Procuradora denuncia: Crescem no Brasil a violência no campo e a criminalização de movimentos sociais

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Subprocuradora geral da República, Deborah Duprat, participou de audiência pública que debateu aumento da criminalização dos movimentos sociais no país. (Foto: Joana Berwanger/Sul21)

Marco Weissheimer, no Sul21

A subprocuradora-geral da República, Deborah Duprat, denunciou nesta segunda-feira (4), em Porto Alegre, que o Brasil está vivendo um cenário de crescente violência no campo e de criminalização de comunidades indígenas, quilombolas, de militantes do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e também de movimentos sociais urbanos.

Segundo ela, uma das expressões institucionais deste processo de criminalização de movimentos sociais é a CPI Funai-Incra, presidida pelo deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), que já pediu o indiciamento de várias lideranças desses movimentos. O objetivo dessa CPI, disse Duprat, não é buscar a verdade ou reconhecer direitos, mas sim para suprimir direitos. “É uma CPI fraudada desde o início. O projeto de poder deles é ter um estoque de terras para o mercado”.

Deborah Duprat participou de uma audiência pública promovida pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul para debater esse processo de criminalização dos movimentos sociais. Designada para ser a nova procuradora federal dos Direitos do Cidadão, para um mandato de dois anos, prorrogável por mais dois.

Duprat está viajando pelo Brasil para discutir pautas relativas à atuação da Procuradoria dos Direitos do Cidadão.

O tema não lhe é estranho, uma vez que trabalhou na 6ª Câmara da Procuradoria Federal, que trata de problemas envolvendo direitos de comunidades indígenas e povos tradicionais. O auditório da Procuradora Regional da República da 4ª Região ficou praticamente lotado com a presença de representantes de comunidades indígenas, de movimentos de luta por moradia, movimentos estudantes e outras entidades da sociedade civil.

Cenário de retrocessos

Na abertura do encontro, o procurador Domingos Dresch da Silveira destacou que ali estavam presentes aliados e lutadores na defesa dos direitos humanos. “O Ministério Público é plural e dentro dele vivem diferentes visões sobre temas relacionados à defesa da Constituição e dos direitos humanos”, assinalou.

Procurador Regional dos Direitos do Cidadão no Rio Grande do Sul, Fabiano de Moraes disse que o país está vivendo um cenário confuso marcado por retrocessos na área dos direitos. Em sua fala inicial, a subprocuradora-geral da República pediu um voto de confiança aos representantes dos movimentos sociais. “Por maior que seja a desconfiança com o Ministério Público, e vocês têm razões para isso, peço que não desconfiem desse espaço que pode ser muito importante”.

Duprat anunciou que decidiu, há cerca de três semanas, reinstalar o Fórum contra a violência no campo, para receber denúncias e debater iniciativas para enfrentar os crimes que estão acontecendo.

Deborah Duprat assinalou ainda que estratégias de criminalização vêm sendo adotadas em diferentes segmentos sociais e citou o caso de comunicações de militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), de São Paulo, que vêm sendo interceptadas pelo Gabinete de Segurança Institucional.

A subprocuradora lembrou que, em 2009, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização de Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pelo uso de interceptações telefônicas ilegais em 1999 contra associações de trabalhadores rurais ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Paraná. O Estado brasileiro foi considerado culpado pela instalação dos grampos, pela divulgação ilegal das gravações e pela impunidade dos responsáveis.

“CPI Funai-Incra terá o destino que merece”

A subprocuradora apontou ainda a estratégia que vem sendo utilizada pelo Estado em ocupações urbanas para criminalizar os pais, retirando as crianças de perto deles.

Duprat alertou ainda para os riscos do Decreto nº 8.793, editado dia 29 de junho, que fixa a Política Nacional de Inteligência e estabelece diretrizes para a atuação dos órgãos que compõem o Sistema Nacional de Inteligência. “Teremos problemas pela frente com esse decreto”, advertiu. “Nós estamos envolvidos em uma luta por sujeitos de direitos, que está definindo quem é sujeito de direitos”.

Neste contexto, acrescentou, a CPI Funai-Incra tem o objetivo de suprimir sujeitos de direitos. Mas Duprat acredita que os articuladores dessa CPI não terão sucesso. “Essa CPI terá o destino que merece. Estamos relatando ao ministro Fachin, do STF, todos os casos de criminalização e indiciamentos que estão sendo feitos”.

Duprat é autora de uma representação contra os deputados federais gaúchos Alceu Moreira (PMDB) e Luiz Carlos Heinze (PP), pelas declarações feitas pelos mesmos em uma audiência pública no interior do Rio Grande do Sul, onde, entre outras coisas, recomendaram aos agricultores que adotassem as medidas empregadas no Mato Grosso, envolvendo a contratação de milícias privadas.

