André Singer: Ampliar a participação dos cidadãos é o melhor meio de sair da crise

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Brasília, 24/05/2017. Manifestação por Diretas Já. Foto: Lula Marques/Agência PT

A hora das diretas

por André Singer, na Folha de S. Paulo, 27/05/2017

Uma semana após a gravação entre Michel Temer e Joesley Batista ter se tornado pública, os fatos, pouco claros em um primeiro momento, começam a apontar na direção de que o presidente deva ser impedido.

Embora o áudio não tenha apresentado o que se anunciava nas notícias divulgadas, em primeira mão, pelo maior grupo comunicacional do país, o que ele revela é, provavelmente, suficiente para que o prócer peemedebista sofra impeachment.

Comprovadas, por exemplo, as denúncias da OAB — encontro às escondidas com empresário processado, promessa de ajudá-lo em pleitos relativos à Fazenda, anuência a relato de obstrução da Justiça, indicação de assessor de confiança para contatos permanentes — haveria crime de responsabilidade.

Até aqui os pronunciamentos e entrevistas presidenciais, no exercício pleno do direito de defesa perante a opinião pública, não conseguiram desfazer as suspeitas. Em alguns itens, ao contrário, funcionaram como confissão espontânea.

Em caso de vacância da Presidência e da vice nos últimos dois anos de mandato, como se sabe, a regra constitucional prevê a eleição pelo Congresso, destinada a completar o tempo dos que foram eleitos em 2014.

Trata-se de cláusula pouco democrática em uma Carta, de modo geral, avançada.

Além disso, prevista originalmente para um sistema de mandato único de cinco anos sem reeleição, tal norma deveria ter sido regulamentada por alguma lei que especificasse as condições de candidatura, o que nunca ocorreu.

Quem sabe seja sinal de que o legislador percebeu a inadequação da eleição indireta para preencher o mais importante cargo do sistema político brasileiro por um tempo maior.

A proposta de emenda constitucional (PEC) 227, do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), resolve bem o problema.

Ela altera a redação da Carta de 1988, fazendo prever eleições diretas até seis meses do fim do mandato, quando o papel do presidente passa a ser apenas o de conduzir o pleito seguinte. Torna também a Constituição compatível com o previsto no Código Eleitoral.

Pode-se argumentar que alterar regras no meio do jogo constitui equívoco a ser evitado pelos que desejam defender o Estado de Direito.

Mas não é disso que se trata, pois não há eleição em curso. Existe, sim, uma situação de emergência, causada por grave crise institucional, que depara com norma inadequada na Constituição.

Respeitar a Constituição não significa a impossibilidade absoluta de mudá-la. A Cidadã foi emendada 95 vezes.

Algumas das mudanças foram ruins, como a PEC dos Gastos, mas nada impede que desta vez possamos acertar.

Ampliar a participação dos cidadãos é o melhor meio de sair da crise. Se não for o único.

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Ivanisa Teitelroit Martins

A imprensa está dividida e o Supremo Tribunal Federal também. Há uma nítida polarização tanto na imprensa como no Supremo. A judicialização da política chegou a um esgotamento. O modelo de poder foi alterado sem a consulta à sociedade. A representação política através do Legislativo está em processo de fragmentação. Mesmo com um forte movimento pacífico pelas Diretas Já e a adoção de uma alteração constitucional cria-se um vácuo de poder, uma lacuna, que pode causar rupturas que imporão medidas severas, o que pode agravar o quadro político-institucional. A esquerda sempre soube recuar, poupar energias para agir em condições mais seguras e garantir a democracia e os direitos políticos e sociais.

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