Wellington, no universo paralelo da internet

Tempo de leitura: 2 min

De uma entrevista de um irmão do atirador de Realengo, Wellington Menezes de Oliveira, à Folha:

Como era a relação dele com a família?
Quando ele chegava em casa, era sempre com a boca fechada. Ele conversava pouco com a família, mas não era agressivo. Quando havia festa na casa de minha mãe e todos irmãos estavam lá, Wellington fazia um prato e ia para o quarto dele. Todos os cinco irmãos são muitos comunicativos, só Wellington que não era assim. Ele tinha dois ou três amigos. A imprensa fala que ele não tinha amigos, mas tinha ao menos uns três.

Talvez ele já estivesse com problema mental naquela época e, quando sentiu a perda da mãe, foi ali que a doença se apresentou. Até então, ele só apresentava esse jeito fechado. Como a gente não tem entendimento sobre esse tipo de coisa, fica difícil de descobrir algo, uma doença assim.

[…]

Vocês notavam que havia algo de errado com Wellington?

Todos os irmãos se preocupavam pelo fato de Wellington ficar muito tempo na internet. O tempo todo ele passava em frente ao computador. Em geral, ele comia vendo TV ou levava o prato para o lado do computador. Como o computador ficava no quarto dele, ninguém ficava entrando. Minha mãe tinha muita preocupação em relação às amizades que ele poderia fazer pela internet.

A família encaminhou Wellington para tratamento com psicólogos? Por que ele parou?

A própria escola chamou a minha mãe numa época e recomendou que ela levasse Wellington para um psicólogo. Minha mãe levava Wellington para a terapia e ele foi fazendo o tratamento. Quando ficou mais velho, perto da maioridade, minha mãe contou que ele não queria mais ir e ela resolveu não obrigá-lo.

Como era o comportamento de Wellington em casa, com a mãe de vocês?

Não havia agressividade, o que havia era mal criação, às vezes. Minha mãe tratou Wellington com muito amor e carinho. Como ela o adotou com pouco mais de 50 anos, acho que ela pensava que ela iria faltar mais cedo para ele. Ela tratou Wellington até melhor que os outros filhos.

Minha mãe era um porto seguro para o Wellington, pois ele era um menino que quase não se relacionava com mais gente. Todos os irmãos eram mais velhos e casados. Mas, mesmo assim, a gente sempre tentava conversar com ele. Ele era bem paparicado.Minha irmã fazia doce e bombons para ele. Wellington quase não saía de casa. Depois que minha mãe morreu, até comida ele pedia, marmitex.

Wellington sempre teve ligação com alguma religião?
Minha mãe era extremamente religiosa, era testemunha de Jeová. Wellington também a acompanhava na igreja. Depois, quando foi crescendo, ele acabou se afastando dessa religião, acho que procurou outras religiões. Minha mãe nunca ensinou nada de ruim ao Wellington, nada desse radicalismo. Ela deu cultura, família e valores.

Wellington chegou a ter alguma namorada? Teve alguma decepção amorosa?

Pelo que nós sabemos, ele nunca teve namorada.

PS do Viomundo: Algumas coisas chamam a atenção. A morte da mãe como gatilho. A incapacidade para relações afetivas aprofundadas. O uso da internet como uma espécie de “universo paralelo”, onde Wellington aparentemente se acreditava aceito pelos pares.

Leia aqui a íntegra do projeto que criminaliza a “intimidação escolar”.

Entenda aqui como Washington quer toda a ajuda possível para apovar leis antiterror no Brasil.


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Comentários

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Florival Scheroki

Quando vamos dar mais ênfase ao macroambiente em que Wellington adoeceu?
Conforme a entrevista do especialista a Heloisa Villela, não há um perfil individual.
Sugiro que atentemos para a entrada, na família, do modelo de relações em ambiente de trabalho modelo.
Penso que estamos pagando um alto preço pela globalização (neocolonização cultural.
Sinto pela dor das famílias das vítimas: família das crianças e família de Wellington.

beattrice

CONT: CONCLUSÃO
CARTA ABERTA

Nós do Movimento da Luta Antimanicomial não entendemos porque o Rio de Janeiro, cidade de referência para a Saúde Mental, é uma das cidades brasileiras com um dos menores índices de cobertura de serviços tipo CAPS. A quem devemos responsabilizar por esta falta de determinação política para cumprir o que deve ser cumprido? A Saúde Mental precisa de profissionais e unidades de serviço com estrutura adequada para cuidar da população.