A representação foi arquivada sob o argumento que os dois deputados gozam de imunidade parlamentar o que garantiria o direito de dizerem o que disseram. A subprocuradora afirmou que esses casos mostram o quanto a questão indígena e do movimento negro no Brasil ainda está carregada de racismo. “Está faltando no Brasil uma justiça de transição para a população negra e indígena que não fique restrita ao período da ditadura”.

“Lideranças indígenas estão morrendo todos os dias”

Os procuradores ouviram vários depoimentos de representantes de movimentos sociais relatando casos de agressões, violação de direitos e criminalização a que vem sendo submetidos no Rio Grande do Sul. Eli Fidelis, da comunidade indígena caingangue do Lami, lembrou a recente audiência pública da CPI Funai-Incra na Assembleia Legislativa, promovida pelo deputado Alceu Moreira, que não convidou as lideranças indígenas para participar. “O deputado não quis nos receber e muito menos nos ouvir. A democracia ainda não chegou para nós no Brasil. Não temos sequer o direito de sermos ouvidos”.

Maurício Gonçalves, do povo guarani, mostrou-se bastante preocupado com o atual momento político. “Lideranças indígenas estão morrendo todos os dias, mas isso não é noticiado. Vemos deputados falando o que bem entendem de nós, mas se nós falamos algo corremos o risco de ser presos. O bem viver do povo indígena é a demarcação de suas terras. O objetivo dessa CPI é revisar demarcações de terras já feitas e impedir novas demarcações”, assinalou.

O advogado Onir Araújo denunciou a presença do racismo no Rio Grande do Sul. “Enquanto a sociedade não reconhecer a chaga do racismo seguiremos tentando curar um câncer com aspirinas”, afirmou.

Araújo relatou à subprocuradora que quilombolas e indígenas seguem sendo tratados como vagabundos e lembrou que as denúncias encaminhadas contra os deputados Alceu Moreira e Luiz Carlos Heinze por conta das declarações destes contra essas comunidades até agora não tiveram consequência. “Nós seguimos não sendo encarados como brasileiros. Seguimos vivendo em uma República partida e a sociedade brasileira é conivente com isso”.

Roberto Antônio Liebgott, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ampliou historicamente o conceito de criminalização, destacando que ele é uma realidade para as comunidades indígenas há muito tempo. “Temos comunidades indígenas que são criminalizadas historicamente e seguem vivendo nas margens de rodovias. Temos lideranças indígenas que nasceram na beira de estradas e hoje estão cuidando de seus netos ainda na beira de estradas.”

Liebgott citou um caso recente ocorrido no acampamento de Capivari, onde um fazendeiro lavou um trator que aplicava agrotóxicos no local do rio onde crianças indígenas tomavam banho. “Isso também é criminalização”, defendeu.

“No passado a Justiça foi favorável à escravidão”

Queops Damascendo, da Ocupação Lanceiros Negros, denunciou a conivência do Poder Judiciário com o processo de criminalização da pobreza.

“No passado, a Justiça foi favorável à escravidão e à tortura de escravos que tentavam fugir da escravidão para a liberdade. Muitos anos se passaram e a Justiça segue sendo a favor da propriedade. No recente episódio da Secretaria da Fazenda, nós vimos policiais jogando spray de pimenta diretamente no rosto de estudantes e esses policiais seguem soltos, assim como seguem soltos os deputados Heinze e Alceu Moreira, mesmo após as declarações racistas que fizeram”.

Bárbara, estudante presa na ação da Brigada Militar para desocupar a Secretaria Estadual da Fazenda, no dia 15 de junho, relatou à subprocuradora que os estudantes sofreram violência física e psicológica.

“Fomos atingidos com spray pimenta a um centímetro de nossos olhos. Não tivemos em momento algum a possibilidade de negociar a nossa saída do prédio e tampouco foi permitida a entrada de nossos advogados. Aquela ocupação tinha um motivo que era tentar convencer o governador e o Secretário da Educação a abrir uma negociação”, disse a estudante.

A promotora Ivana Battaglin, da Promotoria de Direitos Humanos do MP estadual, anunciou que há mais de um inquérito civil em curso investigando a ação da Brigada Militar contra movimentos sociais e manifestantes no Rio Grande do Sul. Segundo a promotora, as audiências de custódia estão recebendo muitas denúncias de violações de direitos por parte dos policiais, que serão investigadas.

