JBS: Janot manda investigar e benefícios dos delatores podem ser anulados

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil, via Fotos Públicas

Janot abre investigação e diz que colaboração premiada da JBS poderá ser cancelada

Felipe Amorim, do UOL, em Brasília

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fez um pronunciamento na noite desta segunda-feira (04) para informar que determinou a abertura de investigação para apurar a omissão de informações no acordo de colaboração premiada firmado por três dos sete delatores da JBS.

A delação dos empresários, entre eles os donos do grupo, Joesley e Wesley Batista, foi fundamental na abertura de inquérito contra o presidente da República, Michel Temer (PMDB), por suspeitas de corrupção passiva e obstrução de Justiça.

Segundo Janot, caso comprovadas as ilegalidades, o acordo e os benefícios dos delatores serão cancelados.

As provas já apresentadas, porém, não serão invalidadas e continuarão sendo usadas nas investigações já em andamento e na apresentação de eventuais denúncias.

“Determinei hoje a abertura de investigação para apurar indícios de omissão de informações sobre práticas de crime no processo de negociação para assinatura do acordo de colaboração premiada da JBS”, declarou Janot.

“Áudios gravados com conteúdo grave foram obtidos pelo MPF (Ministério Público Federal) na semana passada, precisamente quinta-feira, às 19h.

A análise de tal gravação revelou diálogo entre dois colaboradores com referências indevidas à PGR e ao STF (Supremo Tribunal Federal)”, informou o procurador-geral.

Ele não deixou claro quais foram os crimes constantes nos áudios, mas admitiu que entre os nomes citados entre os possíveis praticantes de atos ilícitos está o do ex-procurador da República e ex-braço direito do próprio Janot, Marcelo Miller (saiba mais sobre ele abaixo).

Um dos áudios, uma conversa entre Joesley Batista e um dos executivos e delatores da BS, Ricardo Saud, traz, segundo a Procuradoria, “elementos que necessitam ser esclarecidos”.

“Exemplo disso é o diálogo no qual falam sobre suposta atuação do então procurador da República Marcello Miller, dando a entender que ele estaria auxiliando na confecção de propostas de colaboração para serem fechadas com a Procuradoria-Geral da República.

Tal conduta configuraria, em tese, crime e ato de improbidade administrativa”, diz texto divulgado pela PGR.

“Os áudios sugerem atos ilícios graves na Procuradoria e no Supremo Tribunal Federal”, disse Janot, citando Miller, mas sem mencionar quais seriam os problemas no Supremo.

“Se meu ex-colega praticou algum ato ilícito, não interfere nas denúncias que eu pretendo oferecer ou não.”

Segundo Janot, caso a investigação comprove que os delatores omitiram fatos importantes ao assinarem a colaboração premiada, o acordo será invalidado, e os benefícios dos executivos, cancelados.

Entre os benefícios concedidos a Joesley e Wesley Batista está a imunidade processual, ou seja, os delatores não seriam processados pelos crimes delatados.

“Se ficar provada qualquer ilicitude, o acordo de colaboração premiada poderá ser rescindido. Poderá chegar à rescisão”, destacou o procurador”.

Apesar da investigação, Janot fez questão de frisar que, ainda que o acordo de colaboração possa ser cancelado, nenhuma prova já apresentada poderá ser invalidada.

Isso quer dizer que os áudios já utilizados pela PGR para abrir investigações contra políticos como o presidente Temer, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) continuarão tendo validade.

“A eventual rescisão do acordo não invalida as provas até então oferecidas. Conforme a lei que disciplina a delação premiada, se a culpa do colaborador ensejar a rescisão do acordo, ele perde todos ou alguns dos benefícios, e o Estado aproveita todas, todas as provas apresentadas pelos colaboradores”, informou o PGR.

Rodrigo Janot afirmou que é a primeira vez que um acordo de colaboração passa por investigação com essa dimensão, que pode levar à rescisão, mas defendeu o “instituto” da delação premiada.

“A eventual rescisão não desqualificará o instituto. Será mostra de que não se pode ludibriar o Ministério Público e o poder Judiciário”, disse ele. “Se os executivos da JBS eventualmente erraram, pagarão por isso, mas nem por isso pagará o instituto, que deve ser preservado”.

O procurador afirmou que os próprios colaboradores entregaram espontaneamente na última quinta-feira (31) quatro áudios.

Das gravações, a terceira foi avaliada por Janot como “exótica”, em que os colaboradores, aparentemente, não sabiam que estavam gravando eles mesmos.

“É uma conversa franca e de linguagem livre entre dois colaboradores. Temos que entender quais são essas conversas e referências que eles fizeram”, comentou.

Janot explicou que o conteúdo dos áudios será submetido ao ministro do STF Edson Fachin, relator da delação da JBS no Supremo.

Além disso, os delatores serão chamados à PGR ainda nesta semana para prestar esclarecimentos.

Quem é Marcelo Miller

O ex-procurador Marcelo Miller integrou o grupo de trabalho da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República (PGR) entre 2014 e 2016, como ex-assessor de Janot.

Após deixar o MPF, ele foi contratado em maio deste ano pelo escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe, que representou a J&F durante parte das negociações do acordo de colaboração premiada.

Um mês depois, saiu do escritório de advocacia, do qual era sócio.

No fim de junho, Miller foi citado pelo presidente Michel Temer em pronunciamento oficial. Temer disse que “um assessor muito próximo ao procurador-geral da República [Rodrigo Janot], senhor Marcelo Miller, homem de sua mais estrita confiança” abandonou o MPF para “trabalhar em empresa que faz delação premiada com o procurador-geral”.

O presidente disse ainda que Miller “ganhou milhões em poucos meses”, garantindo “ao seu novo patrão um acordo benevolente, uma delação que o tira das garras de Justiça, que gera uma impunidade nunca antes vista”. Após as acusações de Temer, Miller afirmou que “não cometeu nenhum ato irregular”,  desde que deixou a PGR.

O Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio (OAB-RJ) abriu no fim de junho um processo de apuração formal para avaliar a conduta do ex-procurador. Miller não foi localizado pela reportagem para comentar a investigação.

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