Em escalada autoritária, Trump desafia a Justiça e perde; republicanos censuram palavras da viúva de Martin Luther King

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Sessions foi acusado de suprimir votos de negros pela viúva de Martin Luther King. Nomeado por Trump para ser “ministro da Justiça”, a acusação não pode ser repetida agora no Senado dos Estados Unidos

por Heloisa Villela, de Nova York

Dois milhões de clicks em menos de uma hora. O vídeo não tem imagens fortes, mulher seminua ou algum flagrante incrível.

Trata-se apenas de uma senhora de 67 anos lendo uma carta na porta do Senado americano.

A mulher, no caso, é uma senadora. Elizabeth Warren, do estado de Massachussets, gravou um vídeo simples mas mostra o poder que as palavras ainda tem.

Ela leu, diante da câmera, uma carta escrita pela viúva de Martin Luther King, Coretta King, em 1986 se opondo à indicação do então promotor público Jeff Sessions para o cargo de juiz federal.

As palavras de Coretta, nos anos oitenta, alimentaram a oposição de vários democratas e republicanos e impediram a promoção de Sessions.

Agora, interessados em confirmar a indicação de Trump para o Ministério da Justiça, os republicanos acharam melhor calar Coretta caçando a palavra de Elizabeth.

Mitch McConnell, líder da maioria no Senado, disse que Elizabeth feriria as regras da casa se usasse a palavra para criticar um colega. Sessions, hoje, é senador. Mas o argumento é uma falácia.

Indicado para o cargo de Ministro da Justiça, ele tem que passar pela sabatina do Senado e ouvir as críticas dos colegas.

A proposta de caçar a palavra de Elizabeth foi votada e os republicanos seguiram o líder.

Aprovaram a medida sozinhos (49 votos) apesar do voto contrário de todos os democratas (43 votos).

Elizabeth usou o recurso do qual dispõe: as redes sociais. E repetiu as temidas palavras de Coretta Scott King.

Em 1986 e agora, através de Elizabeth, ela informou o Congresso que Jeff Sessions, “como promotor público do Alabama, usou o poder do cargo para dificultar o livre exercício do voto dos cidadãos negros do distrito sobre o qual tinha jurisdição. A conduta dele como promotor público levando adiante casos fraudulentos de supressão do voto negro e a indiferença com relação às violações criminosas da lei de direitos civis mostram que ele não tem o temperamento, o senso de justiça e juízo necessários para ser um juiz federal. Acredito que a confirmação dele teria um efeito devastador, não apenas no Sistema jurídico do Alabama mas também no progresso que fizemos em toda parte”.

Sem dúvida um relato forte. Que poderia influenciar a decisão de três ou quatro senadores republicanos.

E isso é tudo que os democratas precisam. Três votos republicanos contra a indicação de Sessions derrubariam o candidato. Mas ao que tudo indica, o partido decidiu se abraçar a Trump, com todos os twitters enlouquecidos e as pretensões ditatoriais do empresário.

Ele agora aguarda a decisão da corte de apelações federal, em São Francisco, sobre a ordem executiva que barrou a entrada de muçulmanos de sete países nos Estados Unidos.

A argumentação dos advogados de Trump deixa claro que eles colocam as decisões do atual presidente acima de qualquer poder. Inclusive o judiciário. [Nota do Viomundo: Numa decisão surpreendente, Trump perdeu por 3 a 0]

Minha vizinha, uma advogada que trabalha para a organização Legal Aid foi direto ao ponto: “ele está tentando ser um ditador. Vamos ver o que os juízes vão dizer”.

Se a corte de apelação confirmar a decisão federal e suspender a ordem executiva de Trump, o Departamento de Justiça certamente vai levar o caso à Suprema Corte, que está desfalcada.

Tem oito juízes no momento e não nove como de costume.

Um juiz faleceu no ano passado e os republicanos se recusaram a sabatinar o nome indicado por Barack Obama. Decidiram esperar oito meses para falar do assunto apenas após as eleições.

Na atual composição da Suprema Corte existem quatro juízes de viés conservador e quatro mais liberais ou moderados. O caso pode acabar em empate. E aí, fica valendo a decisão do tribunal de apelação.

Resta saber se os juízes, federais e do supremo, vão embarcar na era da mordaça e conferir todo poder a Trump ou vão se rebelar e reafirmar o sistema de três poderes onde os três têm força e atribuições específicas.

Na porta do elevador do meu edifício alguém colou um recado listando os sinais de que o fascismo avança.

Na lista: nacionalismo poderoso, desprezo pelos direitos humanos, usa um inimigo como forma de unificar a causa, supremacia militar, sexismo galopante, controle da mídia de massa, obsessão com a segurança nacional, religião e governo entrelaçados, proteção do poder das corporações, supressão do poder da classe trabalhadora, desprezo pelos intelectuais e pelas artes, obsessão com crime e punição. A lista foi copiada de uma placa afixada no Museu do Holocausto, em Washington, capital dos Estados Unidos.

Abaixo: a senadora impedida de falar e a leitura da carta do lado de fora do plenário do Senado


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Pedro Pereira

https://www.youtube.com/watch?v=-mAxcwBTWj4

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