“SUS” da Educação muda papel do MEC

Tempo de leitura: 3 min

30/03/2010

por Luciano Máximo, de Brasília, do Valor

A criação de um sistema nacional articulado de educação baseado no regime de colaboração entre União, Estados e municípios do Sistema Único de Saúde (SUS) vai depender de aprovação de lei complementar e mudanças na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) para se tornar realidade no país. O esboço dos primeiros artigos da futura legislação foi apresentado ontem durante o segundo dia de atividades da 1ª Conferência Nacional de Educação (Conae) e está sendo discutido pelos cerca de 3 mil delegados presentes ao encontro, que acontece em Brasília até quinta-feira.

Considerado um conjunto de “propostas embrionárias” que será acrescido de contribuições dos participantes do evento, o texto indica os primeiros passos do “SUS” da educação, com destaque para a redução das burocracias e o aumento do poder de decisão das escolas e ações de cooperação técnica e financeira entre União, Estados e municípios baseadas em planos articulados. Um exemplo bastante citado pelos conferencistas é a dificuldade no entrosamento entre os governos na oferta de transporte escolar país afora. “Pela Constituição, todos os entes federados são responsáveis por levar e trazer os alunos, mas o estudante do município não pode pegar o ônibus da rede estadual. Hoje o transporte escolar público atende a 7 milhões de crianças e jovens em todo o Brasil, ele é fundamental para combater a evasão, mas funciona num formato de concorrência. Um sistema articulado organizaria esse modelo”, ilustra Francisco das Chagas Fernandes, secretário-executivo adjunto do Ministério da Educação (MEC) e coordenador da Conae.

José Maria Arlindo, professor da rede estadual do Maranhão, acredita que um sistema educacional mais harmonioso pode trazer benefícios para a carreira do docente, um dos temas mais debatidos e polêmicos da Conae. “O professor do Sul é muito mais valorizado que o do Nordeste e isso reflete na qualidade. O aluno do Sul, do Sudeste, acaba sendo bem mais preparado que o estudante nordestino”, opina. Para ele, “a bagunça” nas regras federativas é uma das razões para o não cumprimento integral da Lei do Piso, que estabelece salário mínimo de R$ 1.024,67 para professores com carga horária de 40 horas semanais.

Segundo Chagas, o sistema articulado também prevê que Estados e municípios formulem suas políticas públicas orientados pelo Plano Nacional da Educação (PNE), documento que será aprovado na conferência com as metas educacionais para o Brasil perseguir no período 2011-2020. “O atual PNE, que acaba este ano, teve baixo índice de cumprimento dos objetivos traçados porque planos estaduais e municipais não foram feitos”, acrescenta.

Chagas sustenta ainda que a construção do SUS da educação vai ajudar a elevar os recursos federais para o setor, uma vez que o MEC terá papel de órgão executivo e coordenador do sistema proposto. “A União terá muito mais peso na regulação da educação, vai fortalecer seu papel de indutora, com o MEC mantendo a política de elevação de recursos para a educação, como vem fazendo desde 2003.”

Apesar de ter os seus primeiros contornos legislativos revelados ontem, o SUS da educação pode demorar a se concretizar pelo fato de precisar ser regulamentado por meio de lei complementar (LC), que depende de aprovação de maioria qualificada pelos plenários do Senado e da Câmara dos Deputados antes de ser enviado à sanção presidencial. “Somente uma lei complementar pode definir competências e responsabilidades explícitas de cada um dos entes federados”, explica o deputado federal Carlos Augusto Abicalil (PT-MT), que apresentou o esboço da LC ontem na Conae.

Além da necessidade de aprovação de uma legislação complementar, a criação do sistema nacional articulado de educação depende de alterações na LDB, explica o parlamentar. “A organização curricular hoje é muito diversa de Estado para Estado, de cidade para cidade. Essa diferença, como passar de ano ou abordar uma matéria, por exemplo, em vez de somar representa perda de qualidade”, diz. Abicalil se diz satisfeito se o SUS educacional for criado até o fim do novo PNE, ou seja, em 2020. “É uma demanda de 80 anos, desde o Movimento dos Pioneiros, não se constrói isso da noite para o dia. O principal é que a Conae está legitimada para propor um texto a ser debatido no Congresso.”


