O Globo: O direito de saber

Tempo de leitura: 3 min

O DIREITO DE SABER

editorial de O Globo, 14.12.1989, véspera do segundo turno entre Fernando Collor e Lula

O povo brasileiro não está acostumado a ver desnudar-se a seus olhos a vida particular dos homens públicos.

O povo brasileiro também não está acostumado à prática da Democracia.

A prática da Democracia recomenda que o povo saiba tudo o que for possível saber sobre seus homens públicos, para poder julgar melhor na hora de elegê-los.

Nos Estados Unidos, por exemplo, com freqüência homens públicos vêem truncada a carreira pela revelação de fatos desabonadores do seu comportamento privado. Não raro, a simples divulgação de tais fatos os dissuade de continuarem a pleitear a preferência do eleitor. Um nebuloso acidente de carro em que morreu uma secretária que o acompanhava barrou, provavelmente para sempre, a brilhante caminhada do senador Ted Kennedy para a Casa Branca – para lembrar apenas o mais escandaloso desses tropeços. Coisa parecida aconteceu com o senador Gary Hart; por divulgar-se uma relação que comprometia o seu casamento, ele nem sequer pôde apresentar-se à Convenção do Partido Democrata, na última eleição americana.

Na presente campanha, ninguém negará que, em todo o seu desenrolar, houve uma obsessiva preocupação dos responsáveis pelo programa do horário eleitoral gratuito da Frente Brasil Popular de esquadrinhar o passado do candidato Fernando Collor de Mello. Não apenas a sua atividade anterior em cargos públicos, mas sua infância e adolescência, suas relações de família, seus casamentos, suas amizades. Presume-se que tenham divulgado tudo de que dispunham a respeito.

O adversário vinha agindo de modo diferente. A estratégia dos propagandistas de Collor não incluía a intromissão no passado de Luís Inácio Lula da Silva nem como líder sindical nem muito menos remontou aos seus tempos de operário-torneiro, tão insistentemente lembrados pelo candidato do PT.

Até que anteontem à noite surgiu nas telas, no horário do PRN, a figura da ex-mulher de Lula, Miriam Cordeiro, acusando o candidato de ter tentado induzi-la a abortar uma  criança filha de ambos, para isso oferecendo-lhe dinheiro, e também de alimentar preconceitos contra a raça negra.

A primeira reação do público terá sido de choque, a segunda é a discussão do direito de trazer-se a público o que, quase por toda parte, se classificava imediatamente de ‘baixaria’.

É chocante mesmo, lamentável que o confronto desça a esse nível, mas nem por isso deve-se deixar de perguntar se é verdadeiro. E se for verdadeiro, cabe indagar se o eleitor deve ou não receber um testemunho que concorre para aprofundar o seu conhecimento sobre aquela personalidade que lhe pede o voto para eleger-se Presidente da República, o mais alto posto da Nação.

É de esperar que o debate desta noite não se macule por excessos no confronto democrático, e que se concentre na discussão dos problemas nacionais.

Mas a acusação está no ar. Houve distorção? Ou aconteceu tal como narra a personagem apresentada no vídeo? Não cabe submeter o caso a inquérito. A sensibilidade do eleitor poderá ajudá-lo a discernir onde está a verdade – e se ela deve influenciar-lhe o voto, domingo próximo, quando estiver consultando apenas a sua consciência.

PS do Viomundo: Isso do império de comunicações que deslocou uma funcionária para a Espanha para não criar embaraços à carreira política de um aliado, quando a jornalista engravidou. Soubesse, depois, que o filho não era do líder político, embora ele tenha assumido a criança.

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Alexandre Colisse

Um pequeno e singelo conselho a todos aqui, com muito respeito a cada comentário feito, pois não sou dono da verdade…..política não é futebol, não torçam por seus lados políticos, avaliem o que é feito e o resultado de seus governos.

A Mídia e a Grande Imprensa tem o poder de usar as polaridades partidárias e extrair para seu uso o benefício de manipular as opiniões e os governos.

Nós somos o “Povo” e temos o poder absoluto, só não acordamos para isso, pois estamos dispendendo nossa atenção nas brigas partidárias e não prestamos atenção ao redor, no que acontece enquanto estamos distraídos….