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Movimento social não é organização criminosa nem luta, crime 


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FrancoAtirador

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Patrulheiros do Preconceito Medieval

pedem a Cabeça da Roteirista da Revista,

em Quadrinhos, Turma da Mônica Jovem.
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05/Jul 13h55
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Por que uma Roteirista da Turma da Mônica
está Sofrendo Ameaças na Internet
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Por Ana Freitas, na Coluna Expresso do Nexo Jornal
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Petra Leão, Roteirista da Turma da Mônica, Está Sofrendo Ataques
de Grupos Radicais de Direita, Por Frase Dita Pela Personagem
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(http://imgur.com/WD0xgFq)

“Meu corpo, minhas regras!
Podem discutir e debater até cansar…”,
disse Mônica na edição 94 da Revista em Quadrinhos
Turma da Mônica Jovem (conhecida como TMJ),
que retrata aventuras dos personagens clássicos
de Maurício de Souza em versão adolescente.
.
MÔNICA, NOS QUADRINHOS, DEFENDE SEU DIREITO DE ESCOLHER
COLOCAR OU NÃO APARELHO DENTÁRIO POR RAZÕES ESTÉTICAS
.
No contexto da história em quadrinhos, a frase de Mônica
se opunha à intromissão de seus amigos em uma decisão estética:
se ela deveria ou não usar aparelho nos dentes

O dilema faz referência aos debates sobre a autonomia
da mulher sobre o próprio corpo,
que estiveram na ordem do dia nos últimos meses
em manifestações feministas e na política.

O Trecho da Estória, no entanto, gerou Descontentamento
em Grupos de Extrema-Direita nas Redes sociais
e em Correntes do Whatsapp dizendo que as Crianças
deveriam ser Proibidas de Ler os Quadrinhos da TMJ.
.
Além disso, uma das roteiristas da edição 94, a quadrinista Petra Leão,
passou a sofrer ataques e ameças nas redes sociais
em razão da frase dita por Mônica na revista.

As mensagens acusaram a publicação de ‘doutrinação esquerdista’
e pediam a demissão de Petra Leão do quadro de roteiristas
da Maurício de Sousa Produções.
.
‘Turma da Mônica Jovem’ dialoga com universo pop
Publicada pela primeira vez em 2008,
as histórias da Turma da Mônica Jovem são mensais
e têm como alvo o público pré-adolescente.

A linguagem, os traços e os roteiros das histórias
são preparados para dialogar com os dilemas,
a realidade e o universo desses jovens.

Por isso, são frequentes as referências
a temas do debate público digital, como memes,
produtos e comportamentos em voga.

Os roteiros preparados por Petra Leão
são avaliados por três pessoas,
entre elas Mauricio de Sousa.
.
Mesmo assim, os ataques pessoais
foram concentrados em Petra.
.
Outro roteirista da Turma da Mônica Jovem, Marcelo Cassaro,
fez um post sobre o caso lembrando que seu nome
também estava nos créditos do roteiro da revista,
mas que ele não sofreu nenhum ataque.

“Tirem suas conclusões sobre a não-existência de machismo
no meio nerd, ou sobre a valentia dos agressores”, escreveu.
.
Diante dos ataques, a página oficial da TMJ publicou o trecho completo
em que Mônica discute com seus amigos sobre seu direito de escolher
se deve ou não colocar aparelho nos dentes e se posicionou sobre o caso.

“Essa é uma decisão que cabe única e exclusivamente à Mônica.
E a sua turma entende, aceita e respeita isso.
Porque gosta dela do jeito que ela é.
Há mais de 50 anos, as histórias em quadrinhos
da Mauricio de Sousa Produções são feitas para divertir e entreter,
mas também para levantar discussões saudáveis,
sempre com muito respeito a todos.”
Página Oficial da Turma da Mônica Jovem
.
O debate chegou ao site especializado em quadrinhos Terra Zero,
que publicou um editorial defendendo a liberdade editorial da revista e da roteirista
e a importância de um trabalho que, segundo o site, empodera jovens meninas e meninos.

“O trabalho de Petra é importante para os adolescentes, público-alvo direto da revista.
Não apenas para as garotas, que se sentem representadas por personagens femininas
fortes e determinadas, mas também para os garotos, que têm a oportunidade
de perceber que o mundo machista, no qual eles possivelmente foram criados,
está mudando, rapidamente, e, assim, aprendendo que há como homens e mulheres
se relacionarem de modo muito mais saudável.”
Terra Zero – Site Especializado em Quadrinhos
.
A página Minas Nerds, um dos maiores canais de conteúdo sobre cultura pop c
om recorte de gênero, destacou que o trabalho da revista reforça valores positivos,
incentiva a autoestima de adolescentes e dá aos adolescentes modelos valiosos
sobre como reagir em casos de bullying e abuso.
.
Em março deste ano, em comemoração ao Dia da Mulher, a Turma da Mônica
lançou o projeto Donas da Rua, um site colaborativo em que leitoras e fãs
dos quadrinhos da Turma podem enviar relatos em texto ou vídeo
sobre situações em que se sentiram empoderadas.
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https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/07/05/Por-que-uma-roteirista-da-Turma-da-M%C3%B4nica-est%C3%A1-sofrendo-amea%C3%A7as-na-internet
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FrancoAtirador

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Entrevista com a Procuradora Deborah Duprat, do MPF,

Concedida ao Jornalista Luis Nassif, no Canal Brasilianas:

https://youtu.be/QmTMnkOpp3E

http://jornalggn.com.br/noticia/%E2%80%9Cna-sala-de-visitas-com-luis-nassif%E2%80%9D-em-grande-estreia
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