Lava Jato acha telefone da mulher de Gilmar Mendes no celular do Rei do Ônibus; procuradoria quer a suspeição do ministro

Tempo de leitura: 6 min

Lava Jato acha telefone da mulher de Gilmar no celular do Rei do Ônibus

Procuradoria da República, no Rio, revela ‘apreensão’ com a possibilidade de serem soltos os alvos da Operação Ponto Final, que capturou a cúpula do Transporte do Estado

por Julia Affonso, no Estadão

A força-tarefa da Operação Lava Jato encontrou o número de telefone de Guiomar Mendes, mulher do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na agenda do celular do empresário Jacob Barata Filho, o ‘Rei do Ônibus’.

Na noite de quinta-feira, 17, Gilmar Mendes mandou soltar Jacob Barata Filho, preso pela Operação Ponto Final – que capturou a cúpula dos Transportes do Rio em julho.

O empresário nem chegou a sair da prisão, porque o juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal, do Rio, expediu novo mandado contra ele. A Procuradoria da República, no Rio, quer a suspeição de Gilmar.

Em ofício enviado, nesta sexta-feira, 18, ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, noves procuradores regionais da República e mais quatro procuradores que atuam perante a 1.ª instância argumentam que o encontro do número de telefone da mulher de Gilmar no celular do Rei do Ônibus reforça a proximidade do ministro com o empresário.

“A proximidade de Jacob Barata Filho com o ministro Gilmar Mendes também é demonstrada pelo fato de o contato da esposa do ministro, Guiomar Mendes, constar na agenda telefônica do aparelho celular do empresário”, afirma a força-tarefa.

“A informação consta no aparelho de celular Apple Iphone 7 plus, apreendido na prisão de Jacob Barata Filho, conforme relatório de extração.”

O documento tem nove páginas. Segundo o Ministério Público Federal, no Rio, Jacob Barata Filho ‘possui vínculo societário empresarial com Francisco Feitosa de Albuquerque Lima, irmão da esposa do ministro, Guiomar Feitosa de Albuquerque Lima Mendes, na empresa Auto Viação Metropolitana LTDA’. A Procuradoria mandou a Janot um documento da Receita como comprovação.

“Além do vínculo societário, Jacob Barata Filho e Francisco Feitosa de Albuquerque Lima, cunhado do Ministro, possuem íntimo relacionamento pessoal, tratando-se como amigos e compadres em diálogo travado dias antes da prisão do empresário”, observou a força-tarefa.

Na mensagem, de 29 de junho de 2017, o ‘Rei do Ônibus’ escreve a Chiquinho Feitosa. “Chiquinho, bom dia! Vc está sumido. Onde anda? Saudade do amigo. Um grande abraço, Jacob.”

Às 19h21, Chiquinho responde. “Td bem, meu amigo. Saudade tbm d vc. Estava em Portugal cheguei ontem e vim direto pra Presidente Prudente, afinal de contas lembra q vc foi quem me deu corda? Estava eu aposentado e agora cheio d trabalho kkkk Mas a sua disposição sempre… só vc chamar, hora e lugar. Abraço grande do seu amigo e compadre, Chiquinho Feitosa.”

No dia seguinte, às 12h34, Jacob pergunta. “Vc estará em Fortaleza na 2f?”

“Estarei irmão”, responde Chiquinho Feitosa.

“Vou lá te dar um abraço”, diz o ‘Rei do Ônibus’.

“Será um grande prazer, irmão. Segunda é meu aniversário porém farei um almoço na sexta na boisa. Se tiver como vc equacionar a sua agenda será ótimo, ficarei muito feliz. Sr Humberto e outros amigos lá de Portugal estão vindo na quinta e retornando sábado só para o almoço e sua presença me prestigiaria bastante.”

Jacob Barata Filho foi preso no dia 2 de julho.

A ÍNTEGRA DA NOTA DA PROCURADORIA DO RIO

Lava Jato/RJ – Nota Pública

Em relação à liminar em habeas corpus concedida na data de ontem (17/08/2017) pelo Ministro Gilmar Mendes, os membros da Força Tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro vêm a público manifestar a sua apreensão diante da possível liberdade precoce de empresários com atuação marcante no núcleo econômico de organização criminosa que atuou por quase dez anos no Estado, subjugando as instituições e princípios republicanos, e que detêm poder e meios para continuarem delinquindo em prejuízo da ordem pública e da higidez da instrução criminal.

