a titular do inquérito”. A Secretaria de Segurança Pública não quis se manifestar, sob a alegação de que se trata de um assunto da esfera judicial.

Os policiais civis que participaram da prisão de Hideki e Lusvargh atestam que ambos portavam explosivos. Os ativistas negam, e são respaldados pelo testemunho de manifestantes que acompanharam e filmaram as detenções. Ainda assim, os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público acataram a versão dos policiais e levaram a denúncia à justiça.

Os jovens respondem por associação criminosa, resistência, desobediência, incitação ao crime e porte de explosivos – acusação que agora deve cair por terra com o resultado da perícia. Os dois estão presos há 44 dias: Hideki encontra-se na penitenciária de Tremembé, a 150 quilômetros da capital, e Lusvargh, na carceragem do 8º Distrito Policial, no Brás, centro de São Paulo.

‘Bombas’

Hideki é acusado de trazer na mochila “artefato explosivo”, segundo a denúncia da promotoria, ou “artefato incendiário de fabricação rudimentar”, segundo boletim de ocorrência lavrado pelos agentes do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) no momento da prisão. Um vídeo mostra trechos da abordagem dos policiais a Hideki e da revista feita em seus pertences.

Trajando apenas uma saia escocesa no momento de sua detenção, Lusvargh estaria em posse de uma “garrafa de iogurte com forte odor de gasolina”. A existência do frasco consta no boletim de ocorrência, mas não é mencionado pelos policiais na narração dos fatos. Os agentes que abordaram Lusvargh tampouco se referem ao objeto em seus depoimentos.

De acordo com o Gate, tanto o “artefato incendiário” como a “garrafa de iogurte” foram construídos à base de material inerte, desprovido de qualquer tipo de substâncias explosivas ou inflamáveis. Os materiais apresentaram ainda resultado negativo para todos os testes práticos e químicos a que foram submetidos.

Por isso, dizem os peritos da PM, não poderiam colocar em risco a integridade física das pessoas, como sustentam policiais civis e promotores de justiça. O IC chegou a conclusão semelhante: os materiais não possuem composição química compatível com a de materiais explosivos, nem compostos inflamáveis comumente utilizados em coquetéis molotov.

‘Flagrante forjado’

“É outra prova que demonstra a ilegalidade da prisão”, avalia Luiz Eduardo Greenhalgh, advogado de Fábio Hideki, em entrevista à RBA. “Fábio foi vítima de um inquérito preparado e um flagrante preparado, que está se desmoronando.”

Greenhalgh lembra que o porte de explosivos era a principal acusação contra o manifestante – e o que justificava, perante a justiça, sua prisão preventiva. “Agora isso caiu. Quero que ele saia imediatamente da cadeia. Se não sair, ficará claro que se trata de uma prisão política.”

Procurada, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que representa Lusvargh, ainda não teve acesso ao laudo do Gate e do IC, e preferiu não se pronunciar sobre as conclusões da perícia.

Alckmin

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, disse hoje (4) que a polícia age com “absoluto critério” garantindo o direito de manifestação, e afirmou que o trabalho das autoridades na prisão de Hideki e Lusvargh foi tão bem conduzido que os tribunais ainda não tiveram como soltá-los.

“As pessoas acham que o governo prende e solta. Mas não temos o poder nem de prender nem de soltar. Tanto o trabalho da polícia foi bem feito que a Justiça não soltou”, alegou Alckmin, que é candidato à reeleição pelo PSDB. O governador ainda negou insinuações de que a polícia teria forjado flagrantes.

“Por que a polícia plantaria provas contra alguém? Os trabalhos da polícia são documentados. O trabalho da polícia é monitorado”, defendeu. “A polícia tem agido com absoluto critério garantindo o direito de manifestação. Infelizmente, há infiltrados que começam a depredação.”

PS do Viomundo: A polícia civil do Rio criou as quadrilhas de pessoas que nunca se viram, intensamente repercutidas por O Globo e congêneres; a polícia paulista faz detenção por porte de vinagre ou armas de destruição em massa inexistentes. Produz-se uma manchete que não compensa os 600 quilômetros de papel e tinta usados para denunciar a “conspiração” coletiva de manifestantes que se desconhecem.