Jair Orichio Junior

Eu já falei isso aqui e vou repetir. O que nós escrevemos e lemos aqui, não muda em nada a opinião da Globo, pois ela vai se rastejar por milênios, para quem pagar para ela…Como por ironia, O Governo Federal destina 60% das verbas de comunicação para as Organizações Globo, por que eu não sei…!!! Ela nem se preocupa em atacar dia e noite o Governo, pois sabe que quando o PSDB voltar ela vai voltar a receber 75% da verba… Logo, ela nunca perde…

    Douglas Maia

    É amigo, mas essa mamata da globo está acabando viu, primeiro que o governo já cortou todas as propagandas dos bancos e projetos públicos lá, era onde eles lucravam muito, e agora com esse novo ministro das comunicações realizando o controle midiático no país, se ainda não percebeu, mas eles (PSDB) já estão desesperados lá no planalto! Querendo armar algo para impedir….

Ribas

Discordo do PS do Viomundo. O motivo de a Globo ter “escondido” sua funcionária não foi para evitar embaraços para FHC. A minha teoria para essa trama é que a Globo usou da situação e/ou da própria jornalista, para controlar, manter sob ameaça, o vaidoso e talvez até ingênuo (no que se trata de relacionamentos amorosos) FHC. Essa teoria passa a ser ainda mais plausível, agora que ficou provado que o filho da jornalista não é filho biológico do ex-presidente.

Robinson Damasceno dos Reis

Azenha: seja mais correto.Você bem sabe que a tal funcionária do GLOBO e o tal canditato já sabem há anos que o filho da moça não é do ex-presidente FHC. Ele assumiu assim mesmo, mas, biologicamente e na questão sexual e amorosa não é pai do garoto.Portanto,complemente seu texto. Aliás, seu não: do GLOBO.

    valderli f

    Engraçado este rapaz. A questão era se houve ou não a traição, que foi “devidamente” abafada pela grande midia (ao conrário do que foi feito com Lula). Se o exame de DNA deu negativo, significa que alem de traidor ele foi traido. FHC é sim símbolo de uma “pseudo-elite” cretina, que não consegue aceitar a situação atual demelhoria nas classes menos favorecidas.

João Brasileiro

Marcos André Lessa e demais crentes do PIG,

Collor não está sendo elogiado agora só porque é aliado do Governo Petista. Muito pelo contrário!!!
Ele recebe elogios por parte de quem defende o Governo Petista, agora, porque ele, Collor, está a favor do Brasil e do Povo Brasileiro!!
Antes, enquanto candidato e depois de ser eleito, ele estava contra o Brasil e contra o Povo Brasileiro, por isso ele recebeu críticas, naquela época!! Mas, era o queridinho do PIG!!
Hoje, ele é o DEMÔNIO para o PIG exatamente porque ele está a favor do Brasil e do Povo Brasileiro!!
Em outras palavras, ele está a favor de vocês, seus pais e dos seus filhos!!!
Não fiquem contra vocês!!
Um abraço!

    Robinson Damasceno dos Reis

    Pobre Marcos André!Até que ponto pode chegar a estupidez de um sicário obsidiado como este sujeito?

H. Back™

São as agruras dos cargos públicos. E quem se submete a um cargo público deve saber disso, mas que fique bem claro, essa norma tem que valer para todos.

Marcos André Lessa

E agora vocês pegam leve com o Collor porque ele é aliado do Governo… Que coisa, hein?

    Antonio Lyra Filho

    NÃO COLLOR ESTA SENDO CORAJOSO EM DIZER A VERDADE

    Valdeci Elias

    Leia ” A Privataria Tucana”, pra saber em qual governo o Brasil perdeu mais. Se no governo de Collor ou o de FHC ?
    Ao menos collor teve alguma punição , já FHC é protegido pelo Ministério Publico e pela imprensa.

Mardones Ferreira

Só mesmo a falta de políticos corajosos para permitir que empresas como a Globo, Veja e a Folha de São Paulo continuem se autoproclamando representantes da opinião pública nacional, da ética, moralidade e qualquer coisa boa que o valha.

Houvessem mais senadores como o Requião – com todos os seus defeitos – o Brasil teria mais embates necessários sobre a necessidade de um contraponto a essa imprensa vendida.

    Carlos Cruz

    Coragem… Leonel Brizola, alguem lembra?

    Caracol

    O tempo todo, Carlos.

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