Ion de Andrade, sobre Dilma em Natal: Como saímos da situação atual e o que fazemos depois

Tempo de leitura: 4 min

Dilma em Natal: como saímos dessa e o que fazemos depois

por Ion de Andrade, em seu blog no GGN

Duas coisas principalmente me atiçavam a curiosidade no que falaria Dilma em Natal: como sairemos dessa e o que faremos depois.

Acolhida com muito carinho em Natal, num evento magistralmente organizado pelo ADURN/Sindicato, Dilma iniciou com um diagnóstico do golpe em suas várias etapas e foi autobiográfica, pondo no centro da narrativa golpista aquilo que sentiu de mais forte, o discurso misógino da mídia.

Falou dos riscos ao Brasil que envolvem a privatização da Eletrobrás, da perseguição ao presidente Lula, da correlação entre o golpe e o projeto de Brasil soberano e, finalmente, adentrou nos pontos que me interessavam mais.

Como saímos dessa

No que toca às saídas para a situação atual, Dilma foi categórica no entendimento de que a saída para a crise é democrática. Apontou portanto, para 2018 como início da reversão do quadro atual.

O seu entendimento de democracia como saída, entretanto, não se resumiu à questão eleitoral e ela reconheceu riscos à própria democracia com as propostas contidas na Reforma Política em discussão.

O que Dilma enxerga como democracia é a expansão do processo democrático e a sua capilarização para o que denominou de “política maior”, ou seja como disse, “sem desvalorizar o parlamento”, a política altruísta a ser construída desde as bases da sociedade, valorizando as reinvindicações econômicas das comunidades e capaz direcionar um processo mais profundo de democratização do Estado e consolidar um processo de democracia ampla e participativa.

Desse primeiro tópico que me interessava mais diria que Dilma enxerga o que vem sendo apontado ainda esparsamente por alguns segmentos da esquerda que é o fato de que, sem a inclusão definitiva das maiorias à vida nacional, não há como estabilizar ou avançar na democracia, e que a nossa democracia será, se continuar assim um espelho do que é a própria sociedade: capenga, injusta e excludente.

Vejo, portanto, no que toca ao que fazer, que vai se desenhando um eixo de trabalho que tem, no curto prazo as eleições de 2018 e, no longo prazo, o soerguimento à cidadania das maiorias ainda excluídas.

Sóbria, Dilma não teceu comentários sobre resultados eleitorais. Apontou de forma lúcida um caminho que parece incontornável no Brasil, desde a ditadura: a transição democrática à democracia plena.

O que fazer depois

No que toca ao que fazer depois, Dilma reconheceu que treze anos foram pouco tempo para fazer mais e portanto trouxe a discussão o que, aos olhos dela faltou nos treze anos de governos dela e de Lula.

Sinalizou que foram tomadas iniciativas tocantes à distribuição de renda, mas que não houve tempo, fôlego ou força, traduzo com minhas palavras, para o passo seguinte que teria sido o da distribuição de riquezas. Confesso que esse conceito diferencial entre distribuição de renda e de riquezas não me foi muito claro. Entretanto duas grandes iniciativas alinhadas a esse “depois” foram citadas: a educação e a previdência. A primeira como pressuposto à economia do conhecimento.

Apesar da clareza do que fazer para “nós sairmos dessa”, a via democrática e a ampliação (democratização) do Estado, me pareceu que esse “o que fazer depois” continua nebuloso e desconectado desse primeiro polo que é precisamente a reflexão sobre como saímos dessa.

Uma totalidade entre como saímos dessa e o que fazer depois

Penso que os dois desafios devem compor um mesmo todo. Nos sairemos dessa movidos pelo que queremos fazer depois, ou seja, o Projeto deve galvanizar a Política.

Sem Projeto não há entusiasmo, a política se enfraquece, se torna principista e as maiorias interessadas se desmobilizam, tornando-se passivas ou pouco participativas.

Aliás, me ocorreu que talvez parte da dita passividade do povo decorra de um problema relacionado à falta na esquerda de um projeto futurista de Brasil, ferramenta inexistente para a produção do necessário entusiasmo e da politização concreta e objetiva.

Se me lesse diria a Dilma o seguinte: a capilarização da política com a absorção da pauta econômica e até economicista das maiorias excluídas dos processos decisórios (a tal política maior) incorpora uma tal magnitude de necessidades não atendidas e problemas estruturantes para o país que é no atendimento a essa pauta que deverá voltar-se a agenda mais importante do Estado.

Diria também que a superação da dualidade Casa Grande & Senzala, contra a qual o golpe se ergueu, só ocorrerá com o esforço nacional de atualização política e sócio-estrutural do mundo onde está mergulhado o nosso povo: as periferias e zonas rurais ainda mergulhadas numa espécie de lúgubre realidade ficcional entre o século XXI e o XVIII.

A Educação e a Previdência são obviamente insuficientes para atender a esses pressupostos, pois as necessidades não atendidas afloram de toda parte, como atesta a Carta de Natal dos movimentos sociais e devem produzir uma nova cultura onde o Estado deve colocar-se a serviço da resolução dos grandes e graves problemas da sociedade.

A Educação e a Previdência não resolvem o problema do racismo, do extermínio de negros, da violência, da falta de acesso à cultura, da construção de uma cidade amigável, da incorporação da estética ao urbanismo das periferias onde vive e morre o povo, que continuam horríveis e indignas para o ser humano, da simplificação da pesada burocracia estatal que pesa muitíssimo nos ombros dos vulneráveis, etc, etc, etc. Um projeto de país emergirá da boca do povo se o deixarem falar e se o escutarem.

Essa é a agenda que emergirá da “Política Maior”. É ela que nos torna invencíveis e É ISSO que precisamos fazer depois. Esse dever de casa, é a revolução.

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