A Operação Ponto Final é um desdobramento de diversas operações que têm ocorrido desde novembro de 2016 no Rio de Janeiro, reunindo um esforço imenso de vários órgãos de Estado com o objetivo comum de infirmar a atuação de detentores de espaços de poder corrompidos há muitos anos, e que, não obstante, nunca cessaram as suas atividades insidiosas, nem mesmo com o encerramento da gestão estadual anterior, havendo registros recentes de pagamentos de propina e atos de obstrução a Justiça.

A aplicação de um processo penal em que se entende não ser cabível a prisão preventiva para um acusado de pagar quase R$ 150 milhões de propina a um ex-governador e que tentou fugir do país com um documento sigiloso fundamental da investigação, definitivamente não é a aplicação de uma lei que se espera seja igual para todos.

A apreensão dos Procuradores sobreleva diante de contexto em que o prolator das referidas decisões é cônjuge de integrante do escritório de advocacia que patrocina, em processos criminais da Operação Ponto Final, os interesses de pessoas jurídicas diretamente vinculadas aos beneficiários das ordens concedidas o que, à luz do art. 252, I, do Código de Processo Penal, e do art. 144, VIII, do Código de Processo Civil, aplicável com base no art. 3º do Código de Processo Penal, deveria determinar o autoafastamento do Ministro Gilmar Mendes da causa.

Para garantir um juízo natural sobre o qual não paire qualquer dúvida de imparcialidade, e em respeito aos jurisdicionados e à instituição do Supremo Tribunal Federal, os Procuradores encaminham na data de hoje ao Procurador-Geral da República ofício solicitando o ajuizamento de exceção de suspeição/impedimento, instrumento processual disponível às partes em tais hipóteses.

Integrantes da Força Tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro – PR/RJ e PRR2

O casamento de Beatriz, filha de Jacob Barata, e Francisco, sobrinho de Guiomar Mendes, foi alvo de protestos no Rio de Janeiro

COM A PALAVRA, O ADVOGADO SÉRGIO BERMUDES

“A dra Guiomar Mendes efetivamente trabalha no nosso escritório. Ela trabalha no nosso escritório de Brasília. É tia do ex-marido de Beatriz, filha de Jacob Barata. O Francisco, sobrinho da Dra Guiomar, foi casado com Beatriz, se separaram legalmente em setembro, outubro do ano passado.

De maneira que cessou qualquer impedimento do ministro Gilmar, porque a menina Beatriz deixou de ser sobrinha por afinidade da mulher dele. Eu sinto muito que o problema esteja sendo colocado a margem da lei, da doutrina e da jurisprudência. A lei é muito clara. O juiz tem a obrigação de exercer o seu ofício, obrigação de julgar. A lei só dispensa o juiz da obrigação quando ele estiver impedido ou for suspeito.

Só está impedido ou suspeito nos casos especificamente declarados na lei. Como por exemplo: o juiz só está impedido, quando a parte for o irmão dele, um exemplo. Outro exemplo, o juiz é suspeito quando a parte tiver negócio com ele ou for credora ou devedora dele. Os casos de suspeição ou impedimento são casos que a gente chama de Direito Estrito.

Isto é, só se aplicam àquelas situações especificamente previstas na lei. A lei não cria nenhum impedimento, de nenhum magistrado cuja mulher é tia de alguém que foi casado, mas se separou, da mulher da parte, como no caso específico.

Como a mulher do ministro não é tia da Beatriz, filha de Jacob Barata, o ministro não está impedido de exercer suas funções no processo do Jacob Barata.

O fato de um cunhado de um juiz ser amigo de uma parte não impede um juiz de julgar. Porque senão seria o seguinte: se levar longe essa questão, daqui a pouco ninguém mais pode julgar ninguém. É preciso também ter em conta que por dever de ofício o juiz é homem de quem se esperam altos padrões de moralidade. O juiz tem obrigação de julgar, ele é pago para isso.”

Leia também:

Lula: Nenhum juiz ou vereador pode apagar os diplomas dos jovens negros da Bahia


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Luiz Carlos P. Oliveira

“É preciso também ter em conta que por dever de ofício o juiz é homem de quem se esperam altos padrões de moralidade. O juiz tem obrigação de julgar, ele é pago para isso.”

Parece que nossos juízes não aprenderam isso.

Deixe seu comentário

Leia também