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Comentários

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Tonho

Mais uma vez, um ótimo “ps” do viomundo…

Fernando

Evitamos os ataques terroristas na final da Copa, que seriam determinantes para golpear Dilma em outubro.

Agora é seguir espionando esses coxinhas para não aprontarem na Olimpíada.

MAAR

Caso seja comprovada inconsistência das provas, haverá então subsídio para reformar as decisões judiciais, conceder os habeas corpus e, ao final, inocentar os acusados. Bem como para punir excessos ou abusos das autoridades policiais, se evidenciadas falhas ou má-fé nos procedimentos.

Todavia, é importante não perder de vista que os acusados citados no texto acima são protagonistas de mobilizações relacionadas com um amplo histórico de atos de violência graves, que incluem não apenas o bloqueio sistemático de vias públicas, mas também incêndios provocados de modo deliberado e potencialmente danoso.

Vale lembrar que a irresponsabilidade e/ou falta de escrúpulos de participantes do vandalismo criminoso foi demonstrada claramente em episódio ocorrido numa manifestação em São Paulo, quando foi incendiado um veículo de passageiros com quatro pessoas dentro. Os incendiários não se preocuparam sequer com o risco de ferir ou mesmo matar os ocupantes do fusca, que nada tinham a ver com o pseudo protesto político.

Assim, é preciso manter a cautela quanto à defesa irrestrita daqueles que são acusados de envolvimento com atos de violência, para evitar o risco de fortalecer grupos que promovem o uso de práticas lesivas aos direitos da cidadania como meio para viabilizar objetivos políticos.

Do mesmo modo que não se pode descartar a possibilidade de que as acusações contra os acusados em tela sejam infundadas ou até mesmo distorcidas, não se pode concluir, sem verificar as provas, que não estejam envolvidos com a promoção ou a incitação de atos de violência.

Do mesmo modo que é indispensável denunciar e coibir abusos e excessos frequentemente presentes nas atuações de forças policiais, é um dever repudiar o uso de toda e qualquer violência por parte de ativistas.

Protestar é um direito legítimo, mas bloquear vias, atear fogo nas ruas, destruir equipamentos urbanos e atirar explosivos potencialmente letais, não são direitos de ninguém. A trágica morte do cinegrafista mostrou esta realidade de forma inexorável.

Portanto, é preciso clamar pela apuração rigorosa de todos os aspectos das acusações relativas ao envolvimento de ativistas com atos de violência, sem cometer o erro de generalizar e defender a impunidade para crimes graves, ou potencialmente danosos, relacionados ao ativismo.

E isto sem dispensar o pleno respeito às garantias do Estado Democrático de Direito, de maneira que, se presentes os requisitos legais, sejam os acusados autorizados a responder aos processos em liberdade.

Mas também sem esquecer que, quem defende anistia para pessoas flagradas durante a preparação ou realização de atos de violência, pede impunidade para crimes graves, o que é inadmissível. Tal impunidade é muito danosa para a sociedade, principalmente por implicar num estímulo à ocorrência de novos crimes semelhantes, com consequências cada vez piores.

Cabe a ressalva quanto à necessidade de verificação do posicionamento e das práticas de cada acusado em relação aos atos de violência citados, mas vale lembrar que não se viu até aqui nenhuma autocrítica por parte dos grupos que insuflaram e promoveram violências. Por isto, é ainda mais imprescindível pugnar pelo pleno respeito à lei, pois este é o método mais didático para impulsionar a consciência política.

Márcio Gonçalves

Azenha,

a bem da verdade, boa parte dos “600 quilômetros de papel e tinta” ultimamente foram dirigidos ao inquérito da polícia civil do RJ. Sim, a mídia está fazendo uma campanha difamatória contra os militantes, mas o fato é que alguns diálogos gravados no inquérito são bem esquisitos. Mas virá o julgamento e todos terão direito de defesa. Ou não? Depois do julgamento torto que foi o do “mensalão do PT”, será que vai ter um candidato a Joaquim Barbosa na justiça do RJ para transformar indícios em provas cabais?