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Comentários

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embuscadoconhecimento

http://embuscadoconhecimento.wordpress.com/2010/0

Joaquim Aragão

No Brasil, há um excesso de excelentes especialistas em educação e uma falta de bons professores. Falando sério, um salário de 1000 reais é ajuda de custo de voluntariado. Nenhum profissional com curso superior irá aceitar viver com esse tipo de gorjeta. Politica de educação que mereça esse nome inicia com um piso salarial de 6000 reais, pois não há razão nenhuma para o salário de professor ser inferior a de um juiz. A menos que não se queira, realmente, investir em educação. O pior trabalho do professor não é dar aulas e sim corrigir provas e orientar, aluno por aluno, a corrigir o seu desempenho. Ninguém faz isso por 1000 reais, pois é obrigado a pular de escola para outra, e mesmo assim para obter uma renda de classe média baixa (3000 a 4000 reais). Assim, o ensino continuará a ser uma porcaria, a despeito de todas as inovações curriculares, gerenciais e institucionais, engendradas pelos brilhantes especialistas de BSB!

    thayane

    Nossa adorei o que vc citou, estou no 3° semestre de pedagogia faço por que quero mudar a educação no nosso pais, para formar cidadões cultos que saibam de seus direitos e deveres, não meros pasivos que ouve e abaixa a cabeça. Com a maioria desse governadores que nos representa a educação continuara do jeito que esta, por que eles ja estão no poder mesmo né, o nosso dinheiro já esta suprindo as suas necessidades então que se "lasque" o resto…. para eles é so isso que importa.

Fernando de Castro

O meu receio com isso tudo, é que essa federalização padronize ainda mais os currículos escolares. O texto apenas citou o assunto, mas o fato é que no Brasil temos a educação das estatísticas: o que importa são números, quantidade de alunos nas escolas, quantidade de aprovados, etc. Mas o fato é que há insatisfação completa da docência e também das crianças, a padronização dos currículos (criados por técnicos que não entram na sala de aula há décadas) leva à mediocrização da educação brasileira, tolhe a possibilidade de iniciativas criativas dos professores, e distancia ainda mais o ensino da realidade local, cultural das crianças. A padronização dessa educação curricular já é alertada por Paulo Freire há décadas. Jozé Pacheco, criador da Escola da Ponte (referência em todo o mundo como prática inovadora e mais adequada ao desenvolvimento integral das crianças) está no Brasil tentando alertar sobre esses problemas, mas os burocratas da nossa educação parecem não ter ouvidos nem cultura…

Tweets that mention SUS educação. quando chegará o da cultura? — Topsy.com

[…] This post was mentioned on Twitter by Roberto G. de Lima. Roberto G. de Lima said: SUS educação. quando chegará o da cultura? http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/%e2%80%9csus%e2%80%9d-da-educacao-muda-papel-do-mec.html […]

erisson

Concordo com o Daniel…

Enquanto ficar nas mãos do fisiologismo e do partidarismo de prefeitos corruptos, a educação jamais passará a ser pioridade de fato.

Eles podem até gerir a ponta do sistema, mas tem que ter algum nivel de responsabilidade pelos resultados…

    Carlos

    Prefeituras devem gerir, sim, com controle por conselhos municipais de educação reformulados e ação efetiva do MP.
    Prefeitos desviaram ou não aplicaram recursos disponíveis?
    Confisco de bens e cadeia de pelo menos 10 anos pros distintos.

Daniel Weber

2020? Temos esse tempo? O problema da educação é pra óntem (80 anos como se disse). E por que não federalizar de uma vez? Por que continuar a depender da volatilidade dos prefeitos e governadores? O que a Educação precisa para melhorar é dar dinheiro e liberdade aos professores.

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