Por que a razão de tamanho descaso com as políticas públicas de saúde mental já instituídas na legislação, nas portarias, e num ideário de transformação social?

Queremos nos juntar à dor destas famílias de Realengo, queremos nos colocar à disposição da Escola Tasso da Silveira, queremos nos humanizar diante desta tragédia, e queremos também humanizar os gestores públicos, fazê-los saber que não garantir o cuidado em saúde mental da população é expô-la a um sofrimento sem reparação.

Núcleo Estadual do Movimento da Luta Antimanicomial /Rio de Janeiro

beattrice

CONT CARTA ABERTA

Infelizmente, é neste mesmo território de Realengo que os serviços de saúde mental vão sofrendo de forma crônica de escassez de recursos de toda ordem. Todos sabemos que o CAPSi, unidade de saúde mental justamente voltado para infância e juventude com grave adoecimento psíquico, há cerca de 9 meses encontra-se sem sede própria, ocupando de forma provisória e precária uma área inadequada de um posto de saúde do local.

O CAPS para adultos sofre de problemas semelhantes, localizado em uma casa alugada de dois andares, não atende de forma adequada os seus mais de 300 pacientes e suas famílias vinculadas ao serviço. Um número pequeno de profissionais que leva de forma resistente e ética um trabalho que deveria no mínimo ser compartilhado por mais três unidades de CAPS naquele território.

beattrice

CONT CARTA ABERTA

Todo gesto de solidariedade devemos a estas famílias, e todos nós estamos empenhados em não tornar como mera fatalidade, fora do nosso alcance de intervenção, este acontecimento extremado em violência e dor ocorrido em Realengo.

Assim, é necessário que possamos reunir esforços, convocar as autoridades públicas, que possamos garantir uma rede efetiva de saúde mental, que possamos instituir uma política pública de saúde mental no município do Rio de Janeiro capaz de acolher e cuidar das demandas da população.

beattrice

Azenha,
salta aos olhos a dificuldade da família e da escola em encaminhar corretamente terapia, assistência e atendimento psiquiátrico e psicológico, o que lamentavelmente é a regra no Brasil hoje.
Até porque o atendimento público no setor da saúde mental encontra-se desmantelado e desconexo de parcerias com outras esferas, como as escolas.

Carta Aberta ao Governador Sérgio Cabral e ao Prefeito Eduardo Paes:
A tragédia de Realengo e a Saúde Mental no território

Vimos a público dizer e afirmar que este episódio trágico tem a ver com o nosso campo de militância, que é o da Saúde Mental. A tragédia ocorrida na Escola Municipal Tasso da Silveira em Realengo nos envolve em tristeza e dor pela perda da vida das crianças atingidas, vítimas de um gesto extremo, e pelas suas famílias agora destinadas a conviver com uma dor irreparável pela violência da experiência de terem suas filhas e filhos ceifados da vida tão precocemente.CONT

Gerson Carneiro

Além do que destacado pelo Viomundo que chama atenção, há também o fato dele ter sido adotado, até aqui não sabemos com quantos anos e o que ele teria vivenciado antes da adoção. É um enredo de vida no mínimo curioso. É tudo muito surpreendente… sei lá.

florival

Porque tão pouco ou nada se fala do macroambiente em que o "infeliz" adoeceu?

É proibido? Ou é porque sabemos mais do doente que do meio em que ele adoeceu?

O projeto que criminaliza “intimidação escolar” | Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Veja aqui como os internautas ficam desconfortáveis quando falamos em esquizofrenia na rede.   […]

Humberto Monte

Se esse garoto frequentou psicólogo, vou te contar: esse psicólogo é um incompetente.

O psicólogo deveria ter notado indícios de esquizofrenia, e encaminhado o garoto para o psiquiatra (que é médico, e pode receitar medicamentos anti-psicóticos, coisa que o psicólogo não pode, já que não é médico).

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