Outra coisa que me intriga é o fato de só encontrarem esquerdistas no inquérito do Rio. Cadê os skinheads, integralistas, a galera de direita que tradicionalmente sai no tapa com anarcopunks em cada 7 de setembro, adora um quebra-quebra e provavelmente estava infiltrada no auge dos distúrbios de 2013? O fato de não fazerem reuniões na UERJ torna difícil encontrá-los?

Zé Brasil

Curioso: -parece uma parte do scriipt do julgamento do Mentirão, vulgo AP-470.

Lá tal como aqui pulou-se por sobre provas que inocentariam os rapazes e eles foram mantidos presos até agora para gaúdio da opinião publicada, isto mesmo, não a pública.

Olha aí moçada como te enganaram quando te disseram que este País estava de fato mudando e que a justiça agora colocava figurões na cadeia. Só não te disseram que todo o teatro era destinado a devolver o poder de qualquer modo aos maiores saqueadores deste País, verdadeiros ladrões com luvas de pelica, os velhos enganadores de ofício.

Acorda, mano! Quando é necessário eles te usam sem qualquer pudor. Dispõe de ti; te jogam no fundo da cela mesmo sendo você inocente. Principalmente você não é muito chegado em pensar criticamente e seu norte são as manchetes da veja, folha, estado e globo.

Leo V

Advogados Ativistas mostrando ponto poor ponto a decisão ideologica, sem estar baseada em nenhum fato, do jui que negou o HC:

Exposed Jurídico – A Prisão Preventiva de Fábio e Rafael

http://advogadosativistas.com/exposed-juridico-a-prisao-preventiva-de-fabio-e-rafael/

Leo V

O despacho do juiz que negou os habeas corpus na sexta-feira, com alegações de que os presos são de esquerda, deixa explícito que se tratam de presos políticos.
No Rio os militantes só estão soltos porque por sorte o pedido de HC caiu com um desembargador progressista. A polícia e o Judiciário tem agido com base em critérios de classe e ideológicos: pobre vai pra cadeia, esquerdista vai pra cadeia. Estamos à mercê de uma polícia e um Judiciário político. Esse é o tal Estado Democrático de Direito, que certamente não é alternativa a um Estado de Exceção.

Estranhamente o editorial da Folha de hoje é sobre o assunto, e até bastante bom, fazendo uma crítica às prisões, e ao despacho do juiz. Não sei o motivo dessa guinada da Folha em favor de direitos civis.

    Lulamel

    Penso que sabiam bem que era ilegal. Mas….. muitas instituições ditas sérias foram participantes, então tinha-se que criar o teatro para desfazer a farsa ( proteger os jogos e criar terrorismo com fins talvez também de gastar algum dinheiro na proteção ). A Folha talvez tenha acompanhado toda a farsa desde o início e então teria que se descomprometer. Simples, não?

    Agora temos de lutar para soltar o Carone. E chamar os irresponsáveis às falas. A todo momento chacoalham o Brasil como se fosse seu quintal.

    Assim não é possível construir a futura democracia e cidadania.

Julio Silveira

Esse é mais um caso em que o estado vai ser a vitima, sim vitima, por que certamente terá que arcar com indenizações por conta da deficiência, no mínimo, profissional de agentes que estão a seu serviço. Estado leia-se todos nós, e não a casa da mãe Joana que boa parte de brasileiros, inclusive servidores, acreditam que seja.
O nosso país carece de um modificação urgente nos parâmetros para responsabilização de mal feitos. Em todas as esferas e setores públicos. Assim fica fácil fazer caca. Hoje fazem caca com toda a segurança e ainda a certeza de o estado, que é cúmplice por omissão, vai arcar com todo custo como se fosse o único culpado.

    Lulamel

    Verdade. Vamos pagar a conta. O preso vai pagar a conta da caca.

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